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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
11/02/2000 01/01/1970 2 / 5 4 / 5
Distribuidora
Duração do filme
118 minuto(s)

O Colecionador de Ossos
The Bone Collector

Dirigido por Phillip Noyce. Com: Denzel Washington, Angelina Jolie, Ed O`Neill, Luis Guzman, Queen Latifah, Michael Rooker, Mike McGlone, Leland Orser.

Nos últimos anos, os métodos de execução empregados pelos serial killers de Hollywood vêm se tornando cada vez mais rebuscados, absurdos e violentos. Ao mesmo tempo, estes criminosos da ficção parecem gastar a maior parte de seu tempo preparando as pistas que deixarão para os detetives que os perseguem do que propriamente matando suas vítimas.

O Colecionador de Ossos não foge à regra: neste filme, Denzel Washington interpreta Lincoln Rhyme, um brilhante detetive que ficou tetraplégico depois de sofrer um acidente enquanto investigava a cena de um crime. Inconformado com seu destino, ele pede ao seu médico que o deixe morrer, pois teme que uma de suas freqüentes convulsões o leve a um apavorante estado vegetativo. É quando o corpo de um poderoso empresário é encontrado parcialmente enterrado próximo a uma estação de trem. Detalhe: um de seus dedos foi descarnado até o osso. A alguns metros do cadáver, as misteriosas pistas: um minúsculo pedaço de papel, um montinho de areia e um parafuso enferrujado. Logo, Rhyme é escalado para comandar a equipe que está investigando o caso, e decide recrutar a policial responsável pelo descobrimento das evidências, a introspectiva Amelia (Angelina Jolie), para ser seus `olhos e ouvidos` nos locais dos assassinatos (é claro que ocorrerão outros).

Infelizmente, o que poderia ser uma boa história transforma-se em um emaranhado confuso de clichês nas mãos do roteirista Jeremy Iacone. Ao invés de explorar o paradoxo entre a imobilidade física do personagem de Washington e sua agilidade mental, Iacone busca, simplesmente, manter o espectador preso à poltrona através de sustos fáceis e de atentados à lógica. Tomemos, como exemplo, a insistência de Rhyme para que Amelia entre sozinha nas cenas dos crimes a fim de não permitir a `contaminação` do local. Ora, é no mínimo um disparate supor que a presença de pelo menos um policial armado seria prejudicial ao trabalho da garota (principalmente se levarmos em conta que esta era acompanhada por dois experientes detetives a quem Rhyme respeitava). Em outras palavras: para criar uma frágil tensão, o roteiro tenta nos fazer crer que o restante da equipe de investigação simplesmente permitiria que Amelia corresse o risco de se encontrar com o(a) assassino(a) sozinha.

Mas não é só isso: um dos fatores que fizeram de Se7en um clássico absoluto do cinema policial na década de 90 foi o fato de seu assassino ser um homem com um propósito bem definido. Se ele deixava pistas e recados nos locais dos crimes, havia uma razão para tal: uma mensagem estava sendo transmitida para o mundo. A forma com que executava suas vítimas também refletia seus objetivos. Já em O Colecionador de Ossos, o(a) criminoso(a) não tem nenhuma razão para matar desta ou daquela maneira: ele simplesmente cria formas bestiais de cometer seus assassinatos a fim de chamar a atenção do detetive (veja o absurdo: a tal `coleção de ossos` não significa absolutamente nada; é apenas um título chamativo).

Outro elemento crucial para o sucesso de Se7en residia na confusão em que estavam mergulhados os detetives interpretados por Morgan Freeman e Brad Pitt: apesar de competentes, eles se encontravam tão perdidos quanto o espectador com relação aos crimes que estavam acontecendo. Com isso, o filme transmitia uma sensação de `urgência` que o tornava ainda mais envolvente. Isso não acontece em O Colecionador...: como sentir qualquer tipo de tensão em um filme no qual o detetive gasta apenas alguns segundos para descobrir o local em que uma vítima se encontra, usando, como base para seu raciocínio, ostras esfareladas que se parecem com areia?

Além disso, o roteiro repleto de furos compromete ainda mais o resultado final. Em certo momento, por exemplo, Rhyme descobre que o(a) assassino(a) já vinha agindo há meses, sem nunca ter chamado a atenção da polícia (apesar de ter deixado várias pistas junto às vítimas, que também tinham ossos `cirurgicamente removidos` - como se ninguém fosse observar este fato). No entanto, somente os três crimes que acontecem ao longo da trama são mais do que suficientes para que ele desvende o mistério, o que torna as pistas anteriores completamente dispensáveis.

Apesar de todos os `contras`, há uma bela razão para se assistir a este filme: Denzel Washington. Como sempre, este versátil ator encarna seu personagem com tamanha intensidade que torna-se impossível não acreditar que ele seja, de fato, tetraplégico - e, portanto, vulnerável ao extremo. Angelina Jolie, por sua vez, tem a ingrata tarefa de interpretar um destes clichês ambulantes que povoam as produções americanas: seus `dramas pessoais`, além de nada acrescentarem à trama, são descartados pelo roteiro assim que a história focaliza-se na resolução dos crimes (o tal namorado que aparece no começo da história desaparece sem maiores explicações, como se nunca tivesse existido). Com um material melhor em mãos, Jolie certamente teria se destacado (e que lábios maravilhosos tem a moça!).

Com um(a) assassino(a) cuja identidade parece ter sido escolhida aleatoriamente, O Colecionador de Ossos tem ainda um dos finais mais frustrantes dos últimos anos. Com tantos problemas em sua narrativa, já era de se esperar que a questão das convulsões de Rhyme fosse simplesmente ignorada. Na verdade, quando as luzes do cinema se acendem, quem está prestes a ter convulsões é a platéia.
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8 de Fevereiro de 2000

Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

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