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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
21/01/2005 10/12/2004 5 / 5 5 / 5
Distribuidora
Duração do filme
104 minuto(s)

Direção

Mike Nichols

Elenco

Jude Law , Julia Roberts , Natalie Portman , Clive Owen

Produção

Mike Nichols

Fotografia

Stephen Goldblatt

Montagem

Antonia Van Drimmelen , John Bloom

Design de Produção

Tim Hatley

Figurino

Ann Roth

Direção de Arte

Hannah Moseley

Closer - Perto Demais
Closer

Dirigido por Mike Nichols. Com: Jude Law, Julia Roberts, Natalie Portman, Clive Owen.

Em certo momento de Perto Demais, trabalho mais recente do veterano cineasta Mike Nichols, um dos personagens revela para a esposa que irá abandoná-la a fim de viver com a amante. Quando a garota, destruída pela notícia, exige uma explicação para a atitude do marido, este responde com uma honestidade brutal:

- Sou egoísta. Acho que serei mais feliz com ela.

Abandonemos, por enquanto, a curiosa questão de como alguém pode mensurar a felicidade proporcionada por pessoas diferentes e nos concentremos na frieza estúpida com que o sujeito comunica sua decisão à companheira: esta sinceridade `excessiva` (sim, isto existe) é uma característica compartilhada pelos quatro protagonistas do filme, que não parecem perceber que, muitas vezes, a verdade não é exatamente o que alguém pode querer ouvir em determinados instantes. Infelizmente, outro traço dividido pelos personagens é a habilidade em utilizar as palavras como verdadeiros ferrões contra aqueles a quem querem magoar – e, neste contexto, dizer a verdade pode ser uma arma muito mais eficaz do que inventar uma mentira maldosa, além de permitir que o agressor sinta-se bem consigo mesmo por ter sido honesto com a outra pessoa.

Aliás, é isto que une e separa Perto Demais de Quem Tem Medo de Virginia Woolf?, que marcou a estréia de Nichols na direção há nada menos do que 38 anos. Naquele filme, que ainda hoje representa uma experiência emocionalmente dolorosa para o espectador, o casal interpretado por Richard Burton e Elizabeth Taylor mergulhava em intensos duelos verbais que tinham, como único objetivo, ferir ao máximo o `oponente` – e como se conheciam muito bem, George e Martha sabiam exatamente como alcançar o efeito mais destruidor com suas palavras. Presenciar uma conversa entre os dois era testemunhar um espetáculo deprimente e revelador sobre a natureza humana – e esta é justamente a semelhança que aquele clássico divide com Perto Demais. Por outro lado, aqui os personagens parecem acreditar que o mero fato de estarem sendo sinceros funciona como um paliativo para a dor provocada pelo que está sendo dito – algo com que George e Martha jamais se preocupariam, já que o sofrimento um do outro era o que objetivavam.

Incluindo diversos saltos na narrativa, o roteiro de Patrick Marber (inspirado em sua própria peça teatral) busca retratar diferentes momentos dos relacionamentos estabelecidos entre o quarteto principal: o escritor Dan (Law), a fotógrafa Anna (Roberts), o médico Larry (Owen) e a stripper Alice (Portman). Inicialmente envolvido com Alice, Dan logo se apaixona por Anna, que, por sua vez, parece simultaneamente atraída por ele e por Larry – que certamente não hesitaria em dormir com Alice. À medida que o tempo passa, uma dinâmica clara se estabelece: enquanto Dan e Larry parecem mergulhar em um jogo particular para: a) conquistar Anna; e b) magoar o `adversário`, a fotógrafa entrega-se à culpa e à indecisão, evidenciando sua fraca personalidade. Já Alice, a mais jovem do grupo, torna-se uma espécie de vítima inocente das disputas entre os dois homens – um papel que, vale dizer, pode não corresponder à realidade.

