Seja bem-vindx!
Acessar - Registrar

Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
21/06/2016 23/06/2016 2 / 5 / 5
Distribuidora
Duração do filme
122 minuto(s)

Mistério na Costa Chanel
Ma Loute

Dirigido e roteirizado por Bruno Dumont. Com: Brandon Lavieville, Fabrice Luchini, Juliette Binoche, Valeria Bruni Tedeschi, Jean-Luc Vincent, Raph, Didier Després, Cyril Rigaux.

O novo filme de Bruno Dumont, Ma Loute, é uma comédia farsesco-fabulesca que, através da estilização dos personagens, do design de produção e dos figurinos, tenta fazer várias coisas ao mesmo tempo (o que é admirável) sem jamais conseguir realizar qualquer delas com eficiência (o que é lamentável).


Ambientado em uma pequena comunidade litorânea francesa na década de 30, o roteiro do próprio Dumont acompanha vários núcleos de ação: aqui, seguimos a família Van Peteghem, composta pelos aristocratas André (Luchini), Isabelle (Tedeschi) e Aude (Binoche); ali, vemos dois policiais que investigam uma série de desaparecimentos; acolá, testemunhamos os responsáveis pelos crimes, a família Brufort, que captura turistas para devorá-los; e, finalmente, somos apresentados à jovem Billie (Raph), que veste-se com roupas masculinas e desenvolve um surpreendente interesse pelo personagem-título (Lavieville), integrante da família de canibais.

Fotografado com cores intensas e alegres, Ma Loute não esconde sua proposta de combinar componentes fantásticos e temas socialmente relevantes – e já de início, quando vemos os Van Peteghem apontando para os Brufort como se estes fossem curiosidades da geografia, Dumont deixa claro que um dos propósitos da narrativa será ressaltar os eternos conflitos de classe (e tampouco é coincidência que os locais matem a fome com a carne dos turistas ricos). Além disso, o filme realmente mantém um equilíbrio eficiente entre o humor e a crítica social em seu primeiro ato, provocando risos especialmente com as gags físicas e com a composição dos personagens.

Aliás, se há algo que jamais desaponta aqui é o elenco: Luchini (tão fantástico em Courted, que vi no Festival de Tribeca) transforma o esnobe André em uma coleção grotesca de maneirismos e caretas, conseguindo manter sua composição interessante durante as duas horas de projeção, ao passo que Raph, como a jovem Billie, se contrapõe bem aos excessos dos companheiros ao ilustrar a natureza transgênero de seu personagem (e se uso ambos os gêneros ao me referir a ele/ela é porque Billie constantemente oscila entre identidades, mostrando-se confortável em ambas). Já Juliette Binoche, embora divirta inicialmente, acaba perdendo a mão a partir do terceiro ato, quando o exagero de suas caretas se torna apenas cansativa.

Enquanto isso, boa parte dos demais intérpretes fascinam já com seus rostos marcantes e atípicos, de Brandon Lavieville (como Ma Loute) a Didier Desprès e Cyril Rigaux (como os investigadores Machin e Malfoy, que surgem como referências claras a Oliver Hardy e Stan Laurel). Infelizmente, se a princípio é até divertido notar a dificuldade com que o chefe Machin se locomove (ele vai inchando de frustração por não resolver os casos, algo que o design sonoro ressalta ao acompanhar seus movimentos com os ruídos que remetem à borracha de um balão), aos poucos a gag vai se revelando repetitiva até tornar-se apenas cansativa e constrangedora.

Para piorar, Ma Loute ainda tenta fazer humor com temas como incesto (não, pior: com o abuso sexual que a personagem de Binoche aparentemente sofreu por parte do pai e do irmão) e violência contra transgêneros. E quando chegamos a este ponto, o filme definitivamente já perdeu a graça há muito tempo.

Texto originalmente publicado como parte da cobertura do Festival de Cannes 2016.

13 de Maio de 2016

Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

Para dar uma nota para este filme, você precisa estar logado!