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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
29/10/2015 06/08/2015 1 / 5 4 / 5
Distribuidora
Fox
Duração do filme
120 minuto(s)

Os 33
The 33

Dirigido por Patricia Riggen. Roteiro de Mikko Alanne, Craig Borten, Michael Thomas. Com: Antonio Banderas, Rodrigo Santoro, Juliette Binoche, Lou Diamond Phillips, Naomi Scott, Cote de Pablo, Juan Pablo Raba, Mario Casas, Jacob Vargas, Oscar Nuñez, Adriana Barraza, James Brolin, Bob Gunton e Gabriel Byrne.

Uma das questões que poderiam facilmente ser responsabilizadas pela falta de tensão despertada por Os 33 é o fato de que todos sabemos como a história terminará, já que o incidente retratado pelo filme ocorreu há poucos anos e chamou a atenção de todo o planeta. Este, no entanto, seria um diagnóstico incorreto, pois o projeto tem tantos problemas que nem mesmo 500 anos de distância dos eventos reais poderiam salvá-lo.


Caso você tenha permanecido soterrado em uma mina durante os últimos cinco anos e não saiba o que houve (ha-ha): em agosto de 2010, 33 mineiros chilenos se encontravam no início de seu turno quando um desabamento colossal fechou todas as saídas do local. Se por um lado ninguém se feriu (uma sorte imensa), por outro a possibilidade de resgate se revelava mínima, já que eles se encontravam a 700 metros de profundidade, sem comunicação com o mundo exterior e com uma quantidade de água e comida insuficiente para mantê-los vivos por muito tempo. Porém, graças à pressão dos parentes dos mineiros e da própria natureza dramática da história, a divulgação da notícia resultou em esforços descomunais para salvar as vidas daquelas pessoas já semanas depois do desastre.

Aliás, “desastre” é a palavra-chave aqui, já que, em busca de uma estrutura mais familiar para contar a história, o trio de roteiristas composto por Mikko Alanne, Craig Borten e Michael Thomas se inspira claramente nas convenções dos filmes-desastre ao construir a narrativa. Para isso, introduzem de forma rápida, burocrática e artificial alguns problemas particulares envolvendo os personagens que se tornarão mais importantes, comentando sobre a futura paternidade de um, a briga de outro com a irmã, a bigamia de um terceiro, as dívidas de um quarto e assim por diante. Estabelecidos estes elementos que visam criar uma ligação emocional entre o espectador e alguns dos mineiros, o longa imediatamente encena o desabamento e se dedica ao que realmente interessa: a operação de resgate e os esforços de sobrevivência daqueles indivíduos.

E aqui começam os tropeços do projeto: em vez de apostar na humanidade de seus personagens e de sua persistência diante da morte quase certa, Os 33 parece se perder entre a vontade de criar tensão, o esforço para despertar lágrimas e o impulso de incluir alívios cômicos pontuais para contrabalançar os dois primeiros elementos. Assim, no lugar de qualquer complexidade na concepção dos mineiros e na dinâmica entre estes, a diretora Patricia Riggen opta pela saída fácil (e falha) de trazer planos-detalhe de mãos que se apertam em gestos de amizade e em movimentos de câmera na direção dos rostos dos atores que buscam ressaltar as falas de efeito enquanto a trilha sonora (uma das últimas de James Horner) praticamente grita “vejam que emocionante é este momento!”. Neste sentido, a cena que gira em torno de um banquete resume perfeitamente a confusão da cineasta e de seu filme: supostamente criada para celebrar a solidariedade entre os soterrados e o desejo de voltarem a encontrar suas famílias, a passagem inclui as visões de cada um (que envolvem as mulheres de suas vidas servindo-lhes comida – e nem vou falar nada sobre isso) e jamais define qual reação está tentando provocar. Riso? Lágrimas? Algum tipo de catarse? Se poderia funcionar de várias maneiras diferentes, a cena falha em todas, sendo apenas embaraçosa e estúpida.

Neste aspecto, é surpreendente como ninguém envolvido na produção parece ter se dado conta do erro representado por aquele banquete – mas se considerarmos que ninguém deu o alerta quanto à fala “Foi o coração da montanha que se partiu”, uma das coisas mais constrangedoras que o Cinema produziu em 2015, é fácil constatar que discernimento não era um dos pontos fortes da equipe do projeto.

Não que os bons atores não se esforcem para trazer alguma densidade ao filme, pois se esforçam. Composto por intérpretes espanhóis, franceses, norte-americanos, mexicanos, filipinos, chilenos, colombianos, irlandeses, cubanos e brasileiros (todos falando inglês com sotaques variados), o elenco foi claramente escalado para criar algum apelo comercial internacional – o que é perdoável, já que Cinema é uma arte cara e que exige retorno financeiro. Menos aceitável, por outro lado, é perceber como o presidente do Chile é vivido por um norte-americano (Bob Gunton) e como o único ator conhecido entre os chefes de equipe que viajam para o país a fim de ajudar também saiu de Hollywood (James Brolin), numa sugestão pouco sutil da “superioridade” dos Estados Unidos (algo que – de novo – pode ter conotações políticas ou puramente comerciais, já que o mercado norte-americano é fundamental para o sucesso de uma produção do tipo). Com isso, somos obrigados a ver Juliette Binoche na escalação mais absurda de sua carreira, embora, em contrapartida, Rodrigo Santoro ganhe a oportunidade de se destacar ao viver o único personagem que parece ter algum grau de complexidade e sentimento reais.

Sem se importar com qualquer sutileza também ao retratar os donos das minas e seus gerentes como vilões, Os 33 não só traz uma cena na qual um supervisor estabelece o aumento da cota diária para níveis impossíveis como ainda enfoca outro decidindo abafar o desabamento segundos depois do acidente, faltando apenas torcer o bigode e gargalhar maldosamente ao fazê-lo. De forma similar, é hilário perceber como o gráfico usado para ilustrar a profundidade da mina traz convenientemente dois Empire States como forma de explicar a questão para o público dos EUA em mais uma concessão comercial que compromete a verossimilhança da narrativa, ao passo em que o draminha criado entre os irmãos Dario (Raba) e María (Binoche) é digno de uma telenovela mexicana, incluindo momentos como o do sujeito escondido ao lado de uma tela na qual a imagem da irmã é projetada e, claro, o abraço final incluído apenas para trazer alguma estrutura emocional ao longa.

Ainda assim, Os 33 tem um ou outro instante memorável: o plano no qual vemos a ponta da furadeira chegando ao abrigo, trazendo luz e alegria aos mineiros, é belíssimo – e, claro, Antonio Banderas é geralmente um ator carismático o bastante para despertar nossa simpatia.

Mas quando constatamos que o filme não consegue sequer criar uma atmosfera de claustrofobia mesmo se passando no interior de uma mina, tentar defendê-lo se torna um esforço tolo como o roteiro no qual se baseia.

07 de Novembro de 2015

Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

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