Datas de Estreia: | Nota: | ||
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Brasil | Exterior | Crítico | Usuários |
24/12/2004 | 17/09/2004 | 4 / 5 | 4 / 5 |
Distribuidora | |||
Duração do filme | |||
93 minuto(s) |
Dirigido por Michael Winterbottom. Com: Tim Robbins, Samantha Morton, Jeanne Balibar, Togo Igawa, Essie Davis, Benedict Wong.
Código 46 é o filme que O Dogma do Amor queria ter sido. Ambos discutem a perda da individualidade e a solidão do Homem em um futuro frio e opressivo; porém, enquanto o longa de Thomas Vinterberg afundava em função de sua própria arrogância e do roteiro medíocre, o britânico Michael Winterbottom se sobressai ao abordar o material de forma simples e interessante.
Escrito por Frank Cottrell Boyce, parceiro habitual de Winterbottom, Código 46 nos apresenta a um mundo no qual as pessoas privilegiadas passaram a se concentrar em algumas poucas metrópoles, enquanto a maior parte da população vive em terríveis desertos. Para entrar e sair das cidades, é preciso ter um `passe` com duração estipulada – e é justamente para investigar a falsificação destes passes que William é enviado a Xangai. Capaz de ler o pensamento dos suspeitos (desde que estes lhe digam qualquer coisa pessoal), o sujeito logo encontra a culpada: a jovem Maria Gonzalez. Porém, em vez de entregá-la às autoridades, ele oculta sua descoberta por ter se apaixonado pela garota. Infelizmente, eles só têm 24 horas até que o passe de William vença e ele tenha que retornar para casa, onde sua esposa e seu filho o aguardam.
Mergulhado em um clima de constante melancolia, Código 46 divide com O Dogma do Amor um inconfundível tom noir que combina perfeitamente com o temperamento de seus protagonistas - e boa parte da trama, é claro, transcorre à noite, já que, para evitar as doenças provocadas pelo Sol, as pessoas passam a dormir durante o dia e trabalhar no período noturno (com exceção daquelas que moram fora das grandes cidades – o que, inclusive, é utilizado pelo filme como um curioso contraponto entre a frieza da civilização moderna e a irracionalidade dos excluídos).
Realizando um trabalho competente e econômico, o designer de produção Mark Tildesley emprega toques sutis para estabelecer a ambientação futurista do longa, utilizando principalmente transparências (como painéis de vidros) e metais – o que contribui para dar um ar impessoal, distante, àquele mundo. Da mesma forma, os diretores de fotografia (são dois, o que é raro) Alwin H. Kuchler e Marcel Zyskind criam belíssimas imagens noturnas, utilizando luzes e sombras com talento.
Enquanto isso, Michael Winterbottom comprova sua versatilidade ao dirigir, em seqüência, três projetos completamente diferentes entre si: o retrô A Festa Nunca Termina, o realista Neste Mundo e este Código 46, que narra sua história num ritmo calmo e pausado, empregando interessantes metáforas visuais para evidenciar a falta de propósito de uma vida eternamente sob controle (logo no início, vemos William andando em círculos em duas ocasiões distintas: em uma imensa rodovia e no hotel em que se hospeda). E mais: o cineasta desenvolve com segurança o tema proposto pelo inteligente roteiro de Boyce, ilustrando a eterna dualidade Razão-Emoção através da própria reação fisiológica que Maria experimenta ao transar com o amado: embora queira ficar com William, seu corpo o rejeita (por motivos que prefiro não revelar), obrigando-a a amarrar-se na cabeceira da cama a fim de suportar a presença de alguém a quem ama (sim, o paradoxo é fascinante). Finalmente, é interessante observar que Código 46 divide um traço curioso com 1984: em ambos, vemos indivíduos que usam o amor como forma de protesto contra um Sistema cruel e repressor.
Sempre competente, Tim Robbins é hábil ao retratar a atração e a curiosidade que seu personagem sente por Maria e a forma gradual com que ele se permite abandonar as convenções e seguir seus instintos. Da mesma maneira, Samantha Morton (com um visual parecido ao que utilizou em Minority Report) dá vida à garota, cuja espontaneidade se destaca em um mundo tão controlado – mas, ao mesmo tempo, é fácil perceber uma melancolia inconfundível em seu olhar, fruto da repressão emocional que experimentou ao longo de toda sua existência.
Mas o elemento mais fascinante de Código 46 é a língua globalizada com que os personagens daquele universo se comunicam: ao inglês, misturam-se palavras em espanhol, francês, chinês e árabe, como se cada dialeto fosse ideal para expressar um certo tipo de idéia ou emoção.
De todo modo, há um som universal, que dispensa traduções, para ilustrar a competência deste filme: o de aplausos.
22 de Julho de 2004
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