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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
21/04/2006 29/03/2006 2 / 5 / 5
Distribuidora
Duração do filme
114 minuto(s)

Instinto Selvagem 2
Basic Instinct 2: Risk Addiction

Dirigido por Michael Caton-Jones. Com: Sharon Stone, David Morrissey, David Thewlis, Charlotte Rampling, Hugh Dancy, Indira Varma, Stan Collymore, Neil Maskell, Terence Harvey, Heathcote Williams.

 

Até entendo como, em um primeiro momento, alguém possa ter certa curiosidade em ir para a cama com Catherine Tramell, personagem vivida por Sharon Stone em Instinto Selvagem 2: afinal, ela tem um rosto lindo, um belo corpo e parece conhecer algumas “técnicas” que certamente tornariam a experiência interessante. No entanto, bastariam dez minutos de convivência para que qualquer pessoa razoável perdesse o interesse: ela é pavorosamente vulgar e egocêntrica, fuma o tempo todo, é promíscua, demonstra uma futilidade irritante, escreve ficção barata (e faz jus ao adjetivo “barata”) e se acha absolutamente irresistível (o que quase sempre é broxante). No primeiro filme, estes problemas eram contrabalançados por uma certa vulnerabilidade que a moça exibia ocasionalmente (e os homens adoram se sentir na posição de “protetores”) e pela constatação de que ela ao menos parecia capaz de sentir alguma coisa por seus amantes. Já nesta continuação, Tramell surge como uma caricatura desagradável da femme fatale, parecendo apenas disposta a sacanear ao máximo aqueles que cruzam seu caminho. Sedutor, não?

           

Depois de uma introdução inadvertidamente hilária, durante a qual vemos a escritora dirigir um carro em alta velocidade enquanto seu companheiro a masturba (uma experiência que acaba mal, como já seria de se esperar), o filme mergulha em uma atmosfera pseudo-noir enquanto acompanha o envolvimento do psiquiatra Michael Glass (Morrissey) com a personagem de Stone. Inicialmente convocado para fazer uma avaliação psicológica da estranha mulher – que parece fazer questão de despertar as suspeitas do detetive encarregado de investigar o acidente do início da história -, o doutor Glass logo se torna fascinado por Tramell, embora tenha motivos para julgá-la perigosa. Quando uma pilha de cadáveres começa a se formar no caminho do sujeito, ele se vê dividido entre as palavras da amante e do detetive Roy Washburn (Thewlis), seu velho conhecido.

           

Escrito por Leora Barish e Henry Bean, Instinto Selvagem 2 conta até com um início promissor (isto é, depois da seqüência do acidente), já que, por mais que Catherine Tramell se esforce para seduzir Michael, este parece estar sempre ciente dos joguinhos psicológicos da escritora. Assim, é interessante ver uma mulher acostumada a ter os homens aos seus pés sendo obrigada a criar novas maneiras de atrair a atenção de um indivíduo que nem sequer é dos mais atraentes. Infelizmente, quando o filme parece prestes a embalar de vez, Tramell atira uma isca óbvia e põe fim às sessões que vinha fazendo com o psiquiatra – que imediatamente cai na armadilha e faz o jogo infantil da paciente, insistindo em procurá-la. A partir daí, Michael (e o roteiro) se revela absurdamente estúpido, tornando-se uma marionete confusa nas mãos de todos os demais personagens. Para piorar, a inexpressividade do ator David Morrissey (um Liam Neeson sem carisma ou talento) acaba comprometendo ainda mais o filme ao impedir que o espectador o utilize como ligação com a narrativa (apesar de Stone ser a estrela do projeto, Michael é o protagonista).

           

Enquanto isso, Catherine Tramell se transforma numa personagem absurda, perdendo todo e qualquer elemento que no original possa ter contribuído para lhe conferir um mínimo de plausibilidade. Empregando uma voz sempre rouca, Sharon Stone parece acreditar que todas as falas de Tramell merecem ser tratadas como instrumentos de sedução, por mais prosaicas que sejam. É inegável que a atriz continua lindíssima, mas, depois de um tempo, seus esforços para ressaltar a própria sensualidade acabam se tornando cansativos e começamos a prestar atenção em detalhes menos lisonjeiros da produção – como o uso constante do soft focus para disfarçar o envelhecimento da diva (particularmente, acho que algumas rugas sempre tornam o rosto da mulher mais interessante, mas pelo jeito estou só neste campo).

           

Tentando fazer o melhor possível com um roteiro que não oferece muitas opções, o cineasta Michael Caton-Jones (dono de uma carreira no mínimo irregular) segue direitinho as regras básicas do noir, trabalhando ao lado do húngaro Gyula Pados (do visualmente impecável Kontroll) para criar uma fotografia contrastada que mergulhe seus ambíguos personagens nas sombras a fim de ressaltar plasticamente o caráter destes – e o ótimo tema criado pelo já falecido Jerry Goldsmith para o original volta a ser utilizado com propriedade na continuação. Por outro lado, a insistência em incluir planos que revelam o prédio ridiculamente fálico no qual se localiza o consultório de Michael acaba pecando pela obviedade.

           

Ignorando o fato de que Instinto Selvagem era, antes de qualquer coisa, um filme sobre sexo (a história era um detalhe), esta atrasada e desnecessária seqüência aposta erroneamente na inteligência inexistente de sua trama e relega os elementos sexuais ao segundo plano – e, desta forma, consegue frustrar até mesmo aqueles que ficariam satisfeitos apenas em ver uma ou outra cena mais picante. Rendendo-se ao puritanismo dos censores norte-americanos, Instinto Selvagem 2 é uma produção sem sexo ou violência que, como se não bastasse, ainda investe em uma conclusão estúpida que, na tentativa de recriar a ambigüidade de seu antecessor, revela apenas a fragilidade de seu roteiro, que, pela (falta de) qualidade, poderia ter sido escrito pela própria Catherine Tramell.
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19 de Abril de 2006

 

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Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

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