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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
10/04/2009 01/01/1970 4 / 5 4 / 5
Distribuidora

Presságio
Knowing

Dirigido por Alex Proyas. Com: Nicolas Cage, Rose Byrne, Chandler Canterbury, Lara Robinson, D.G. Maloney, Danielle Carter, Alethea McGrath, Ben Mendelsohn.

 

(Infelizmente, discutir Presságio sem abordar alguns dos pontos principais da trama seria um exercício fútil; assim, sugiro que leia a crítica abaixo apenas depois de assistir ao filme. Por enquanto, basta saber que Alex Proyas, diretor de Cidade das Sombras, voltou à boa forma depois do mediano Eu, Robô.)

 

Presságio é o que Sinais e Os Esquecidos tentaram desesperadamente ser: do primeiro, o roteiro de Ryne Douglas Pearson, Juliet Snowden e Stiles White traz o conceito de pequenos sinais proféticos que preparariam o protagonista para algo, ao passo que, do segundo, resgata o forte clima conspiratório que envolve e ameaça os personagens. Além disso, explora o que ambos tinham em comum (não é difícil concluir o que seja, não é?) ao mesmo tempo em que descarta a fragilidade e a covardia com que fechavam suas narrativas.

           

Quando a projeção tem início, porém, o longa parece prestes a mergulhar numa atmosfera de terror clichê ao focar-se na garotinha Lucinda Embry (Robinson), que, como determina a convenção estabelecida por O Iluminado, chega a surgir com o olhar fixo enquanto permanece em pé, numa posição estranhamente rígida, apenas para sumir segundos depois – e por que os funcionários de sua escola passam a procurá-la no escuro, em vez de simplesmente acenderem as luzes a fim de facilitar a busca, é algo incompreensível. Por sorte, o filme recupera o bom senso e a segurança narrativa ao saltar 50 anos no tempo, quando finalmente somos apresentados ao astrofísico John Koestler (Cage) e ao seu filho Caleb (Canterbury). Estudando na mesma escola de Lucinda, Caleb recebe, como parte das comemorações do 50º. aniversário da instituição, uma folha que, meio século antes, a garota preenchera completamente com números. Não demora muito para que John descubra, estupefato, que tais números remetem diretamente a grandes tragédias ocorridas nas últimas décadas, profetizando as datas em que aconteceriam, os locais e o número de vítimas de cada uma delas. E o mais assustador: a folha ainda prevê três últimos desastres que deverão ocorrer nos próximos dias...

           

Conferindo ao projeto uma atmosfera sombria que faz jus à de Cidade das Sombras (embora, claro, sem o design expressionista daquela obra), Proyas cria uma narrativa pesada e angustiante que se torna ainda mais intensa graças à decisão de ambientar a história no outono norte-americano, explorando as árvores semi-nuas e o chão coberto de folhas secas para salientar o tom opressivo e triste do filme (isto quando não vemos o céu acinzentado num tempo chuvoso). Além disso, o próprio desenvolvimento da trama mergulha o espectador num clima de tensão crescente, apresentando-nos a reviravoltas e descobertas intrigantes que desafiam a compreensão até mesmo de seu inteligente e racional protagonista – e o melhor é que, ao contrário do que acontecia em Os Esquecidos, a história se torna cada vez mais interessante à medida que nos aproximamos de seu desfecho, já que o roteiro não teme seguir um encadeamento lógico por mais que este ameace soar absurdo ou fantástico (e, afinal, trata-se de uma ficção científica, é preciso lembrar).  

