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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
17/07/2001 01/01/1970 3 / 5 3 / 5
Distribuidora
Duração do filme
152 minuto(s)

Amistad
Amistad

Dirigido por Steven Spielberg. Com: Morgan Freeman, Matthew McConaughey, Djimon Hounsou, Anthony Hopkins, Pete Postlewaithe, Nigel Hawthorne.

Em A Lista de Schindler, Spielberg emocionou todo o mundo ao contar a tragédia do Holocausto. O sofrimento, as torturas, os massacres, o triste destino dos judeus frente à loucura sádica do nazismo envolveu as platéias do mundo inteiro ao serem descritos pela ótica deste diretor que já provou ser capaz de fazer rir e chorar.

Amistad deveria seguir a mesma trilha de A Lista..., ao contar a história verdadeira de um grupo de negros que, seqüestrados de seus lares na África para servirem de escravos, se rebelaram e mataram a tripulação do navio negreiro que os transportava. Presos nos Estados Unidos, os escravos vão ser julgados e sua sorte depende do jovem advogado que os representa. Porém, como se trata de uma época de reeleição, o destino dos 44 escravos se torna uma questão política, ainda mais complicada pelas disputas constantes entre o Sul (escravocrata) e o Norte (menos conservador e aberto ao abolicionismo).

Tecnicamente, o filme de Spielberg é ótimo. Tem uma bela fotografia, ótimos figurinos e uma trilha sonora correta (apesar de John Williams não estar tão inspirado como em filmes anteriores). Mas isso não é suficiente para fazer deste mais um marco na carreira do diretor. Na verdade, Amistad só se mantém graças ao forte - e importante - conteúdo que encerra. Se não tivesse algo realmente importante a dizer, o filme seria um deslize imperdoável na filmografia do responsável por dramas poderosos como A Cor Púrpura, O Império do Sol e, é claro, A Lista de Schindler.

É difícil apontar o que há de errado com Amistad. Eu poderia citar a edição, que não mantém o filme no ritmo adequado. Ou o roteiro, que perde tempo com frivolidades ao invés de se dedicar ao ponto principal da história (como a questão do enterro de um dos africanos, que morre na prisão e não pode ser enterrado a não ser pelos outros prisioneiros, que temem ser assombrados por seu fantasma se não o fizerem). Mas nada disso é suficiente para explicar o grande problema do filme.

O fato é que falta alma ao filme. Infelizmente, Spielberg não consegue passar aquele sentimento de revolta, até mesmo de incredulidade quanto às crueldades do sistema escravagista (exceto numa cena em que Cinque, o `herói` do filme, relembra a maneira como foi preso e sua terrível viagem em um navio negreiro. Esta seqüência, sozinha, sintetiza o que o filme poderia ter sido.). E isso é realmente uma pena, já que Spielberg tinha, em suas mãos, um material forte o suficiente para criar um importante - e belo - libelo contra a opressão. Um complemento à A Lista de Schindler - se é que A Lista... precisa de algum.

Essa falta de `alma` condena o filme. Há algumas cenas, por exemplo, que estavam claramente destinadas a serem cenas fortes, emocionantes. E que, no entanto, falham sistematicamente. Posso me lembrar de duas claramente: aquela em que Cinque (Hounsou) interrompe a fala do promotor para gritar, em inglês, `Deixa nós livres!` (sic) e aquela em que John Quincy Adams (Hopkins) conversa com Cinque em sua residência e este diz que confia em seus ancestrais. Em ambas as cenas lembro-me que cheguei a pensar: `Eu devia estar me emocionando agora.`. Isso, no entanto, não ocorreu. O filme não havia me envolvido o suficiente.

É uma pena, já que as interpretações são dignas de um grande filme. Djimon Hounsou, como o escravo Cinque, é o centro da história. Suas expressões, seu olhar, seu modo de conversar - nada indica que este seja seu primeiro papel no cinema. Uma bela atuação, sem dúvida. E Anthony Hopkins... bem, este prova mais uma vez que é realmente um ator simplesmente fantástico. Seu John Adams é um velhinho inteligente que nada lembra seus papéis mais recentes. Já Morgan Freeman não tem a chance de mostrar todo o seu talento, já que seu personagem não tem grandes momentos na história (à exceção da visita aos `porões` do navio negreiro, outra cena desperdiçada graças à falta de envolvimento com o filme). E Matthew McConaughey, bem... ele é um bom ator, mas seu personagem neste filme se parece demais com o advogado que o rapaz interpretou em Tempo de Matar (até a questão `racismo` se repete, e ele é igualmente perseguido por defender um negro). Assim sendo, fica difícil tirar alguma conclusão sobre seu trabalho, já que não há nada de novo ali.

Amistad poderia ter sido um grande filme. Spielberg poderia ter mostrado a todos, mais uma vez, o grande diretor que é. A platéia poderia ter saído deste filme com uma impressão mais vívida, que geraria reflexões mais profundas, com toda a certeza. São muitos `poderia` para um filme só.
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24 de Março de 1998

Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

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