Concentrando-se principalmente nos diálogos (o que denuncia sua origem teatral), Perto Demais demonstra compreender bem a natureza humana e a realidade paradoxal de que, muitas vezes, nosso pior lado pode ser despertado em um relacionamento amoroso. Quando descobrem que foram traídos, por exemplo, Dan e Larry se entregam à mais óbvia (e infrutífera) das auto-torturas, exigindo saber detalhes sobre os momentos íntimos entre os amantes. `Ele transa melhor do que eu?` é o tipo de pergunta cuja resposta jamais trará conforto: se for `sim`, o efeito é óbvio; se for `não`, outras questões dolorosas surgem em seu lugar – se não é o sexo, então o que o outro pode ter de melhor, justificando a traição? Assim, é apenas natural que Perto Demais não inclua cenas de sexo em seus 104 minutos de projeção: o que importa aqui não é o ato em si, mas tudo o que este provoca: por aqueles momentos de prazer físico, os personagens se submetem a anos de sofrimento e complexos tumultos emocionais.

Sempre analisando a si mesmos, os protagonistas têm plena consciência de suas próprias fragilidades e contradições: apesar de romper com Alice, por exemplo, Dan sabe que sentirá ciúmes caso a veja com outro homem. É triste reconhecer tal falha de caráter, mas (assim como muitos homens em situações semelhantes) o que ele queria é que Alice sofresse eternamente por perdê-lo, tornando-se incapaz de superá-lo e de se envolver com outra pessoa. Da mesma forma, em certo momento Larry comenta que, por estarem em início de namoro, seus piores hábitos ainda divertem Anna – o que não o impede de reconhecer que estes mesmo `defeitos` inevitavelmente provocarão conflitos no futuro, quando já não forem mais novidades engraçadinhas. Por outro lado, se Anna demonstra uma curiosa ingenuidade ao se deixar manipular por Dan e Larry, é a jovem Alice quem revela uma inesperada maturidade durante uma fascinante conversa que mantém com este último em uma boate de strip-tease: permitindo que Larry permaneça no ataque por boa parte da discussão, a jovem o fragiliza justamente por levá-lo a se expor tanto – e quando o médico desmorona sob o peso de suas próprias palavras, o olhar da garota evidencia algo que ele falhara em perceber: ela estivera no comando todo o tempo, e sua nudez física fora uma simples armadilha para levá-lo a pensar que ela estava vulnerável, quando, na realidade, era ele quem se desnudava emocional e psicologicamente.

Explorando ao máximo o talento de seu elenco, Mike Nichols evita qualquer tipo de distrações técnicas, mantendo sua câmera (e a montagem) concentrada no rosto e nas palavras dos atores, buscando expressões faciais e detalhes de interpretação, como gestos e movimentos em cena. E a decisão se mostra acertada: Julia Roberts, por exemplo, volta a ser atriz depois de passar quatro anos bancando a estrela de cinema (sua última atuação digna de ser classificada como tal foi em Erin Brockovich), buscando expor a dualidade de Anna, que, embora frágil e insegura, acredita ser uma mulher forte e capaz de `enfrentar` Dan e Larry de igual para igual. Da mesma forma, Jude Law evita que enxerguemos seu personagem como um simples estereótipo do `mulherengo` (como no recente Alfie), retratando o escritor como um sujeito bom, mas falho, já que julga – erroneamente - que reconhecer o próprio egoísmo é o bastante para desculpá-lo por ser assim.

Porém, as duas grandes performances de Perto Demais são aquelas oferecidas por Clive Owen e Natalie Portman. Recuperando-se das pavorosas participações em Amor sem Fronteiras e Rei Arthur, Owen transforma Larry em um homem que, quando ferido, descobre um verdadeiro talento para manipular as pessoas, tornando-se, provavelmente, o mais impiedoso entre os quatro protagonistas – o tipo de indivíduo capaz de transar com uma mulher não para buscar o prazer, mas para ferir outro homem. Já Portman, que atravessa o filme como a figura mais enigmática do elenco, não apenas surge belíssima (e extremamente sedutora) como a stripper Alice, como ainda demonstra imensa segurança ao compor uma figura forte que nos surpreende até o último segundo de projeção (literalmente).

Assim sendo, é mais do que adequado que o livro escrito pelo personagem de Jude Law se chame O Aquário, já que o próprio filme funciona como um meio que nos permite observar a interação de quatro pessoas complexas e interessantes – e, ainda que cheguemos ao fim do longa com a sensação de que nenhuma delas é especialmente agradável, é inegável que, pelo menos, passamos a conhecê-las a fundo, e que, indiretamente, isto nos leva a conhecer um pouco mais sobre nós mesmos.
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20 de Janeiro de 2005

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Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

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