Datas de Estreia: | Nota: | ||
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Brasil | Exterior | Crítico | Usuários |
15/01/2017 | 16/09/2016 | 5 / 5 | / 5 |
Distribuidora | |||
Duração do filme | |||
103 minuto(s) |
Dirigido por Anne Zohra Berrached. Roteiro de Carl Gerber e Anne Zohra Berrached. Com: Julia Jentsch, Bjarne Mädel, Johanna Gastdorf, Emilia Pieske e Maria-Victoria Dragus.
Exibido na mostra competitiva do Festival de Berlim de 2016, o alemão 24 Semanas tinha tudo para se revelar um melodrama dedicado à manipulação descarada do público. Em vez disso, acaba se apresentando como um drama sutil, mas incrivelmente poderoso e devastador.
Trazendo a bela e talentosa Julia Jentsch em uma performance que se estabeleceu como uma das melhores do evento e do ano (sendo uma pena ter sido basicamente ignorada pelas principais premiações do meio), o longa acompanha a comediante de stand-up Astrid Lorentz (Jentsch), que, famosa e feliz no casamento com seu empresário Markus (Mädel), está grávida de seu segundo filho. Quando descobrem que a criança nascerá com Síndrome de Down, o casal cogita momentaneamente optar pelo aborto permitido nestes casos pela legislação alemã – até que, depois de visitarem grupos de apoio organizados por pais de crianças com a síndrome, concluem que seu filho poderá ter uma vida perfeitamente feliz e decidem seguir adiante. É quando um problema mais grave na formação do feto é descoberto e começa a dividir o casal: enquanto Markus se mantém firme contra o término da gestação, Astrid passa a cogitá-lo por acreditar que o filho terá uma vida terrivelmente sofrida.
Como é fácil constatar, o tema abordado pela cineasta Anne Zohra Berrached é controverso por natureza – e a diretora não foge de seus pormenores mais espinhosos e nem parte para soluções artificiais. Ao longo dos dolorosos 103 minutos de projeção, o debate interno experimentado pelo casal é exposto de maneira honesta e adulta, fugindo da simplificação entre o “certo” ou “errado” e mergulhando em argumentos que podem ser defendidos com convicção pelos dois lados. Aliás, outro mérito de 24 Semanas reside em sua determinação em não transformar Astrid ou Markus em vilões, pois percebemos que, qualquer que seja a decisão tomada, o resultado inevitavelmente trará graus imprevisíveis de dor e sofrimento. Além disso, Berrached compreende que, por maior que seja a participação e o companheirismo do marido, o corpo que abriga a gestação pertence a Astrid e que esta é, em última análise, a dona da palavra final.
Apresentando uma das melhores representações do debate sobre o aborto que já vi em uma obra ficcional (em forma de documentário, recomendo o excepcional Lake of Fire, de Tony Kaye), 24 Semanas é tudo o que um cinéfilo espera de um longa em competição na Berlinale: sua abordagem narrativa é elegante; a fotografia usa a temperatura da luz para evocar a atmosfera dramática de forma orgânica à medida que a história avança; o elenco é homogeneamente brilhante e o roteiro jamais foge das discussões que se propõe a desenvolver.
Primeiro filme a me fazer chorar vergonhosamente em Berlim, o longa certamente figurou entre os mais memoráveis desta edição do evento. E Julia Jentsch se converteu em um nome ao qual sempre dedicarei atenção redobrada em qualquer projeto.
Texto originalmente publicado durante a cobertura do Festival de Berlim 2016.
15 de Fevereiro de 2016