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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
02/10/1998 17/04/1998 3 / 5 / 5
Distribuidora
Duração do filme
111 minuto(s)

A Razão do Meu Afeto
The Object Of My Affection

Dirigido por Nicholas Hytner. Com: Paul Rudd, Jennifer Aniston, Kali Rocha, Alan Alda, Timothy Daly, John Pankow, Nigel Hawthorne, Amo Gulinello.

Será que duas pessoas que se amam podem viver juntas e felizes sem que haja um relacionamento sexual entre elas? Será o sexo realmente indispensável em uma união estável? É possível que uma família seja constituída a partir somente da amizade entre um homem e uma mulher e nada mais? Em A Razão do Meu Afeto, filme baseado no livro homônimo de Stephen McCauley, estas são algumas das interessantes perguntas feitas ao espectador.

A história: depois de ser abandonado por seu namorado, George Hanson (Paul Rudd) aceita o convite de Nina (Jennifer Aniston), uma mulher desconhecida que o convida para morar com ela em seu apartamento. Nos meses seguintes, Nina e George tornam-se grandes amigos e isso começa a perturbar o devotado namorado dela, Vince. Para complicar, Nina anuncia sua gravidez e seu desejo de criar o bebê ao lado de seu amigo gay.

É claro que as coisas acabam não sendo tão simples assim: afinal, George tem seus próprios interesses. Por mais que queira criar o filho de Nina ao seu lado, como um pai - e ele deseja muito isso -, ele tem sua própria vida amorosa para cuidar. Nina, por sua vez, precisa que ele seja mais do que um `pai` para seu bebê - ela também deseja um marido, alguém com quem possa compartilhar sua vida. No entanto, ambos sabem que George é definitivamente homossexual e sua falta de desejo por Nina é frustrante para ambos.

Este é, sem dúvida, o ponto mais interessante da história: se pudesse escolher, George provavelmente iria querer se apaixonar por Nina. No entanto, esta não é uma questão de escolha e quando ele se envolve com um outro rapaz, o relacionamento aparentemente estável que mantinha com Nina entra em crise.

Não é à toa que a música-tema do casal Nina-George é You Were Meant For Me, do filme Cantando na Chuva. Naquele filme, Gene Kelly leva Debbie Reynolds para um galpão do estúdio de cinema em que trabalha e `fabrica` um belíssimo pôr-do-sol, com direito até mesmo a uma leve brisa de fim-de-tarde. Depois de preparar este belo cenário, ele faz com que sua amada suba em uma escada e canta para ela esta canção. Reparem na analogia: em A Razão do Meu Afeto o relacionamento de George e Nina é aparentemente belo, bem resolvido - chega mesmo a parecer o relacionamento ideal. Porém, na verdade o `cenário` desta união é, também, falso, apesar de belo. Apesar do maravilhoso `pôr-do-sol`, o jovem casal se esquece de que, algum dia, terá que desligar os refletores que iluminam esta união. Não há como ignorar que também precisam se sentir amados e desejados. E esta lembrança vem justamente na figura de Paul, um ator cuja própria vida é, em parte, um falso cenário de união estável.

Infelizmente, o filme do diretor Nicholas Hytner (As Loucuras do Rei George) se sai melhor ao apresentar estas instigantes questões de amor do que ao tentar respondê-las. O roteiro de Wendy Wasserstein prima por frustrar as expectativas da platéia. Depois de criar personagens ricos e interessantes e colocá-los em situações complexas, a história simplesmente nos apresenta uma resolução ineficaz, simplista e inverossímil, que tenta convencer o espectador de que todos poderiam sair felizes desta confusão de sentimentos e ressentimentos criada durante a trama. Vejam, por exemplo, o personagem do policial que é introduzido no filme com o único objetivo de tentar resolver a vida amorosa de Nina: ele é completamente implausível. Afinal, o que se pode dizer de um policial que, apesar de trabalhar fazendo ronda noturna em uma estação rodoviária, tem condições de comprar um belo e espaçoso carro e que se dá ao luxo de criticar Freud e usar termos como `status quo`? Com estes conhecimentos, ele deveria ocupar uma posição de maior destaque na força policial, não? Ou todos os policiais americanos são tão cultos assim?

Já as atuações são de primeira. O professor homossexual de Paul Rudd é autêntico e transmite sua sinceridade de maneira franca para o espectador. Ele realmente não consegue se ver feliz senão ao lado de outro homem e sua frustração por não poder fazer de Nina uma mulher realizada é patente. Jennifer Aniston, por sua vez, cria uma Nina tensa, que se vê sempre encurralada pela irmã dominadora ou pelo namorado exigente. Quando ela percebe que só consegue se sentir livre ao lado de George, a platéia é levada naturalmente a pensar que a única opção lógica é que ela crie seu bebê ao lado do amigo. Mas não é só o casal de protagonistas que brilha neste filme: Nigel Hawthorne, com seu angustiado e solitário Rodney, interpreta o melhor personagem de toda a história, representando, talvez, a única pessoa que consegue manter a sensatez no meio de todo o conflito que se instala. Sua atuação é extremamente sensível e são dele os momentos mais comoventes do filme.

Alternando momentos divertidos com outros de maior sensibilidade, A Razão do Meu Afeto consegue se sobressair em meio a uma enxurrada de romancezinhos `água-com-açúcar` que têm sido produzidos nos últimos tempos. Porém, ao se render ao padrão `final feliz` de Hollywood, o filme perde boa parte de sua força. Fica valendo a proposta que, apesar de não ter sido completamente realizada, chegou perto. Apesar de ter sido `mal` respondida (ou, pelo menos, respondida sem convicção), o que interessa é que a pergunta foi feita: o que tem maior peso em uma relação a dois: o sexo ou o companheirismo?
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13 de Outubro de 1998

Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

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