Datas de Estreia: | Nota: | ||
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Brasil | Exterior | Crítico | Usuários |
04/11/2011 | 01/01/1970 | 2 / 5 | 5 / 5 |
Distribuidora | |||
Dirigido por Jim Sheridan. Com: Daniel Craig, Rachel Weisz, Naomi Watts, Marton Csokas, Elias Koteas, Taylor Geare, Claire Astin Geare.
Meu Pé Esquerdo, Em Nome do Pai, Terra de Sonhos e A Casa dos Sonhos – um destes títulos dirigidos pelo cineasta irlandês Jim Sheridan não se encaixa na lista e identificá-lo não é difícil: basta selecionar aquele que, ao contrário dos demais, lida com personagens inverossímeis presos em um roteiro ridículo. Menos simples é tentar entender o que levou Sheridan a assumir um projeto que só não é terrivelmente convencional do início ao fim porque depois de certo tempo salta de vez do clichê ao estúpido.
Escrito por David Loucka (pfff), que deve ter dado batidinhas satisfeitas nas próprias costas ao imaginar a reviravolta que ocorre no meio do filme (quando deveria ter se nocauteado), o roteiro acompanha Will Atenton (Craig), um editor que abandona seu importante cargo para dedicar mais tempo à família e finalmente escrever o livro que há tanto tempo planeja. No entanto, quando coisas estranhas começam a acontecer em sua nova casa, ele e a esposa Libby (Weisz) descobrem que, cinco anos antes, o homem que ali residia matou toda a família – e ao investigar o paradeiro atual do assassino, Will acaba fazendo uma descoberta chocante. Chocante, eu digo!
O mais decepcionante em A Casa dos Sonhos é que o bom elenco e a sensibilidade de Sheridan ao lidar com personagens realmente levam o espectador a se importar com os Atentons. Agindo como pessoas sensatas mesmo quando começam a perceber que algo incomum pode estar ocorrendo ali, eles mantêm uma dinâmica familiar adorável, permitindo que o público perceba o amor e o carinho que nutrem uns pelos outros. Além disso, o diretor consegue criar um princípio de tensão justamente por nos importarmos com aqueles indivíduos e, portanto, é lamentável quando o roteiro de Loucka (pfff) decide entrar em modo de autodestruição, levando consigo todo o projeto.
Não que a mudança seja súbita: aqui e ali a mão pesada do roteirista já se tornara evidente através da introdução desajeitada de subtramas (como a relação da vizinha vivida por Naomi Watts com o ex-marido) e também de diálogos absolutamente pavorosos (“Peter Ward, fique longe de mim!”). Sim, pontualmente Loucka (pfff) demonstra certo grau de inspiração em falas mais sutis (“Posso enxergar os personagens do meu livro tão bem quanto vejo vocês agora”), mas, de modo geral, o sujeito parece apenas ansioso para chegar logo ao momento da reviravolta que obviamente foi o ponto de partida para o projeto – e é inacreditável que não tenha percebido como, apesar de funcionar em teoria, sua ideia nada tinha de original e dificilmente se mostraria eficaz no contexto por ele criado.
Para começo de conversa (e sugiro que não leia o restante deste parágrafo caso ainda não tenha visto o filme ou seu trailer, que entrega tudo), o roteiro de Loucka (ok) não se decide quanto à natureza do protagonista, que é sensato demais para ser insano e obviamente insano demais para ser tão sensato – afinal, como o mesmo homem pode ignorar quem é e também seu passado e ainda assim saber quem é e o que ocorreu em seu passado? Mas esta indefinição é apenas o início dos problemas, já que o mesmo ocorre com as personagens de sua esposa e filhas, que se estabelecem como alucinações durante a maior parte da narrativa (e é ridículo que, nesse meio tempo, o filme tente nos fazer sentir pena de uma visão) apenas para que, no último momento, revele que eram fantasmas – ao menos, é o que parece, já que em um único plano, Libby aparentemente move um objeto.
Fotografado com a elegância habitual por Caleb Deschanel, que ressalta bem as diferenças entre o mundo “real” e as “alucinações” de Will através de paletas contrastantes, A Casa dos Sonhos finalmente reserva um golpe final à paciência do espectador ao revelar seus absurdos e caricaturais vilões em um clímax risível e inacreditável.
O que me traz novamente à pergunta original: o que pode ter levado Sheridan e um elenco tão talentoso (especialmente Watts, que faz uma quase figuração no projeto) a se envolverem em uma produção que trazia um roteiro tão ruim? Seja como for, saber que Craig e Weisz se apaixonaram durante as filmagens, casando-se logo em seguida, serve como uma espécie de consolo, já que ao menos alguém se beneficiou da existência desta besteira colossal.
Observação: esta crítica foi originalmente publicada como parte da cobertura do Festival do Rio de 2011.
19 de Outubro de 2011