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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
02/06/2000 12/05/2000 1 / 5 / 5
Distribuidora
Duração do filme
118 minuto(s)

A Reconquista
Battlefield Earth

Dirigido por Roger Christian. Com John Travolta, Forest Whitaker, Barry Pepper, Kelly Preston, Richard Tyson, Kim Coates, Michael MacRae, Michael Byrne e Shaun Austin-Olsen.

Alguns diretores possuem um estilo único de trabalhar com suas câmeras: Oliver Stone adora enquadramentos instáveis e cortes abruptos; John Woo é fascinado por câmeras lentas; Paul Thomas Anderson acredita em tomadas contínuas e closeups abundantes; e Martin Scorsese freqüentemente move suas lentes em direção oposta ao percurso do personagem enfocado. Todos estes Mestres possuem razões próprias que justificam suas escolhas e o resultado é geralmente admirável. Já o diretor Roger Christian, de A Reconquista, acredita que `ter estilo` é simplesmente inclinar sua câmera o tempo todo, sem razão aparente, como um pintor que resolve se diferenciar dos demais ao criar telas que só podem ser penduradas em um ângulo de 45 graus.

Mas vamos conceder a Christian o benefício da dúvida: talvez ele quisesse conferir um visual singular ao seu filme na esperança de fazer com que o espectador não percebesse os colossais buracos do roteiro (é difícil prestar atenção em detalhes quando se está com a cabeça tombada por duas horas). Seja como for, fica difícil ignorar disparates como jatos que funcionam depois de mil anos sem uso e livros que, no mesmo período de tempo, só acumulam um pouco de poeira. Para encobrir bobagens como estas, o diretor teria que exibir seu filme de ponta-cabeça.

Baseado no livro de L. Ron Hubbard, criador da Cientologia (seita à qual pertence John Travolta), A Reconquista se passa no ano de 3.000 d.C., quando praticamente toda a humanidade foi exterminada pelos Psychlos, uma raça alienígena que pratica um capitalismo literalmente `selvagem`: eles viajam de planeta em planeta, eliminam seus habitantes e estabelecem colônias de extração mineral. Sua mentalidade é tão empresarial que eles se referem ao próprio planeta natal como `matriz`.

O chefe da segurança na Terra é um psychlo chamado Terl (Travolta), cuja ambição só pode ser comparada ao seu prazer de irritar os companheiros. Ele adora fazer brincadeiras infantis como, por exemplo, dizer que não vai matar determinada pessoa e, em seguida, entregar a arma para seu capanga, dizendo: `Ele vai`. Na verdade, ele é tão diligente em criar inimigos que é impressionante que não tenha sido morto antes da história ter início.

Eis que surge o herói, um `homem-animal` chamado Jonnie Goodboy Tyler. Capturado pelos Psychlos, ele logo se revela diferente dos demais escravos ao revelar uma postura `rebelde` e uma inteligência inusitada, sendo capaz até mesmo de utilizar uma arma dos alienígenas (não é à toa que seu nome é Tyler, acredito eu. A curiosidade que ele desperta no vilão interpretado por Travolta é muito parecida à curiosidade que - observe o nome - Taylor, astronauta vivido por Charlton Heston no magnífico O Planeta dos Macacos, despertava nos cientistas Cornelius e Zira). Seja como for, Terl acaba decidindo ensinar sua língua para o humano a fim de utilizá-lo como minerador e roubar toneladas de ouro localizadas em uma montanha.

Na verdade, o vilão faz mais do que isso: ele ensina toda a história de seu planeta ao inimigo, incluindo até mesmo as melhores maneiras de matar sua espécie (inteligente, não?). Como se não bastasse, Terl ainda leva Jonnie até uma antiga biblioteca, onde o rapaz consegue aprender até mesmo como ativar uma bomba atômica (não me perguntem que tipo de biblioteca é essa nem onde o herói aprendeu a ler inglês, já que no começo do filme ele vivia como um homem pré-histórico, fazendo pinturas nas paredes de sua caverna).

Porém, se formos considerar os verdadeiros buracos do roteiro, os exemplos acima são apenas `poros`. Há um momento em A Reconquista no qual um bando de selvagens aprende a pilotar jatos militares em apenas sete dias! Para tentar encobrir o absurdo da sugestão, um personagem chega a dizer: `Você tinha razão: é como montar um cavalo`. Claro, claro: segurar rédeas é tão simples como pilotar um avião com a destreza de Luke Skywalker (o diretor Christian plagia descaradamente o ataque à Estrela da Morte em Guerra nas Estrelas). Além disso, não faço a menor idéia de como os rebeldes conseguiram a eletricidade necessária para ligar o simulador de vôo.

O fato é que há pouca coisa para se gostar em A Reconquista: se por um lado os vilões são caricatos, rindo `malignamente` com freqüência, por outro os heróis são antipáticos, carrancudos e sem o menor carisma (Barry Pepper esteve muito melhor em papéis menores, como em O Resgate do Soldado Ryan e em À Espera de um Milagre). Além disso, a edição é monótona e as passagens de cena são invariavelmente realizadas através de uma divisão na tela. Para completar, a trilha sonora de Elia Cmiral é abominável e de uma presunção assustadora. Nem a maquiagem escapa: enquanto os Psychlos masculinos possuem dentes apodrecidos, a fêmea vivia por Kelly Preston (esposa de Travolta) exibe uma arcada dentária imaculadamente branca.

O mais incrível é que, apesar de tudo, o filme ainda consegue divertir em alguns poucos momentos - especialmente quando o espectador percebe como John Travolta está adorando interpretar um vilão alienígena. E é interessante observar como Roger Christian não se envergonha ao plagiar cenas de Blade Runner (ao ser atingido por um tiro, um personagem parte várias vidraças enquanto cai), Matrix (o herói correndo em câmera lenta enquanto os vilões tentam alvejá-lo), Independence Day (a batalha entre os jatos e as naves alienígenas) e até mesmo Coração Valente (o discurso pela liberdade) - além, é claro, da já citada `referência` a Star Wars.

O triste é que Travolta sonhava adaptar o livro de Hubbard há muitos anos, pretendendo até mesmo produzir uma continuação (A Reconquista só cobre os fatos narrados até a metade do livro). É lamentável que o péssimo trabalho dos roteiristas Corey Mandell e J.D. Shapiro tenha comprometido seus propósitos. Por outro lado, como produtor o astro tinha a obrigação de exigir que um novo tratamento da história fosse escrito. Agora, ele já pode ir se preparando para colher as numerosas indicações que certamente receberá no Framboesa de Ouro do próximo ano.
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10 de Junho de 2000

Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

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