Datas de Estreia: | Nota: | ||
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Brasil | Exterior | Crítico | Usuários |
29/02/2008 | 01/01/1970 | 2 / 5 | 3 / 5 |
Distribuidora | |||
Flashstar | |||
Duração do filme | |||
93 minuto(s) |
Dirigido por Sylvester Stallone. Com: Sylvester Stallone, Julie Benz, Matthew Marsden, Graham McTavish, Paul Schulze, Reynaldo Gallegos, Tim Kang.
Criado pelo escritor David Morrell, o veterano da guerra do Vietnã John Rambo tornou-se um verdadeiro ícone do Cinema norte-americano da década de 80 ao ser vivido por Sylvester Stallone, coroado poucos anos antes pelo sucesso de Rocky, um Lutador. Dirigido por Ted Kotcheff, Rambo: Programado para Matar era um filme de ação extremamente intensa e realista que trazia, em seu centro, duas importantes discussões: uma filosófica, sobre os efeitos da guerra sobre o espírito humano, e outra política, sobre a maneira nada nobre com que o governo dos Estados Unidos tratava seus combatentes veteranos (algo que pouco mudou, como podemos constatar através das recentes notícias sobre as péssimas condições dos hospitais militares como o Walter Reed). Já Rambo II: A Missão pouco mais era do uma fantasia típica da era Reagan que buscava reescrever a História ao encontrar uma forma de retratar os Estados Unidos como vencedores – ao menos, em certos aspectos – da guerra no Vietnã, ao passo que,
Perto de Rambo IV, porém, o terceiro capítulo da série era um exemplo brilhante de discussão política: com sua transformação em um bruto que abomina a Humanidade finalmente completada, Rambo agora segue a filosofia do “foda-se o mundo” (e cito suas palavras). Isto não quer dizer, porém, que o coração da fera não seja mais suscetível ao suplicante rosto de uma bela mulher e, assim, o sujeito atende ao pedido da missionária Sarah (Benz) para transportar seu grupo até Mianmar (ex-Birmânia) para que possam prestar auxílio à população massacrada pelo exército do governo. Quando os bem-intencionados missionários são capturados pelos cruéis soldados daquele país, no entanto, Rambo aceita guiar um bando de mercenários contratados para resgatá-los.
Novamente em alta depois de escrever, estrelar e dirigir o ótimo Rocky Balboa, Stallone assumiu funções similares nesta sua segunda franquia de sucesso, mas, infelizmente, com resultados bastante inferiores. Talvez por não absorver a complexidade de Rambo (e me refiro àquele do filme original) tão bem quanto compreende Rocky (sua criação, afinal de contas), o ator acaba convertendo o personagem em protagonista de um slasher movie não muito diferente de Jason Voorhees ou Michael Myers: se antes o peso de suas experiências sangrentas do passado guiava as ações do personagem, agora é o sangue e a violência que conduzem a narrativa. Sim, há um propósito para tamanho massacre, mas o resgate da mocinha e a derrubada do vilão são meros detalhes diante do prazer que Stallone exibe em criar seqüências pavorosamente gráficas.
Alegando usar a violência para atrair a atenção do mundo para o genocídio em Mianmar, porém, Stallone exibe a mesma ingenuidade política que o levou a cometer o ridículo Rocky IV (o pior daquela série), que já nasceu anacrônico em seu atrasado discurso sobre os males da Guerra Fria. Assim, sua decisão de retratar bebês sendo atirados ao fogo, crianças morrendo sob o golpe de baionetas e dezenas de adultos sendo despedaçados por tiros, facadas e explosões acaba tendo efeito contrário, anestesiando o espectador em função de seus excessos. Além disso, se a utilização de pavorosas imagens de arquivo já seria algo de gosto duvidoso em um documentário, seu emprego como introdução de um filme de ação é moralmente imperdoável, representando um tropeço ético que ilustra a falta de bom senso de Stallone como co-roteirista (ao lado de Art Monterastelli) e, principalmente, diretor.
Da mesma forma, o recurso maniqueísta de dar um rosto à crueldade das milícias de Mianmar acaba por anular qualquer tentativa de tornar o filme politicamente relevante, já que, indiretamente, atribui a barbárie a aberrações individuais em vez de salientar o fato de que o próprio contexto histórico no qual o país se encontra acaba se encarregando de criar novos e cada vez mais brutalizados monstros. (Como se não bastasse, Stallone apresenta as preferências homossexuais do vilão como uma espécie de confirmação final de sua canalhice, o que é lamentável, para dizer o mínimo.)
Curto e sangrento (sem os créditos finais, a projeção dura apenas 76 minutos), Rambo IV não traz o menor indício da competência demonstrada por seu astro na condução de seu trabalho anterior, Rocky Balboa: a própria decupagem da cena que se passa no barco do protagonista, quando este conduz os missionários, revela uma incompetência surpreendente, já que Sarah e seu arrogante companheiro Michael (Schulze, vivendo o tipo antipático no qual é especialista) conversam como se estivessem distantes de Rambo quando, na realidade, este se encontra a centímetros de distância. Por outro lado, a montagem se revela ágil sem se torna incompreensível, conferindo dinamismo e energia às seqüências de ação. E eu estaria mentindo se dissesse que não senti um arrepio na espinha ao escutar o velho e melancólico tema musical concebido por Jerry Goldsmith há 26 anos.
Mas nada disso justifica a moral corrompida exibida pelo longa, que parece advogar sem qualquer embaraço o uso da violência como maneira de resolver questões complexas como a situação caótica em Mianmar – e se um dos missionários inicialmente prega que tirar uma vida nunca é justificável, o filme demonstra um prazer quase bárbaro ao retratar o sujeito finalmente em “ação” (em outras palavras: matando um dos anônimos soldados inimigos). Ainda assim, o auge da estupidez de Rambo IV é representado pelo momento inacreditável em que o personagem-título detona uma bomba atômica em solo asiático, despertando incômodos (olha o eufemismo) ecos de Hiroshima e Nagasaki.
Já manifestei minha admiração por Stallone como ator em diversas ocasiões – e expressei meu carinho pela série Rocky ao escrever sobre seu mais recente (e tocante) capítulo. Porém, quando comemorei seu retorno à boa forma artística, não imaginei que empregaria sua recém-reconquistada influência para realizar algo tão abominável quanto este Rambo IV. E espero sinceramente que ele não forneça novos motivos para que eu passe a desejar sua queda definitiva na obscuridade.
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