Datas de Estreia: | Nota: | ||
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Brasil | Exterior | Crítico | Usuários |
25/11/2011 | 01/01/1970 | 1 / 5 | 2 / 5 |
Distribuidora | |||
Duração do filme | |||
91 minuto(s) |
Dirigido por Gus Van Sant. Com: Henry Hopper, Mia Wasikowska, Ryo Kase, Schuyler Fisk, Lusia Strus, Jane Adams.
Ao longo do Festival do Rio de 2011, certamente vi filmes bem piores do que este Inquietos (Chapeuzinho Vermelho do Inferno e Ninja Kids!!! vêm à mente), mas nenhum que me irritasse tanto quanto este novo trabalho de Gus Van Sant. Concebido para funcionar como um drama sensível sobre um jovem casal rodeado pela morte, esta imbecilidade escrita pelo estreante Jason Lew e viabilizada graças à sua amizade com a co-produtora Bryce Dallas Howard é a típica besteira que o cinema indie norte-americano produz aos rodos e que o enfraquece ao transformá-lo não em um modo de produção, mas em um gênero em si mesmo, com direito a todos os clichês, caricaturas e convenções que vêm no pacote.
Recheado de personagens que só poderiam existir na mente de alguém que cresceu vendo cinema demais e que, sem experiência de vida aparente, parece julgar que suas figuras unidimensionais serão capazes de recitar grandes lições existenciais a partir de suas idiossincrasias engraçadinhas, Inquietos jamais percebe que suas criações soam menos como seres humanos de verdade e mais como clichês ambulantes concebidos por um patético aspirante a John Cassavetes – e, assim, somos obrigados a passar 91 intermináveis minutos ao lado de um rapaz que, por vestir paletó, colete e gravata pretos, acredita ter uma personalidade “intrigante” quando, de fato, tem apenas um bom estilista.
Um sub-Ensina-me a Viver para a geração Kevin Smith, Inquietos traz o filho de Dennis Hopper, Henry (a cara do pai jovem), como Enoch (reparem o nome), um órfão que, vivendo com a tia, passa os dias entrando como penetra em funerais e que acaba conhecendo Annabel (Wasikowska, certa de que ganhará o Oscar), que encontra-se no estágio terminal de câncer no cérebro – algo que jamais adivinharíamos, já que continua bela e saudável o bastante para correr ao lado do namorado, apresentando uma ou outra convulsãozinha ocasional apenas para que não acreditemos que sua doença é uma farsa. Interessada em ornitologia e em Darwin (todo personagem indie tem que ter hobbies atípicos para sua idade), Annabel decide que a melhor maneira de passar seus últimos dias é dividindo sua vida com um rapaz que a leva para visitar necrotérios e para conversar com o túmulo dos pais – mas, ei, seria pior se ele também fosse esquizofrênico e/ou visse fantasmas e... hum... ele é e/ou vê.
Ciente de que um filme se beneficia de conflitos depois de ler algo assim em um manual de roteiro, Jason Lew aqui e ali tenta criar obstáculos no caminho de seus personagens ao incluir desentendimentos e brigas tão artificiais que é uma surpresa os atores não caírem na risada ao encená-los – como no instante, por exemplo, em que Enoch e Annabel se desentendem quando ele decide (juro!) improvisar durante uma encenação que ensaiam sobre a morte da garota ou no momento em que (juro!) o rapaz bate boca com o fantasma/alucinação de um piloto kamikaze. E o que dizer dos esforços de Elizabeth (Fisk, filha de Sissy Spacek), irmã de Annabel, para impedir que o jovem casal se encontre, já que não aprecia Enoch? O que ela teme? Que ele seja uma “má influência” para a irmã... que morrerá em três meses?
Não que eu não concorde com Elizabeth: Enoch é, de fato, uma péssima influência para qualquer um e um indivíduo profundamente antipático e ignorante (“Darwin era o cara da Evolução?”): egoísta, ressentido e mal-educado, ele é o típico sujeito que acredita ser muito mais esperto e divertido do que é na realidade – e quando a irmã da namorada o cumprimenta com um “Você deve ser Enoch”, ele imediatamente responde com um “Devo ser” que, apesar de claramente acreditar ser uma tirada ótima, ilustra apenas sua grosseria constante. Com isso, não apenas não compreendemos por que Annabel decidiria passar seu tempo restante na Terra ao lado de alguém tão irritante como sua decisão ainda acaba refletindo mal em nosso julgamento sobre sua capacidade de discernimento. Se aquele é o tipo de homem que a atrai, talvez a morte precoce tenha sido uma benção disfarçada.
Usando as paisagens desfolhadas do outono e a brancura opressiva do inverno como cenários óbvios da narrativa melancólica, o diretor Gus Van Sant ainda usa a trilha onipresente de Danny Elfman, com seus temas lúdicos e engraçadinhos, para pontuar a sensibilidade típica do gênero indie – e mais clichê do que isto seria apenas a inclusão das canções mentalmente retardadas de Kimya Dawson, consagradas em Juno (que, no entanto, ali acabavam funcionando por refletir os personagens igualmente tolos).
Plagiando descaradamente Richard Linklater e seu magnífico Antes do Amanhecer ao incluir um desfecho que traz planos que exibem os cenários agora abandonados, Inquietos ainda revela sua hipocrisia ao converter magicamente o piloto kamikaze de alucinação a fantasma quando isto se revela uma maneira de enviar o espectador para fora do cinema com uma sensação de conforto artificial e profundamente hollywoodiana, demonstrando que, quando lhe convém, o roteiro não hesita em saltar de Cassavetes a Nora Ephron.
Inquietos é puro desperdício de celulóide. Ou de Kbytes, como queiram.
Observação: esta crítica foi originalmente publicada como parte da cobertura do Festival do Rio de 2011.
19 de Outubro de 2011