           

Bem mais contido do que em seus trabalhos mais recente, Nicolas Cage deixa de lado os maneirismos que comprometeram suas performances em besteiras como Motoqueiro Fantasma, O Vidente e Perigo em Bangkok e encarna Koestler como um homem deprimido que, cansado da própria vida, parece seguir em frente apenas em função do amor que sente pelo filho – e mesmo que, aqui e ali, Cage se entregue ao overacting (como ao atingir uma árvore com um bastão de baseball, ao atirar vários livros no chão ou ao beber uísque diretamente da garrafa), durante a maior parte do tempo ele se sai admiravelmente bem ao retratar a forte ligação de Koestler com Caleb e ao compor o protagonista como um homem obcecado por uma descoberta que desafia sua posição acerca de uma das mais antigas questões filosóficas: o confronto entre o Determinismo e o Livre-Arbítrio (que o filme equivocadamente chama de “acaso”). Enquanto isso, Rose Byrne confere intensidade ao sofrimento de Diana, embora não tenha muito tempo para tornar a personagem um pouco mais complexa, ao passo que os pequenos Chandler Canterbury e Lara Robinson fazem um bom trabalho com seus personagens, oscilando apropriadamente entre a segurança, a confusão e o medo.

           

Voltando a explorar figuras misteriosas envoltas em capas longas e escuras (e oriundas de outro planeta, claro), Alex Proyas conduz o desenvolvimento da narrativa com uma segurança invejável: se a princípio os tais seres despertam uma sensação incômoda e de estranheza, gradualmente assumem a condição de verdadeiras ameaças – e o plano no qual os vemos através dos vidros embaçados do carro é particularmente eficaz neste sentido. Além disso, o cineasta não teme evocar as lembranças do 11 de Setembro, já que, além da data ser citada ao longo do filme, em certo momento chegamos até mesmo a ver uma multidão surgir em pânico e coberta de poeira cinza em plena Nova York. Esta referência clara aos atentados de 2001, aliás, se encaixa tematicamente nas questões filosóficas – e mesmo teológicas - mais profundas despertadas pelo longa, que, através de sua trama de ficção e suspense, busca discutir como sempre tentamos conferir algum sentido ao inexplicável, à tragédia e à dor.

           

Mas não é só através da clássica discussão “Determinismo x Livre-Arbítrio” que o roteiro aborda este constante esforço da natureza humana em buscar explicações; como dito logo acima, a religião desempenha um papel importante nesta exploração, independentemente de seus méritos ou deméritos. Assim, não é surpresa perceber como Pressário é recheado de simbolismos e de iconografias cristãs, desde a citação do Livro de Ezequiel até a conformação freqüente dos alienígenas em grupos de quatro (“os Quatro Cavaleiros do Apocalipse”), passando pelo fato de Koestler viver em conflito com seu pai, um reverendo. Além disso, o plano final do longa é uma referência mais do que óbvia à Gênese ao trazer Caleb e Abby como Adão e Eva reencarnados, ao passo que o fato de carregarem coelhos para a nave pode ser visto como uma menção à Arca de Noé (afinal, não seria absurdo supor que as demais naves carregavam outras espécies animais). Vale apontar, também, que, de um ponto de vista puramente estrutural, o roteiro merece aplausos por plantar logo em seu primeiro ato vários indícios dos rumos que a trama irá tomar adiante, como as referências à vida extra-extraterrestre e ao poder destrutivo das explosões solares.

           

E é claro que, como superprodução de ficção, Presságio conta também com efeitos visuais absolutamente espetaculares, merecendo destaque um terrível desastre aéreo que, rodado em um longo plano único e contando com abundantes efeitos digitais e mecânicos, representa um dos momentos mais marcantes do filme. Além disso, a segurança de Proyas e do montador Richard Learoyd conferem ao terceiro ato do longa um ritmo de terrível urgência que, seguindo num crescente que beira o insuportável, finalmente atinge seu clímax temático e narrativo em uma seqüência apocalíptica que, de maneira brilhante, abandona a (também eficiente) trilha de Marco Beltrami em prol da Sétima Sinfonia de Beethoven, conferindo ao desfecho uma natureza sublime e quase poética.

           

Oscilando com perfeição entre o suspense, a ficção e o drama familiar, Presságio representa não apenas o retorno de Alex Proyas à condição de “promessa cumprida” como também demonstra que Nicolas Cage, apesar de seus inúmeros tropeços, ainda é capaz de carregar um bom filme quando a ocasião se apresenta. Que estes dois continuem no bom caminho de agora em diante.

 

11 de Abril de 2009

 

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Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

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