Datas de Estreia: | Nota: | ||
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Brasil | Exterior | Crítico | Usuários |
22/12/2000 | 12/12/2000 | 3 / 5 | / 5 |
Distribuidora | |||
Duração do filme | |||
125 minuto(s) |
Dirigido por Brett Ratner. Com: Nicolas Cage, Téa Leoni, Jeremy Piven, Saul Rubinek, Makenzie Vega, Josef Sommer, Mary Beth Hurt e Don Cheadle.
Não há época melhor para se ambientar uma fábula do que o Natal. Combinando o clima de festividades com uma aura de melancolia, este é o período do ano em que as pessoas estão mais propensas ao sentimentalismo e às reavaliações de suas próprias vidas. Não foi à toa que Frank Capra decidiu situar o conflito vivido por George Bailey (James Stewart) em A Felicidade Não Se Compra justamente na noite de 24 de Dezembro. E o Conto de Natal de Dickens jamais teria o mesmo charme caso se chamasse Um Conto de Páscoa.
Um Homem de Família é uma produção consciente deste fato e, em função disso, não tenta esconder sua fonte de inspiração do espectador: assim, o personagem de Don Cheadle poderia ser uma espécie de primo do `Fantasma dos Natais Passados` de Dickens, enquanto a vida alternativa de Jack Campbell (Cage) reaproveita vários elementos do cotidiano de George Bailey em A Felicidade Não Se Compra. No entanto, devo frisar que esta aparente `falta de originalidade` em nada compromete este filme, que alcança perfeitamente seus objetivos: o espectador sai do cinema com uma sensação gostosa, leve. E este é o espírito do Natal.
Mas me adianto: em Um Homem de Família, Nicolas Cage interpreta um sujeito ambicioso que largou a namorada da juventude para se entregar ao mundo dos negócios. Treze anos depois e já estabelecido como uma das grandes fortunas de Wall Street, ele vive uma existência solitária e superficial. Seu apartamento é impessoal, sem fotos ou souvenirs, e tudo o que ele ama tem um preço. Apesar disso, é com grande segurança que Jack diz a um estranho (interpretado por Don Cheadle) que possui tudo o que deseja. As circunstâncias que o levam a conhecer o sujeito não vêm ao caso - lembre-se de que as fábulas não precisam ser lógicas para fazerem sentido.
No dia seguinte àquele em que conheceu o estranho personagem, Jack tem uma grande surpresa ao acordar ao lado de sua antiga namorada (Leoni). E mais: ele logo descobre que está casado com a moça, com quem tem dois filhos. Como se não bastasse, ele agora é um simples vendedor de pneus que trabalha na empresa do sogro - e seus antigos companheiros de Wall Street parecem não reconhecê-lo. Agora, Jack descobrirá como teria sido sua vida caso tivesse se casado com Kate - e terá que reavaliar seus objetivos e suas prioridades.
O roteiro, escrito por David Weissman e David Diamond, acerta na dose de sentimentalismo sem se tornar piegas: as mudanças pelas quais Jack acaba passando ao longo da trama são apresentadas na medida certa, sem forçar o espectador a aceitar o que está acontecendo como se fosse apenas um `milagre de Natal`. Além disso, os roteiristas acertam ao não estabelecerem a personalidade de Jack (a versão de Wall Street, bem entendido) como sendo a de uma pessoa mesquinha e fria - o que o transformaria definitivamente em uma nova versão de Ebenezer Scrooge (o velho avarento de Um Conto de Natal). Na verdade, os grandes `pecados` do Jack-financista são sua solidão e sua ilusão de auto-suficiência, pois, de modo geral, ele é apresentado como um homem relativamente generoso e agradável.
Infelizmente, o roteiro também tropeça em alguns pontos vitais: em primeiro lugar, por que a filha de Jack (versão `família`) deveria descobrir que este não é mais o mesmo (algo que acontece logo no início da trama)? A única explicação plausível: os roteiristas precisavam encontrar alguma maneira de fazer com que Jack descobrisse como deveria se comportar em sua nova realidade. Apesar de conveniente para a história, a situação acaba soando implausível demais (mesmo em uma história fantasiosa como esta). Outro pequeno detalhe que me incomodou (e sei que estou sendo um pouco chato neste ponto) foi o fato do personagem de Cage encontrar uma fita de vídeo marcada com as palavras `Jack Cantando`: na verdade, a fita foi gravada no aniversário de Kate e, assim, o rótulo acaba soando artificial demais (mais uma forma pobre utilizada pelos roteiristas para salientar um ponto importante). Pense bem: se um de seus parentes resolve fazer um show de mágicas durante o aniversário de sua filha, como você descreveria o evento na capa da fita: `Pedro Fazendo Mágicas` ou `Aniversário da Aninha`?
Com relação às atuações, devo dizer que o desempenho de Nicolas Cage não é dos melhores. Não que ele esteja mal; o fato é que o ator atravessa o filme sem grande entusiasmo, como se estivesse numa espécie de `piloto automático`. Em certos momentos, cheguei a pensar em coisas como `Tom Hanks elevaria esta cena a outro patamar` ou `Este é, sem dúvida, um filme para Robin Williams`. Normalmente, não gosto de rotular uma produção como sendo `um projeto para fulano ou beltrano`, mas também não posso evitar a conclusão de que Um Homem de Família definitivamente não era o melhor veículo para Cage (um ator que se destaca mais quando trabalha com personagens densos, como em Vivendo no Limite e Feitiço da Lua).
Em contrapartida, Téa Leoni está absolutamente maravilhosa neste filme, desempenhando a função mais complicada da trama: é dela a responsabilidade de convencer o espectador de que a melhor opção para Jack é permanecer ao lado da família. E o incrível é que ela consegue fazer isso sem necessariamente interpretar a `esposa ideal`: em certos momentos, ela grita com o marido, critica seu comportamento e até mesmo toma atitudes egoístas. Mesmo assim, ela desperta nossa simpatia com seu jeito terno e confiante. Uma grande atuação, sem a menor sombra de dúvida.
Chega a ser espantoso que Um Homem de Família tenha sido dirigido pelo mesmo cineasta que comandou o policial A Hora do Rush, um filme completamente diferente em tom, conteúdo e temática. Menos espantosa é a bela trilha sonora, já que esta foi composta por um veterano que já provou seu talento em diversas ocasiões: Danny Elfman.
Sensível e aconchegante, Um Homem de Família é o programa ideal para a época do Natal. Não foi por acaso que os distribuidores brasileiros se apressaram em lançar o filme por aqui (ele só vai estrear nos Estados Unidos na próxima semana): visto em janeiro, ele provavelmente não provocaria o mesmo encanto. Dickens que o diga.
19 de Dezembro de 2000