Datas de Estreia: | Nota: | ||
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Brasil | Exterior | Crítico | Usuários |
22/06/2017 | 25/05/2017 | 3 / 5 | / 5 |
Distribuidora | |||
Vitrine Filmes | |||
Duração do filme | |||
94 minuto(s) |
Dirigido por Cristiane Oliveira. Roteiro de Cristiane Oliveira e Michele Frantz. Com: Maria Galant, Marat Descartes, Verónica Perrotta, Áurea Baptista, Amélia Bittencourt, Jorge Esmoris, Fabiana Amorim, Liane Venturella, Diego Trinidad e Renan Goulart.
Estreia na direção de longas da gaúcha Cristiane Oliveira, Mulher do Pai é um filme que se apresenta ao mesmo tempo como estudo de personagem e exemplar do subgênero “coming-of-age” (obras que lidam com a transição para a idade adulta). O contexto do filme de Oliveira, porém, é bastante particular, já que se passa num vilarejo no sul do país e acompanha Nalu (Galant), uma garota de 16 anos que mora com a avó e o pai cego num casebre localizado fora do que poderia ser chamado de “zona urbana” (se é que isso se aplica ao local). Quando a avó morre de repente, a moça se vê sozinha com o pai, Ruben (Descartes), pela primeira vez na vida – e a ausência daquela que funcionava como ponto de equilíbrio entre os dois logo traz resultados desconfortáveis.
O primeiro ato da produção, que nos apresenta ao cotidiano de Nalu e ao seu universo, não demora a demonstrar a habilidade da cineasta estreante, que faz um trabalho eficaz ao estabelecer a geografia local, as condições humildes da casa, da pequena cidade e da escola, além de desenvolver a relação entre a protagonista, seus parentes, a melhor amiga e a professora Rosario (Perrotta), uma uruguaia que ensina Artes para os jovens do lugar. Além disso, o roteiro escrito por Oliveira e Michele Frantz planta com sucesso a origem do arco dramático que servirá de centro à narrativa: a frieza entre Nalu e Ruben e a aproximação gradual entre os dois.
O elenco, por sinal, desempenha com uma simplicidade enganosa a função de dar vida a personagens com vidas interiores tão ricas, jamais se entregando a histrionismos ou a muletas de interpretação para ilustrar a evolução daquelas pessoas. A novata Maria Galant, em particular, encarna Nalu com uma timidez que soa convincente justamente por só ser observada nos instantes nos quais suas inseguranças de adolescente são testadas, enquanto Descartes conduz Ruben de uma postura amargurada, sisuda e fisicamente rígida a um ponto no qual constatamos com clareza como permitiu que parte do peso que sempre carregou deixasse seus ombros. Para finalizar, a uruguaia Perrotta vive Rosario como uma mulher espontânea e generosa que, ao perceber a angústia de uma aluna, demonstra um interesse genuíno em auxiliá-la, envolvendo-se mais do que poderia antecipar.
Tocante sem se render a draminhas artificiais, Mulher do Pai tem confiança no mundo que criou e nas trajetórias dos personagens, o que traz força adicional a momentos como aquele no qual Ruben relembra o instante em que tocou o rosto da mãe pela primeira vez em anos e se surpreendeu ao notar como estava diferente do que se lembrava, já que a falta de visão preservara seu rosto jovial em sua memória. Do mesmo modo, uma infinidade de tristes significados pode ser deduzida a partir de uma troca de diálogos que, de tão sutil, corre o risco de passar despercebida: ao ouvir que sua mãe, que mal conheceu, “fazia coisas bonitas”, Nalu responde casualmente “Eu fui acidente”, o que expõe a maneira como se enxerga e, principalmente, como julga que o pai a encara.
Com uma fotografia que não tenta chamar a atenção para si mesma ainda que seja competente ao evocar um tom frio que reflete a tristeza daqueles indivíduos, o filme por vezes exibe um preciosismo que só soa como tal em função de certa artificialidade, talvez fruto da inexperiência da diretora – e notem, por exemplo, o plano no qual Nalu e Ruben podem ser vistos de lados opostos de uma porta que os separa e verão como a jovem atriz se coloca cuidadosamente no ponto determinado por Oliveira, chegando a ajustar a posição para não estragar o simbolismo almejado. Por outro lado, é inegável, a beleza de construções como aquela que sugere que o ponto mais interessante da vila é a estação de trem - que, afinal, é o local a partir do qual todos deixam o lugarejo (ou deixariam, já que outro personagem logo esclarece que os trens nem sequer param ali).
E, assim, é uma pena que subitamente Mulher do Pai decida introduzir um subtema que, em vez de enriquecer a narrativa, desaba sobre esta com um peso que quase provoca o desmoronamento de todo o resto, iniciando com uma conversa entreouvida por alguém que respira pesadamente e tornando-se rapidamente incômoda a ponto de comprometer o envolvimento do espectador.
Possivelmente imaginada como uma forma de ressaltar a carência daquelas pessoas e o desejo crescente de uma conexão, o tal subtema soa apenas arbitrário e desconfortável, o que, associado ao desfecho que apela para uma solução fácil e artificial, impede que esta estreia de Cristiane Oliveira provoque o impacto que as habilidades reveladas da diretora inicialmente sugeriam.
Texto originalmente publicado como parte da cobertura do Festival de Berlim 2017.
14 de Fevereiro de 2017
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