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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
01/05/1958 01/05/1958 5 / 5 5 / 5
Distribuidora
Universal Pictures
Duração do filme
95 minuto(s)

A Marca da Maldade
Touch of Evil

Dirigido por Orson Welles. Com Charlton Heston, Orson Welles, Janet Leigh, Joseph Calleia, Akim Tamiroff, Marlene Dietrich, Dennis Weaver, Zsa Zsa Gabor e Joseph Cotten.

Não foi à toa que Orson Welles mudou o título deste filme de Badge of Evil (A Insígnia da Maldade) para Touch of Evil (Um Toque de Maldade; afinal de contas, o primeiro era muito injusto para com o personagem interpretado por ele nesta história de corrupção e ressentimentos.

Porém, vamos à história: depois que um milionário morre em um atentado na fronteira entre o México e os Estados Unidos, o Capitão Hank Quinlan (Welles) assume as investigações. No entanto, como a bomba usada no crime fôra armada ainda em território mexicano, e para evitar um incidente diplomático, o influente investigador Miguel Vargas (Heston) resolve acompanhar o caso, para desgosto do preconceituoso Quinlan, que não `aprova` os mexicanos.

Logo, o competente Capitão chega a um suspeito, o mexicano Sanchez - que se casara secretamente com a filha do milionário, possuindo, portanto, um motivo mais do que suficiente para ter cometido o crime. No entanto, o policial `planta` duas bananas de dinamite no apartamento do sujeito para incriminá-lo, o que revolta o honesto Vargas. Um conflito estabelece-se entre ele e Quinlan, que acaba se unindo à máfia local no intuito de destruir a reputação de seu novo inimigo.

À primeira vista, é fácil rotular o personagem interpretado por Orson Welles como um policial sem caráter, corrupto - o que validaria o título Insígnia da Maldade. No entanto, a criação do diretor-roteirista-ator Welles é mais complexa do que isso; ele não é apenas mais um vilão unidimensional, daqueles tão comuns nos filmes do gênero. Ele tem um senso moral, um código de honra que segue com rigor. É uma visão muito particular da justiça, é verdade, mas que tem a sua lógica e a sua razão de ser: há 30 anos atrás, a esposa de Quinlan foi estrangulada e o assassino escapou impune. `Foi a última vez que um assassino escapou de mim.`, afirma o Capitão, em certo momento. Pautando-se em sua resolução de cumprir a justiça a qualquer custo, ele não vê mal algum em fazer o possível e o impossível para levar os culpados ao tribunal, nem que para isso tenha que incriminá-los com falsas evidências - um modo maquiavélico de agir, onde os fins justificam os meios. Este é o seu `toque de maldade` e a razão pela qual este título é mais justo para com seu personagem.

O problema é que Quinlan deixa-se levar, na maioria das vezes, por sua `intuição`, que se manifesta através de dores em sua perna (ele anda auxiliado por uma bengala). Porém, seus métodos pouco `ortodoxos` não o impedem de colecionar uma legião de admiradores, como o abnegado Pete Menzies, seu braço-direito, que passou toda a sua vida a encontrar as `provas` deixadas por seu superior nos locais dos crimes que investigavam - se Menzies agia como cúmplice ou não, é uma resposta que Welles nunca fornece claramente. Contudo, a admiração pelo policial tem sua razão de ser: seu senso de justiça prevalece mesmo nos momentos mais extraordinários, como em seu confronto final com Vargas, quando se nega a atirar pelas costas deste; ou quando resolve mudar os `planos` do mafioso Tio Grandi, na tensa seqüência que se passa no quarto do hotel em que este mantém Susan como refém. Na verdade, Quinlan mantém sua visão particular dos fatos até o último momento - basta notar sua última frase no filme, dirigida para seu antigo amigo Menzies.

Do ponto de vista técnico, A Marca da Maldade prima pelo visual sombrio (obra do diretor de fotografia Russell Metty) que confere um ar ainda mais decadente às cidades que se situam nos dois lados da fronteira - principalmente Los Robles, onde grande parte da ação se transcorre. Já os movimentos de câmera não deixam o espectador esquecer, por um só momento, de que está assistindo a um filme de Orson Welles: já na abertura o diretor cria uma seqüência clássica, onde vemos uma bomba sendo colocada no carro do milionário e passamos a acompanhá-lo, por longos 3 minutos (sem cortes!), enquanto transita pelas ruas congestionadas de Los Robles.

Quanto às interpretações, o destaque, como não poderia deixar de ser, fica para o próprio Welles e seu policial, um ex-alcoólatra gordo e obcecado pelo passado. Já Charlton Heston, infelizmente, não convence como mexicano. Na verdade, sua pele `bronzeada` chega a incomodar e o seu bigode soa como um estereótipo. Enquanto isso, Janet Leigh faz o tipo `mocinha desprotegida`, o que é bem irritante em alguns momentos, como aquele em que um sujeito pede que ela o siga e ela responde, simplesmente: `O que tenho a perder?` - esquecendo-se de que poderia ser assassinada ou violentada se não estivesse em um filme. Finalmente, Marlene Dietrich faz uma ponta como uma mulher misteriosa que, no passado, serviu como anfitriã para as bebedeiras do Capitão Quinlan e que, agora, não vê muito futuro para ele. Aliás, é esta personagem que tem a visão mais correta de Quinlan: um grande detetive, mas um péssimo policial.

A Marca da Maldade é, em suma, um estudo extremamente interessante sobre o caráter de um homem que, para agir de acordo com os seus princípios, não via mal algum em infringi-los.
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20 de Maio de 1999

Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

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