Datas de Estreia: | Nota: | ||
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Brasil | Exterior | Crítico | Usuários |
21/11/2003 | 17/10/2003 | 4 / 5 | / 5 |
Distribuidora | |||
Duração do filme | |||
127 minuto(s) |
Dirigido por Gary Fleder. Com: John Cusack, Dustin Hoffman, Gene Hackman, Rachel Weisz, Bruce Davison, Bruce McGill, Nora Dunn, Cliff Curtis, Bill Nunn, Jennifer Beals, Jeremy Piven, Orlando Jones, Luis Guzmán e Dylan McDermott.
`Um julgamento é uma coisa muito importante para ser deixada a cargo de um júri`, declara alguém, em certo momento de O Júri, mais recente thriller a se inspirar em uma obra de John Grisham (A Firma, O Cliente, O Homem que Fazia Chover, entre outros). E o que dizer, então, de um julgamento como o retratado neste filme, que envolve uma indústria bilionária (a de venda de armamentos) e um processo que pode originar um precedente importantíssimo contra os fabricantes de armas? Neste contexto, fica fácil entender como gastar 30 milhões de dólares somente na contratação de bons advogados pode ser, na realidade, uma pechincha: este valor nada representa em comparação com os prejuízos que poderiam ser causados pela vitória, nos tribunais, de um cidadão comum (no livro, o processo era movido contra os fabricantes de tabaco, o que dá praticamente no mesmo).
Contratado para auxiliar os advogados que defendem os interesses da indústria de armas, o experiente Rankin Fitch (Hackman) é especialista em montar júris que favoreçam seus clientes: contando com uma equipe imensa e com equipamentos de última geração, Fitch utiliza computadores e grampos telefônicos para pesquisar o passado e as características psicológicas e ideológicas de cada um dos possíveis jurados e, com isso, é capaz de dispensar aqueles que provavelmente seriam contrários à sua causa (seja esta qual for). Enquanto isso, o ético Wendell Rohr (Hoffman) conta apenas com sua experiência profissional para lutar a favor de sua cliente, cujo marido foi morto durante um tiroteio ocorrido há dois anos. Entre os dois advogados, surge Nicholas Easter (Cusack), que, como integrante do júri, encontra-se na posição ideal para influenciar o veredicto do julgamento – e que, justamente por isso, parece disposto a se `vender` para o lado que lhe oferecer a maior quantia.
Provando que a Justiça nada tem de cega, já que todos parecem capazes de manipular o Sistema em prol de suas causas particulares, O Júri é povoado por personagens cujas motivações só são esclarecidas nos últimos minutos de projeção, e que passam todo o filme mergulhados em uma série de jogos psicológicos fascinantes: até mesmo o correto Rohr busca influenciar o júri através de táticas obscuras como manchar (propositadamente) a gravata de molho a fim de se tornar mais `humano` aos olhos dos jurados – o que não é muito diferente da postura de Nicholas, que se esforça ao máximo para ganhar a confiança de seus colegas com o objetivo de influenciá-los no momento mais adequado.
Consciente de estar trabalhando com uma galeria de personagens extremamente sagazes, o cineasta Gary Fleder (cuja carreira inconstante inclui os interessantes Coisas para se Fazer em Denver e Beijos que Matam, mas também o fraco Refém do Silêncio) concentra sua lente nos rostos dos protagonistas, acompanhando as reveladoras trocas de olhares entre estes: observadores e perspicazes, Fitch, Rohr e Nicholas (e seus respectivos parceiros) sabem que estão sendo constantemente avaliados por seus inimigos e, justamente por isso, não têm tempo a perder, buscando antecipar os passos dos adversários sempre que possível.
Vivendo um personagem ambíguo e ambicioso, John Cusack é hábil ao retratar a inteligência de Nicholas ao mesmo tempo em que dá indícios de que o sujeito talvez esteja envolvido em um jogo para o qual não está totalmente preparado. Enquanto isso, Gene Hackman constrói Rankin Fitch como um homem experiente que não se detém nos aspectos morais de sua profissão: o que interessa é satisfazer aos clientes, e nada mais. Por outro lado, o advogado vivido por Dustin Hoffman é o único que realmente enfrenta um dilema ético: orgulhoso da própria honestidade, Wendell Rohr sabe que comprar o júri é uma atitude que contraria todos os seus princípios, mas compreende que, se não o fizer, a outra parte o fará – e, assim, deve avaliar se seu nobre objetivo final justificaria um ato desonesto.
Aliás, o encontro entre Hoffman e Hackman nas telas é algo há muito aguardado por cinéfilos de todo o mundo – afinal, os dois atores (que certamente se encontram entre os melhores de sua geração) jamais haviam contracenado, apesar da amizade que os une há décadas (eles dividiram um apartamento no início de suas carreiras). Pois a espera valeu a pena, já que o confronto entre Fitch e Rohr – que ocorre em um banheiro - é, sem dúvida, um dos melhores momentos de O Júri: discutindo o caso de forma intensa, mas civilizada, os dois homens jamais soam como meros fantoches do roteiro, já que possuem argumentos sólidos para justificar suas respectivas posições. E se Fitch encara a situação com um profissionalismo frio, sem se deixar levar pelas emoções, Rohr torna-se comovente ao insistir em falar sobre o que é `correto` ou não, sem compreender que, para o outro, este aspecto da questão simplesmente não interessa, já que seu trabalho é ganhar a causa para seus clientes, e só.
Embora não seja tão fascinante quanto o esplêndido 12 Homens e uma Sentença (1957), que acompanhava a tensa deliberação de um júri, este trabalho de Gary Fleder é suficientemente inteligente para prender a atenção do espectador sem se tornar maniqueísta. O filme tem uma posição sobre o comércio de armas, é claro, mas jamais permite que isto comprometa o desenvolvimento da história, o que é ainda mais admirável.
22 de Novembro de 2003