Datas de Estreia: | Nota: | ||
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Brasil | Exterior | Crítico | Usuários |
19/06/1998 | 27/08/1997 | 3 / 5 | / 5 |
Distribuidora | |||
Duração do filme | |||
100 minuto(s) |
Dirigido por Nick Cassavetes. Com: Robin Wright Penn, Sean Penn, John Travolta, James Gandolfini, Harry Dean Stanton, Chloe Webb e Gena Rowlands.
Passei um bom tempo pensando sobre este filme, antes de aventurar-me a escrever esta crítica. O motivo principal desta hesitação é bem simples, na verdade: eu não sabia se havia gostado ou não de Loucos de Amor. Pois bem, depois de algumas reflexões, sinto-me apto a escrever sobre o filme - mas não a dizer se gostei ou não do que vi.
O roteiro, escrito pelo falecido John Cassavetes (pai do diretor Nick) há cerca de 20 anos atrás, conta a história de Eddie e Maureen (Sean Penn e Robin Wright Penn), um casal que leva uma vida um tanto atípica: ambos alcoólatras, Eddie e Maureen são extremamente apaixonados um pelo outro, o que não os torna mais `funcionais`. Na verdade, quando o filme tem início, Eddie está desaparecido há três dias, deixando Maureen bastante transtornada - apesar de não ser a primeira vez que ele faz isso. Chateada, ela procura o marido por um bom tempo até que, bêbada, acaba sendo estuprada e espancada por um vizinho (Gandolfini). Quando Eddie reaparece, ela tenta esconder a origem de seus hematomas do homem, temendo que ele mate o tal vizinho. Maureen sabe que Eddie é desequilibrado. Depois de algum tempo, porém, ele exige que ela conte o que aconteceu e, irritado, sai de casa com um revólver, pronto para o que der e vier. Temendo o que acontecerá, Maureen liga para um sanatório, onde seu marido acaba sendo preso.
Dez anos se passam: Maureen se divorciou de Eddie e casou-se com o estável Joey (Travolta), com quem tem três filhas, sendo a mais velha fruto de seu casamento com Eddie. É quando este é liberado do hospício, disposto a reatar com sua esposa - que, por sua vez, ainda ama o ex-marido, para desespero de Joey.
Loucos de Amor não é um filme fácil de se entender e isso é facilmente explicável: os dois personagens principais (Eddie e Maureen) não são pessoas normais. Eles pensam de modo diferente e agem de acordo, sendo Eddie o mais alucinado dos dois. Sua confusão mental é tão grande, em alguns momentos, que ele dispara uma série de frases desconexas que ilustram claramente sua perturbação: `O mundo é controlado por um computador e por 7 mulheres. Uma loira, uma morena, uma ruiva, uma de cabelo verde e uma careca. São sete?`, diz ele, em um destes momentos. Eddie não é, definitivamente, uma pessoa normal.
Maureen não fica muito atrás. Apaixonada pelo marido, ela parece não perceber a loucura deste. Ou, ao contrário, talvez seja justamente por isso que ela o ama, apesar de temer, às vezes, que Eddie ultrapasse determinados limites. Suas contradições são reveladoras, aliás: o fato dela pedir ajuda para evitar que o marido mate o vizinho demonstra uma certa `sensatez` de sua parte, um zelo insuspeito. No entanto, depois de prometer a Eddie que em três meses estariam juntos novamente, assim que ele tivesse alta, Maureen o abandona por dez anos. Por que ela faz isso? Esta é apenas uma das várias perguntas para as quais dificilmente encontraremos uma resposta satisfatória. Incoerências de uma pessoa instável, talvez. Ou comodismo. Covardia, por que não? Na verdade, não há como termos certeza.
A `estranheza` que senti com relação a este filme surgiu na segunda metade da projeção, quando John Travolta entra na história. Enquanto a primeira parte do filme estabelecera de maneira extremamente hábil o caráter da relação entre Eddie e Maureen, o segundo `ato` deste filme nos introduz em uma nova realidade, da qual não sabemos o que esperar. Por que Maureen se casou com Joey? Ela o ama? Ela ama Eddie? Joey sabe de tudo o que aconteceu?
Logo descobri o motivo da `estranheza` desta segunda parte do filme. Na verdade, o que acontece a esta altura da narrativa é que uma pessoa mentalmente sadia se interpõe entre o perturbado casal ao qual fomos apresentados durante a primeira hora de filme. Assim, a situação torna-se insólita, em alguns momentos até mesmo engraçada. Existem algumas risadas ao longo de Loucos de Amor, originadas da estranha situação na qual o personagem de John Travolta se vê envolvido. Como parte do processo, ele também passa a agir de forma nada convencional, como no momento em que dá uma cerveja para sua filha mais velha e diz: `Cale a boca e tome sua cerveja.` Isso é explicável, naturalmente, por sua confusão diante do fato de que sua vida está virando de ponta-cabeça. Em outro instante, por exemplo, ele conta para Eddie: `Eu e Maureen paramos de fumar juntos!`. Detalhe: ele está segurando um cigarro enquanto diz isso.
A atuação de Sean Penn é simplesmente uma obra-prima. Sinto cada vez maior admiração pelo talento deste ator, que prova, sempre, ser um dos melhores - se não o melhor - de sua geração. Seus desempenhos em Pecados de Guerra, O Pagamento Final e Os Últimos Passos de um Homem provam isso. Aqui, mais uma vez, ele é hábil ao interpretar um personagem inconstante. É fantástico observar como Eddie vai mudando, aos poucos, de um fanfarrão inofensivo a um desequilibrado perigoso (na primeira metade do filme), chegando ao louco divertido da metade final da narrativa.
Já Robin Wright Penn tem sua boa atuação prejudicada pela caracterização exagerada na primeira metade do filme. Seu jeito de conversar e de andar são forçados, tirando o impacto que suas cenas mais intensas provocam. É uma pena: se tivesse se comedido mais, sua performance teria lucrado, e muito. John Travolta também se sai bem, retratando com habilidade a perplexidade de seu personagem diante da inconstância da esposa.
A fotografia de Thierry Arbogast é peça fundamental para este filme, bem como a direção de arte. Na primeira metade da história, o clima é angustiante, pesado. As cenas geralmente situam-se à noite e sob forte chuva. O apartamento de Eddie e Maureen é triste, apertado. Nenhum diálogo é necessário para nos mostrar que é difícil ser feliz ali. Já na segunda metade da história os planos se tornam mais abertos e a imagem `respira`. Até mesmo o triste quarto de Eddie, no Hotel Ford, é iluminado, num indicativo do novo estado de espírito do sujeito. Um trabalho hábil, sem dúvida.
Infelizmente, nem sempre podemos reagir com naturalidade ao insólito da situação. Há uma determinada cena, no final do filme, que poderia ter sido muito divertida, caso eu não estivesse tão preocupado em constatar que as três filhas de Joey estavam assistindo a ela. Este talvez tenha sido o maior pecado da direção de Nick Cassavetes - permitir que o espectador se lembrasse, a todo momento, que na `vida real` aquela história seria muito deprimente. Se nos esquecêssemos disso, talvez Loucos de Amor tivesse sido mais eficaz - e talvez eu descobrisse o que achei do filme.
28 de Julho de 1998