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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
21/03/2008 01/01/1970 1 / 5 / 5
Distribuidora
Duração do filme
113 minuto(s)

Um Amor de Tesouro
Fool´s Gold

Dirigido por Andy Tennant. Com: Matthew McConaughey, Kate Hudson, Donald Sutherland, Alexis Dziena, Ewen Bremner, Kevin Hart, Malcolm-Jamal Warner e Ray Winstone.

 

Um Amor de Tesouro é um dos tipos de besteira mais irritantes que existem: aquele que acredita precisar de duas horas para ser contado. Enquanto outras bobagens similares ao menos nos fazem o favor de reconhecer que são bobagens e que, portanto, não devem tomar mais do que 80 ou 90 minutos de nossas vidas, este novo veículo do astro Matthew McConaughey parece se julgar suficientemente interessante para ocupar quase 120 minutos de projeção, transformando-se numa experiência que beira o insuportável, certamente ultrapassando a fronteira da tortura.

 

Tentando se tornar uma espécie de Tudo por uma Esmeralda contemporâneo (mas sem o talento de Robert Zemeckis, Michael Douglas, Kathleen Turner e Danny DeVito), o roteiro escrito por Daniel Zelman e John Claflin (os gênios por trás de Anaconda 2) ao lado do diretor Andy Tennant (o mestre responsável por Doce Lar e Hitch) conta a história de um casal que, entre discussões e alfinetadas, mal consegue ocultar a imensa atração que sentem um pelo outro. Enquanto brigam, porém, eles também se dedicam a uma típica “caça ao tesouro”, sendo auxiliados na tarefa por um multimilionário solitário e sua mimada e estúpida filha socialite. Ameaçados por um rapper violento que é dono da ilha na qual o tesouro está escondido e por um antigo rival, Benjamin (McConaughey) e Tess (Hudson) se metem em inúmeras confusões e...

 

...desculpem-me, mas eu não consigo continuar. Basta dizer que o roteiro tenta misturar desajeitadamente momentos cômicos, românticos e violentos, sendo porcamente auxiliado pela trilha óbvia e maniqueísta do antes confiável George Fenton, que desde 1996, quando trabalhou em As Bruxas de Salem, não faz nada que mereça ser mencionado. Aliás, todo o conceito musical de Um Amor de Tesouro abusa da obviedade, já que as canções selecionadas pelo diretor e pelo estúdio poderiam perfeitamente funcionar como um best hits do reggae (agradável aos ouvidos, sem dúvida, mas batido ao extremo). Da mesma maneira, o cineasta Andy Tennant abre o filme fazendo jus ao chavão da trilha, entregando-se a um plano aéreo que, percorrendo um mar incrivelmente azul, finalmente encontra o barco do herói, passando a circular à sua volta.

 

A partir daí, o lugar-comum domina de vez a narrativa: das brigas artificiais do casal principal (eles se amam, não percebem?!) à insistência com que os vilões capturam a mocinha (algo que ocorre duas vezes ao longo da projeção!), nada em Um Amor de Tesouro parece interessado em estimular a inteligência ou mesmo a curiosidade do público. Esta apatia, aliás, é fruto do desinteresse dos realizadores pelo próprio longa que estão criando, já que apenas isto pode explicar por que eles repetiriam, em certo momento, todas as informações já apresentadas nos intermináveis letreiros iniciais do filme – e a cena em questão, durante a qual Benjamin e Tess discorrem aborrecidamente sobre a história do tesouro, é um dos piores exemplos de exposição que vi nos últimos anos, já que, além de repetitiva e artificial, é também longa e confusa. Como se não bastasse, Tennant não faz o menor esforço para tornar a cena mais interessante ou para conferir-lhe mais ritmo, limitando-se a enquadrar os protagonistas de forma convencional, fazendo cortes ocasionais para mostrar a reação dos demais personagens – e nem mesmo uma idéia básica como levar alguém a andar pelo cenário durante a troca de diálogos (para que algo aconteça!) é utilizada.

 

Ah, mas a falta de talento do diretor vai além: oscilando entre a leveza de um filme censura livre e instantes de inexplicável e súbita violência, Tennant parece se esforçar para que o longa desagrade a todos os segmentos do público, demonstrando também um particular mau gosto no deselegante plano em que a socialite vivida por Alexis Dziena cai de pernas arreganhadas no convés do iate ao quase ser atingida por uma espada (e se Tennant estava tentando chamar a atenção de algum produtor de filmes pornôs baratos, não duvido de que tenha sido bem sucedido). Mas o mais inexplicável é por que intérpretes tão bem-sucedidos se sujeitariam a trabalhar com um cineasta que é obviamente um péssimo diretor de atores, já tendo conseguido arrancar performances fraquíssimas até mesmo de talentos como Reese Whiterspoon e Will Smith – e, assim, a química demonstrada por McConaughey e Hudson no bacana Como Perder um Homem em Dez Dias simplesmente desaparece em Um Amor de Tesouro, que transforma a dupla em um casal irritante que não inspira a menor a simpatia no espectador.

 

Enquanto McConaughey aproveita a natureza aventureira de seu personagem para tirar a camisa sempre que possível (e sua composição como ator neste projeto parece parar por aí), a falta de timing cômico aqui demonstrada por Hudson é fruto não só de suas má escolhas, mas também do terrível roteiro, das escolhas ineficazes de Tennant e da montagem nada inspirada da dupla Troy Takaki e Tracey Wadmore-Smith, que já havia exibido sua falta de talento para o gênero não apenas nos trabalhos anteriores de Tennant como também no lixo Minha Mãe Quer que Eu Case. Já o elenco secundário pouco mais faz do que dar vida a estereótipos, desde o casal gay que se limita a funcionar como suporte cômico ao estrangeiro excêntrico que nada mais é do que uma cópia grosseira de Borat (observem seus comentários sobre prostitutas durante o jantar). Por outro lado, o veterano – e sempre interessante – Donald Sutherland tenta conferir dignidade ao triste milionário que interpreta, mas isto se torna impossível à medida que ele é obrigado a gritar falas como “Gemma! Vá!”. Aliás, depois de observar a tristeza que Sutherland exibia no início da projeção, supus que isto fazia parte do arco dramático que ele concebera para o personagem, que provavelmente voltaria a exibir certa alegria de viver ao se envolver numa aventura – mas isto se provou incorreto, já que a melancolia do sujeito se manteve até o fim.

 

Só então percebi que aquele estado de espírito não era do personagem, mas do próprio ator, que, mesmo aceitando o papel em troca de um cheque polpudo, provavelmente não conseguiu se livrar do autodesprezo ao perceber a falta de ambições artísticas daqueles que o cercavam – e, acreditem, esta tristeza também me acompanhava ao sair da sala de projeção.

 

Com a importante diferença de não havia cheque algum em meu bolso.

 

Observação: Não vou comentar o estúpido e genérico título brasileiro que o filme recebeu, já que... bom, estes dois adjetivos também se aplicam ao projeto como um todo e, portanto, ele talvez seja mais do que apropriado.

 

20 de Março de 2008

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Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

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