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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
14/08/2009 01/01/1970 2 / 5 2 / 5
Distribuidora
Duração do filme
83 minuto(s)

Brüno
Bruno: Delicious Journeys Through America for the Purpose of Making Heterosexual Males Visibly Uncom

Dirigido por Larry Charles. Com: Sacha Baron Cohen, Gustaf Hammarsten, Clifford Bañagale.

Ao escrever sobre Borat, em fevereiro de 2007, comentei que o ator britânico Sacha Baron Cohen surgia como uma promissora revelação graças a um filme que, funcionando maravilhosamente bem como comédia, ainda era eficaz como uma profunda crítica social à mentalidade xenofóbica e jingoísta dos norte-americanos, atacando e expondo, ainda, a homofobia e a misoginia de um povo tomado pelo conservadorismo. Pois Brüno, novo trabalho do comediante, obviamente tenta seguir a mesma linha; o problema é que, se antes Cohen apenas criava as situações e permitia que suas vítimas se enforcassem sozinhas, aqui ele praticamente laça os pescoços de seus interlocutores, coloca-os no cadafalso e abre a porta do alçapão. Com isso, o filme surge menos como um espelho erguido diante da sociedade e mais como uma armadilha barata – e esta diferença é o bastante para escavar um abismo entre os efeitos provocados por Borat e Brüno.

Último dos personagens “clássicos” da série Da Ali G Show a ganhar seu próprio filme, Brüno é um jornalista austríaco gay que, afetado ao extremo, decide se tornar famoso e viaja para Los Angeles com este propósito em mente. Acompanhado do assistente Lutz (Hammarsten), ele tenta atuar em séries de tevê, resolve criar sua própria fita caseira de sexo destinada a “vazar” na Internet e se esforça até mesmo para ser seqüestrado por terroristas. Não é difícil perceber, portanto, que em sua estrutura Brüno é uma cópia clara de Borat, embora, ao contrário do longa de 2007, jamais consiga criar uma narrativa consistente a ponto de disfarçar a natureza episódica da história. Além disso, se Borat desenvolvia as situações com cuidado, investindo um bom tempo de projeção em cada seqüência, as “aventuras” de Brüno ocorrem de maneira excessivamente breve, impedindo que as cenas adquiram ritmo ou mesmo que se tornem eficazes: quando os encontros com o líder terrorista Abu Aita ou com duas consultoras de imagem pateticamente desinformadas começam a se tornar interessantes, os encontros chegam ao fim de maneira súbita e anti-climática enquanto o filme já se lança no incidente seguinte.

É possível, claro, que isto tenha ocorrido graças ao sucesso do filme anterior, já que Cohen certamente enfrentou mais dificuldades para pegar suas “vítimas” desprevenidas – e, em certos instantes, é perfeitamente possível perceber o ator sendo reconhecido por seus companheiros de cena. Isto, aliás, leva a um outro problema grave, já que os quatro roteiristas foram obrigados, desta vez, a criar um número maior de personagens fictícios e de cenas “armadas” – e se há algo que prejudica terrivelmente um filme como Brüno é a distração do espectador ao tentar imaginar se o que está testemunhando em dado momento aconteceu espontaneamente ou foi pré-roteirizado. Além disso, há um caminhão de diferença entre uma cena “real” (como aquela em Borat na qual o personagem-título recebe o conselho de raspar o bigode para “não parecer muçulmano”) e uma ensaiada (como no instante, aqui, em que Paula Abdul diz se importar com outras pessoas enquanto permanece sentada sobre um mexicano, numa ironia artificial).

Mas não é só: o que Cohen e o diretor Larry Charles pensam estar conseguindo ao apresentarem o piloto do programa de Brüno para um grupo de teste que vê, chocado, um plano-detalhe do pênis do sujeito? Certamente a reação destas pessoas não pode ser atribuída à homofobia ou à intolerância, já que qualquer ser humano minimamente sensato se surpreenderia com o show absurdo apresentado pelo austríaco – e, da mesma forma, por mais que discorde politicamente do congressista republicano Ron Paul, confesso que senti pena do sujeito ao vê-lo ser encurralado por Cohen em uma situação que – repito – deixaria qualquer um desconfortável. Com isso, Sacha Baron Cohen acaba se transformando numa espécie de Ivo Holanda de luxo, realizando o mesmo tipo de trabalho bobo, inconseqüente e descartável que este fazia nas “pegadinhas” apresentadas no programa de Silvio Santos.

Isto não quer dizer, porém, que Cohen não continua a se mostrar um ator excepcional (algo que ficou comprovado não apenas em Borat, mas também em Ricky Bobby: A Toda Velocidade e Sweeney Todd): demonstrando uma concentração impecável, ele faz uma belíssima composição de personagem, exibindo imenso cuidado na concepção não só do visual de Brüno, mas também na de seu sotaque e em sua postura (e, mais uma vez, ele se revela um grande talento para o humor físico, como podemos constatar na cena envolvendo uma roupa de velcro). Por outro lado, falta a Brüno um detalhe que, presente em Borat, levava o espectador a perdoar todos os seus “defeitos”: a inocência. Se o “jornalista do Cazaquistão” soava como uma criança imatura, Brüno surge apenas como um egocêntrico fútil e ignorante, o que torna mais difícil para o público ignorar os elementos repugnantes de seu caráter, o que compromete nosso envolvimento com o personagem.

Ainda assim, há momentos pontuais em que Brüno resgata de maneira brilhante a acidez de Borat, como ao retratar a sede de fama que leva muitos pais a usarem seus filhos como meros objetos de cena – e a entrevista que Cohen faz com alguns indivíduos que concordam com qualquer coisa para que suas crianças estejam diante de uma câmera rivaliza com os melhores instantes do filme de 2007. Da mesma maneira, a seqüência inicial, que traz Brüno expondo a estúpida futilidade de alguns profissionais do meio da moda, serve como um triste indício de como o filme poderia ter sido eficaz caso não tivesse perdido o foco no meio do caminho.

Artificial e cruel quando deveria ser espontâneo e instigante, Brüno finalmente acaba cometendo um erro fatal para qualquer comédia: leva o espectador a sentir dó das “vítimas” de seu astro – e quando nos apiedamos daqueles cuja ignorância deveria nos fazer rir, a coisa subitamente perde toda a graça.

14 de Agosto de 2009

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Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

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