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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
22/10/1999 06/08/1999 5 / 5 5 / 5
Distribuidora
Duração do filme
107 minuto(s)

O Sexto Sentido
The Sixth Sense

Dirigido por M. Night Shyamalan. Com: Haley Joel Osment, Bruce Willis, Toni Collette, Olivia Williams, Donnie Wahlberg, Trevor Morgan, Bruce Norris.

Há um grande número de ocasiões em que um filme deixa a desejar somente por não ter sido dirigido por seu roteirista. É realmente triste quando uma boa história cai nas mãos erradas, acabando por ser desperdiçada: tramas que deveriam ser narradas de forma sutil são transformadas em folhetins; personagens complexos tornam-se meras caricaturas; e assim por diante. A visão do autor é perdida sob uma nova ótica - a de um diretor muitas vezes inepto.


Assim, é uma grande felicidade que a Disney tenha permitido que o desconhecido M. Night Shyamalan dirigisse O Sexto Sentido a partir de seu próprio roteiro, pois não há um único fotograma neste filme que não evidencie a profunda compreensão que ele tem de seus personagens e de sua história - cuja temática provavelmente teria levado qualquer outro que assumisse este projeto a dar um enfoque de `terror` à narrativa, o que teria sido um erro grosseiro.

A história de O Sexto Sentido tem início quando o Dr. Malcolm Crowe e sua esposa Anna estão comemorando um prêmio que ele acaba de receber do prefeito de Filadélfia por sua brilhante atuação no campo da psicologia infantil. É então que Vincent, um antigo paciente do Dr. Malcolm (que considera o rapaz seu maior fracasso do ponto-de-vista terapêutico), invade sua casa e o fere, se matando em seguida.

Um ano se passa e o Dr. Crowe luta para recuperar sua auto-confiança. Ele agora está tratando de um garoto de nove anos chamado Cole Sear, um menino retraído que diz `ver coisas` e que, para desespero de sua mãe, parece viver em eterno pânico. Assim, o filme começa a acompanhar o relacionamento que vai sendo estabelecido entre Malcolm e Cole e o distanciamento que surge entre o psicólogo e sua esposa - que, para seu desespero, está prestes a se entregar a um novo romance.

É justamente o enfoque dado a estes quatro personagens (Malcolm, Anna, Cole e sua mãe) que torna O Sexto Sentido tão apavorante: ao tornar o espectador `íntimo` de seus protagonistas, Shyamalan faz com que realmente nos importemos - e temamos - por eles. Mas não é só isso: o trabalho de câmera deste jovem diretor também é extremamente hábil, especialmente nas seqüências que se passam no interior do apartamento em que o garoto vive: ligeiras oscilações nos enquadramentos nos transmitem a impressão de que aquela pequena família é observada constantemente pelos espíritos que perturbam Cole. Além disso, o tom da narrativa torna-se ainda mais assustador graças à inteligente fotografia de Tak Fujimoto, que explora com habilidade o estilo gótico de alguns pontos da arquitetura de Filadélfia, onde a história se passa.

E que história: o roteiro esculpido (sim, o termo é `esculpido`) por Shyamalan não é apenas inteligente, mas também repleto de detalhes tão sutis que a vontade que fica, após o término do filme, é tornar a assisti-lo a fim de tentar compreendê-lo em toda a sua magnitude. Nenhuma informação é gratuita e - detalhe - muitas delas passam desapercebidas até que, de repente, percebemos que algo relevante havia sido dito há muito tempo, levando-nos a recapitular tudo o que se passou até então, numa tentativa deliciosa de remontar o intrigante quebra-cabeças proposto pela trama.

No entanto, até mesmo este brilhante roteiro poderia ter sido prejudicado caso as atuações dos protagonistas não fossem convincentes - e elas são simplesmente brilhantes, destacando-se aí o soberbo trabalho desempenhado pelo garotinho Haley Joel Osment, possuidor de um talento que não deixa nada a dever para veteranos como Dustin Hoffman ou Jack Nicholson (e, acreditem-me, a comparação não é exagerada). Sua composição de personagem revela não só uma precocidade impressionante, como também uma profunda responsabilidade profissional - é evidente que ele mergulhou sem reservas na criação do perturbado Cole. Suas pausas, seus olhares e suas inflexões são sempre efetivas em cada cena, contribuindo para tornar seu implausível personagem completamente verossímil para o espectador.

Mas grande parte do crédito deve-se, também, a Bruce Willis, pois sua química perfeita com Osment é vital para o envolvimento definitivo da platéia. Mas não é só isso: sua frustração em função do colapso de seu casamento é transmitida com grande sensibilidade, em especial no momento em que ele fala sobre o assunto para Cole naquela que é uma das cenas mais emocionantes de O Sexto Sentido. Enquanto isso, Toni Collette também comove ao retratar a assustada Lynn, mãe de Cole. Seu desespero por não compreender o que está afetando o garoto só é igualado por suas freqüentes tentativas de levá-lo a `relaxar`, como no momento em que o empurra no carrinho de supermercado. (Será uma grande injustiça se a Academia não conceder indicações aos três). Merecem destaque, também, as presenças marcantes de Olivia Williams, como a esposa de Malcolm (embora sua participação seja pequena, o que é uma das poucas falhas do filme), e de Donnie Wahlberg, como o perturbado Vincent.

Mesclando características de diversos gêneros, O Sexto Sentido não pode ser descrito meramente como um `suspense`, pois não é capaz apenas de nos assustar: as lágrimas e os risos (estes mais esporádicos e de fundo nervoso) também estão presentes durante toda a projeção. M. Night Shyamalan é, ao lado dos irmãos Wachowski (Matrix), uma das grandes revelações de 1999 - e seu filme, nada menos do que fantástico. Que venha seu próximo trabalho!

13 de Outubro de 1999

Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

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