Datas de Estreia: | Nota: | ||
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Brasil | Exterior | Crítico | Usuários |
21/02/2003 | 25/12/2002 | 4 / 5 | 4 / 5 |
Distribuidora | |||
Duração do filme | |||
141 minuto(s) |
Dirigido por Steven Spielberg. Com: Leonardo DiCaprio, Tom Hanks, Christopher Walken, Martin Sheen, Nathalie Baye, Amy Adams, James Brolin e Jennifer Garner.
Em 1993, Steven Spielberg provou sua impressionante versatilidade ao comandar duas superproduções bem-sucedidas em suas respectivas ambições, mas incrivelmente distintas uma da outra: Jurassic Park, uma aventura protagonizada por monstros pré-históricos, e A Lista de Schindler, um poderoso drama sobre o Holocausto. Pois, para quem achava que o cineasta já não possuía mais o fôlego de antigamente, 2002 demonstrou o contrário, já que, mais uma vez, Spielberg lançou dois ótimos filmes em menos de um ano: a inteligente ficção científica Minority Report e este divertido Prenda-me Se For Capaz.
Roteirizada por Jeff Nathason a partir do livro autobiográfico de Frank William Abagnale Jr., a história gira em torno da juventude deste último, que, entre os 16 e os 21 anos, tornou-se um dos criminosos mais procurados dos Estados Unidos ao distribuir mais de 2,5 milhões de dólares em cheques fraudulentos – além, é claro, de assumir diversas identidades falsas, personificando advogados, médicos e até mesmo um piloto de avião. Perseguido pelo agente do FBI Carl Hanratty, Frank aplica golpes em diversos países durante sua fuga, dando origem a uma jogo internacional de gato-e-rato.
Interpretado com charme e energia por Leonardo DiCaprio, Frank Abagnale Jr. tem, como grande arma, sua aparência jovial e inocente – e ele sabe que uma mentira dita com firmeza assume caráter de verdade indiscutível. Com isso, o rapaz demonstra sua inteligência e criatividade em várias situações inicialmente adversas, como na cena em que, ao chegar em sua nova escola, resolve se passar pelo novo professor de francês para se vingar de um brutamontes que acabara de humilhá-lo - e este é apenas o início de uma longa jornada, já que, com o passar do tempo, Frank torna-se cada vez melhor em suas audaciosas farsas.
Porém, apesar de infringir a lei a todo momento, o personagem jamais deixa de contar com a simpatia do espectador, já que DiCaprio (um dos melhores atores de sua geração, e que acabou sendo injustamente antipatizado pelo público em função do sucesso de Titanic) é bem-sucedido ao retratar o bom coração de Frank, que se preocupa até mesmo com uma garota insegura que cruza seu caminho. No fundo, Frank é apenas um garoto que quer reunir os pais divorciados e que reverencia, acima de tudo, a figura paterna: basta observar a admiração com que o rapaz testemunha os pequenos golpes de seu pai, vivido por Christopher Walken, e ri com entusiasmo dos casos que este conta. Por outro lado, o personagem de Walken comove ao insistir em realizar seus sonhos através das conquistas (mesmo que ilícitas) do filho – algo que fica claro em uma belíssima cena que acontece em um restaurante de luxo.
Enquanto isso, Tom Hanks assume um papel que, apesar de secundário, lhe oferece a oportunidade de brilhar mais uma vez: seu agente do FBI, Carl Hanratty, é um tipo dedicado e carrancudo que sonha apenas em conseguir se tornar chefe de sua seção. Determinado a prender Frank, Hanratty mal pode acreditar que seu adversário ainda é um adolescente, o que confere a Hanks a possibilidade de voltar a fazer humor depois de uma longa pausa (a graça vem, justamente, do mau humor de seu personagem: observe, por exemplo, o instante em que ele entrega um garfo para um de seus subordinados e perceba a sutileza com que o ator extrai o riso de um simples movimento). A escalação de Hanks para o papel é, diga-se de passagem, uma jogada de mestre por parte de Spielberg, já que, desta maneira, ele imediatamente transformou o agente do FBI em uma figura que também desperta a simpatia do público, que se divide entre o desejo de ver DiCaprio escapar e o de ver Hanks obter sucesso em sua perseguição.
E mais: sempre obcecado com a relação entre pais e filhos (tema presente em praticamente todos os seus filmes), Spielberg cria, em Prenda-me Se For Capaz, um verdadeiro triângulo `paterno` (na falta de um termo melhor) entre Hanks, DiCaprio e Walken: apesar de amar o pai profundamente, Frank Jr. sente falta de alguém que o contenha, que o discipline – e acaba encontrando esta figura de autoridade em Hanratty (não é à toa que, em certo momento, ele pede, como uma criança, que o agente `não o castigue`). Já o personagem de Hanks não consegue esconder sua admiração pela inteligência de Frank, que é capaz de colocar em prática planos incrivelmente audaciosos (como ao se esconder atrás de um verdadeiro `escudo de visibilidade` – veja o filme e entenderá o que digo).
Assim, graças às intrincadas interações entre seus personagens, Prenda-me Se For Capaz torna-se não apenas um filme divertido sobre uma curiosa perseguição, mas também um belo estudo de personagens – algo que deve ser atribuído à maturidade de Spielberg como diretor, que, ao contrário do que fez em Minority Report, mostra-se incrivelmente recatado em suas movimentações de câmera e enquadramentos, percebendo que, desta vez, a discrição seria a melhor forma de contar a história (aliás, até mesmo a trilha sonora de John Williams está mais contida do que de costume, lembrando, em certos momentos, o trabalho de Henry Mancini – o que talvez tenha dado a Agnès Deygas a idéia de se inspirar na abertura de A Pantera Cor-de-Rosa para criar os créditos iniciais. Ou vice-versa: quem sabe não foi Deygas quem deu a John Williams o tom de sua composição?).
Com o perdão do infame trocadilho, o fato é que Prenda-me Se For Capaz não precisa se esforçar muito para prender a atenção do espectador. Steven Spielberg teve mais um ótimo ano. E nós agradecemos por isso.
22 de Fevereiro de 2003