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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
09/11/2007 09/11/2007 2 / 5 / 5
Distribuidora
Duração do filme
92 minuto(s)

Leões e Cordeiros
Lions for Lambs

Dirigido por Robert Redford. Com: Meryl Streep, Tom Cruise, Robert Redford, Michael Peña, Derek Luke, Andrew Garfield, Kevin Dunn, Peter Berg.

É triste quando um filme com o qual concordamos ideologicamente se revela profundamente falho como narrativa cinematográfica, mas este é, infelizmente, o caso de Leões e Cordeiros, primeiro trabalho na direção de Robert Redford depois de sete anos de ausência (seu último – e mediano – esforço como cineasta foi Lendas da Vida). Resumindo-se a um pobre exercício de retórica, o longa escrito por Matthew Michael Carnaham freqüentemente apela para simplificações históricas e lugares-comuns, falhando ao não apresentar uma única argumentação original em seus 88 minutos de falatório ininterrupto. E mesmo aplaudindo mentalmente o que estava sendo dito, não pude deixar de reconhecer que tudo aquilo já havia sido falado com maior eloqüência e eficácia por várias outras pessoas no passado.


Dividido em três frentes narrativas, o filme traz o próprio Redford como o professor Stephen Malley, que, “numa faculdade da Califórnia”, tenta convencer seu aluno mais promissor, Todd (Garfield), a explorar melhor seu potencial. Para isto, ele fala sobre dois ex-alunos, Ernest Rodriguez (Peña) e Arian Finch (Luke), que trancaram matrícula e se alistaram no exército, encontrando-se atualmente em uma missão secreta no Afeganistão – o que compõe o segundo terço da trama. Finalmente, acompanhamos uma intensa conversa entre a jornalista Janine Roth (Streep) e o senador republicano Jasper Irving (Cruise), que decide conceder uma entrevista exclusiva à repórter para revelar uma nova estratégia na “guerra contra o terrorismo”: o estabelecimento de pontos avançados no Afeganistão que possam ser utilizados numa ofensiva futura contra o Irã.

Mais preocupado em discutir suas idéias requentadas, o roteiro não se preocupa em transformar seus personagens em figuras reais, contentando-se em estabelecê-los como estereótipos do “professor universitário liberal”, o “republicano ambicioso”, a “jornalista inquiridora” (onde eles estavam há alguns anos?), o “estudante brilhante, mas perdido” e os “jovens idealistas e patriotas” (que, cumprindo o sistema de cotas de Hollywood, são vividos por um negro e um latino). Tentando transmitir a aparência de imparcialidade, o filme também tenta apresentar o senador Irving como um homem articulado, cortês e bem-intencionado (além de escalar Tom Cruise para vivê-lo, o que já diz muita coisa), mas boicota os próprios esforços ao incluir uma cena em que vemos, com detalhes, fotos do sujeito ao lado de figuras sorridentes como Dick Cheney, Bush Júnior e Condoleezza Rice. Ainda assim, Cruise é bem-sucedido ao conferir uma traiçoeira simpatia ao personagem, que também impressiona por seu raciocínio rápido e suas respostas enganadoramente articuladas.

Enquanto isso, Meryl Streep vive Janine Roth como o tipo de jornalista que fez (e faz) tanta falta aos Estados Unidos pós-11 de Setembro: dona de um rigor intelectual admirável, ela não hesita em fazer as perguntas certas (e duras) ao poderoso político à sua frente – e tampouco deixa de rebater as respostas vazias, incompletas ou falhas que lhe são apresentadas, deixando claro que não se contentará em ser uma mera porta-voz oficial das novas políticas daquela administração (um papel que, infelizmente, até mesmo jornais como o New York Times assumiram nos primeiros anos do governo Bush). Robert Redford, por sua vez, parece encantado com a postura idealista de seu personagem, sem perceber que, em boa parte das vezes, acadêmicos como Stephen Malley adoram bater nas próprias costas por sua visão progressista do mundo, mas falham diante da postura infinitamente mais agressiva dos conservadores, que acabam dominando a política norte-americana (e não apenas ela, infelizmente) ao explorarem a passividade de seus rivais liberais – e Malley entrega esta sua falta de pragmatismo ao dizer que o importante é “fazer qualquer coisa”, sem se importar com a eficácia da estratégia adotada, ou seja: se a intenção é nobre, falhar ao executá-la não é realmente um problema. Esta, aliás, também é a postura dos soldados vividos unidimensionalmente por Derek Luke e Michael Peña (que, como em World Trade Center, passa a maior parte da projeção imobilizado e à espera de socorro), que só se tornam mais interessantes quando comparados ao fraco novato Andrew Garfield, que interpreta o aluno Todd Hayes de maneira irritante, limitando-se a reagir com risadinhas irônicas a tudo que seu professor diz, transformando seu personagem em um sujeito incrivelmente antipático – algo gravíssimo, já que o roteiro espera que torçamos por sua “conversão”.

Acreditando ser politicamente relevante quando, na realidade, faz pouco mais do que funcionar como clipping das discussões sobre a política externa dos Estados Unidos (o Irã é o novo Iraque!), Leões e Cordeiros é falho também em seus aspectos cinematográficos, já que, além do visual desinteressante e da estrutura forçada, ainda apela para redundâncias como a legenda que identifica a “sala do professor Malley” quando já podemos ver claramente o nome do personagem estampado na porta ou o diálogo terrivelmente expositivo de Todd ao ouvir uma proposta do professor e comentar que “metade da classe mataria por um acordo como este”, como se fôssemos incapazes de perceber isso sozinhos.

Mas o mais decepcionante em Leões e Cordeiros é perceber que, por trás de seu discurso humanista e antibélico, há uma postura claramente romantizada do que significa ser um “Homem” e um “patriota”: manter-se de pé diante do inimigo, como um John Wayne sempre disposto a morrer como um bravo, mesmo que isto implique em basicamente cometer suicídio em vez de aguardar mais alguns segundos pela chegada da Cavalaria. E, neste sentido, o novo filme de Redford é lamentavelmente similar à repugnante ode jingoísta de atrocidades como Falcão Negro em Perigo – algo que certamente não era a intenção do assumidamente liberal cineasta.

09 de Novembro de 2007

Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

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