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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
31/07/2014 21/07/2014 4 / 5 4 / 5
Distribuidora
Disney

Guardiões da Galáxia
Guardians of the Galaxy

Dirigido por James Gunn. Roteiro de James Gunn e Nicole Perlman. Com: Chris Pratt, Zoe Saldana, Lee Pace, Dave Bautista, Michael Rooker, Karen Gillan, Djimon Hounsou, John C. Reilly, Glenn Close, Benicio Del Toro, Josh Brolin e as vozes de Bradley Cooper e Vin Diesel.

Não é possível dizer que os universos criados em Homem de Ferro, Thor, Capitão América, Hulk e Os Vingadores sejam “realistas” ou “pesados” de um ponto de vista dramático, mas quando os comparamos ao que a Marvel faz em Guardiões da Galáxia a diferença é óbvia: se aqueles longas traziam instantes que aspiravam à solenidade, este traz o protagonista derrubando desajeitadamente o objeto mais importante da trama em um momento-chave. É quase como se o diretor James Gunn estivesse tentando mandar uma mensagem à própria Marvel que o financiou ao lado da Disney: “Ei, gente. Vamos relaxar um pouco? Nem todo mundo precisa ser denso como O Cavaleiro das Trevas, ok?”.


E que bom que não precisam. Escrito pelo próprio Gunn ao lado de Nicole Perlman, Guardiões da Galáxia é um filme que se permite rir das próprias bobagens, mas que, para isso, adota uma estratégia narrativa inteligente ao abrir a projeção com uma cena dramática que, sem qualquer sinal de ironia, nos apresenta a uma criança solitária que, sem ter um pai que a apoie, exibe um olho roxo e se entrega às músicas oitentistas gravadas em uma compilação pela mãe que está prestes a perder para o câncer. Assim, quando o pequeno Peter Quill finalmente se descobre órfão e corre para fora do hospital a fim de se entregar a um choro desesperado, é com surpresa que testemunhamos sua abdução por um OVNI – e mesmo que a partir daí o longa se dedique ao riso, o drama daquela sequência inicial irá manter o espectador ao lado do protagonista cujo sofrimento testemunhou.

Aliás, uma das maiores virtudes de Guardiões da Galáxia reside em sua modéstia, já que o filme jamais parece se esforçar para provar sua óbvia inteligência – e aqui retorno, novamente, à sua introdução, que não só funciona para nos colocar ao lado do protagonista, mas também para plantar pistas que serão importantes no terceiro ato (e que não mencionarei para evitar spoilers, embora adiante que dizem respeito à natureza do herói). Além disso, ao ancorar as referências de Quill na década de 80, o cineasta encontra a desculpa perfeita para criar tiradas bem-humoradas envolvendo a cultura pop da época – e que encontram reflexo, diga-se de passagem, na primeira sequência que o traz adulto (já vivido por Pratt), quando, com seu casaco e a bolsa a tiracolo, obviamente vive uma pequena aventura que faz referência direta a Os Caçadores da Arca Perdida.

Inspirando-se também no western ao conceber o visual do ameaçador Yondu (Rooker) e seus capangas, James Gunn demonstra ter estudado de perto a estratégia de George Lucas em Star Wars, usando gêneros bem estabelecidos (e de época) para conferir certo grau de realismo ao universo fantasioso que irá criar – e, assim, mesmo que Guardiões da Galáxia seja habitado por criaturas fantásticas (num excepcional trabalho de maquiagem de Elizabeth Yianni-Georgiou), o mundo multicolorido por elas habitado sugere ter uma história antiga, o que o torna mais verossímil. Para tornar tudo mais fascinante, o design de produção de Charles Wood concebe mundos com características marcantes, desde o crânio gigante que serve de colônia mineradora até o belo planeta Xandar, com seu visual limpo que sugere uma sociedade avançada e benevolente. E se as cores chapadas que atravessam a projeção remetem diretamente aos quadrinhos, esta impressão é reforçada por planos imponentes como os que trazem o vilão Thanos sentado em seu trono ou a imagem de um casal flutuando no vácuo.

Demonstrando um bom olhar ao conceber sequências de ação que combinam agilidade e humor, o diretor James Gunn (do fraco Seres Rastejantes e do bacana Super) ainda exibe uma certa influência do trio Zucker-Abraham-Zucker ao incluir gags recorrentes ao fundo de seus planos, provando ter talento também para criar momentos que conseguem homenagear o gênero “super-herói” ao mesmo tempo em que o satirizam – como, por exemplo, ao trazer os heróis caminhando lado a lado em uma típica câmera lenta que, mesmo grandiosa, traz Gamora (Saldana) bocejando e Rocket (Cooper) ajeitando a virilha.

Igualmente importante para o sucesso do filme, aliás, é a performance de Chris Pratt, que consegue se mostrar irreverente sem, contudo, se colocar acima do material, como se estivesse rindo de tudo ao lado do espectador. Seu Peter Quill se leva tremendamente a sério, insistindo em ser chamado de Star-Lord e demonstrando orgulho ao ser atendido. Por outro lado, Quill não se envergonha em realizar um ato de heroísmo apenas, para no instante seguinte, se gabar do que fez, como se exigisse ser reconhecido por suas ações. Enquanto isso, o grandalhão Drax é encarnado por Dave Bautista como um sujeito fisicamente poderoso, mas emocionalmente vulnerável (e sua incapacidade de entender metáforas é hilária), ao passo que Groot (Vin Diesel), com seus olhos grandes e gentis e seu vocabulário limitado, acaba se tornando uma versão Ent de Chewbacca, fazendo um contraponto perfeito ao Han Solo encarnado pelo guaxinim Rocket (Cooper), que, por trás da pose de durão, esconde um lado desesperado por afeto – e o instante no qual confessa suas mágoas é um primor de animação, permitindo que vejamos seus lábios trêmulos de dor.

Cumprindo bem a função de envolver o espectador em um mundo habitado por personagens que nem de longe são tão célebres quanto aqueles vividos por Robert Downey Jr., Chris Hemsworth, Chris Evans e Mark Ruffalo, Guardiões da Galáxia é uma excelente introdução a uma franquia que não só promete funcionar bem sozinha, mas que também exibe potencial para complementar aquelas estreladas por seus primos mais famosos. Resta saber, claro, como seu visual alegre e multicolorido se adaptará ao universo cinza e relativamente denso habitado pelos demais.

De minha parte, confesso estar curioso desde já.

Observação: há uma cena adicional após os créditos finais. E surpreendente.

31 de Julho de 2014

Videocast sobre o filme:

Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

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