Datas de Estreia: | Nota: | ||
---|---|---|---|
Brasil | Exterior | Crítico | Usuários |
01/01/1970 | 28/09/2017 | 1 / 5 | / 5 |
Distribuidora | |||
Duração do filme | |||
74 minuto(s) |
Dirigido por Vanessa Redgrave. Com Ralph Fiennes e Emma Thompson.
Sea Sorrow é um filme de boas intenções e péssima execução. Marcando a estreia na direção da octogenária atriz Vanessa Redgrave, o documentário tem o nobre propósito de discutir a atual e trágica crise dos refugiados, que, tentando escapar de zonas de guerra que basicamente se converteram em abatedouros, chegam aos milhões em países europeus, sendo frequentemente recebidos com um ódio inspirado pela xenofobia e pela pura falta de humanidade. Politicamente ativa durante quase toda sua vida, Redgrave obviamente sente a dor dos imigrantes e experimenta uma mais do que compreensível revolta diante da retórica nacionalista fascistoide de parte dos políticos do continente, mas estes sentimentos são atirados no longa de maneira desajeitada e desorganizada, levando-o a soar menos como uma produção profissional e mais como um trabalho de escola mal feito.
E isto é uma pena, já que seus primeiros minutos se revelam bastante promissores ao trazerem alguns jovens muçulmanos sendo amparados por uma organização católica e alimentados por uma freira idosa. Lamentavelmente, não demora muito até que os problemas da narrativa comecem a sabotar seus objetivos – e logo, por exemplo, Redgrave e seu montador intercalam os depoimentos com o mesmo plano externo que exibe um bosque sob a chuva, traindo a falta de um senso de ritmo que evite que a obra se torne entediante.
Porém, o maior pecado de Sea Sorrow não é o de ser aborrecido, mas de ser óbvio: ao longo de seus 74 minutos de duração, o filme pouco faz para levar quem não reconhece o horror da situação dos refugiados a fazê-lo, limitando-se a pregar para os convertidos, o que é um tremendo desperdício de oportunidade, já que a frieza e o distanciamento dos noticiários pouco fazem para humanizar de fato aqueles homens, mulheres e crianças, tratando-os como números ou apenas como um fenômeno político-social. Sim, em um ou dois momentos (e só) a produção oferece imagens chocantes de vídeos amadores, mas até mesmo estes perdem – em duração e destaque – para a velha versão dos telejornais ao exibir uma matéria da TV francesa na íntegra.
No restante do tempo, porém, o documentário se limita a uma série de discursos feitos por um político próximo à diretora e também outros recitados por esta – que, para piorar, inclui no filme sua sobrinha Jemma Richardson, sua filha Joely Richardson e sua neta Daisy Bevan, conferindo uma aura (provavelmente injusta) de vaidade a um projeto que não deveria tê-la (e o momento no qual expõe um “cartaz” feito pela neta mais nova pode até ser doce como testemunho de seu amor e orgulho de avó, mas é constrangedor como elemento de um documentário que pretende debater algo tão sério).
Igualmente malsucedida é a ideia – até boa em teoria – de comparar a atual crise de refugiados àquela protagonizada por judeus durante a Segunda Guerra: se por um lado é uma forma de tentar criar uma identificação entre o público distante dos conflitos na Síria e na Líbia com as vítimas destes, por outro é desenvolvida de maneira preguiçosa, levando-a a fracassar. Enquanto isso, o contraste que o filme tenta estabelecer entre o discurso de Eleanor Roosevelt ao defender a Declaração Universal dos Direitos Humanos e a terrível realidade que torna aquela iniciativa um sonho distante é outro conceito no qual Redgrave investe repetidamente, mas com pobres resultados.
Para piorar, a produção ainda traz figuras como Ralph Fiennes e Emma Thompson recitando passagens de A Tempestade ou lendo jornais da época da Segunda Guerra – e, nestes casos, é difícil defender estas intervenções mesmo como sendo ideias mal executadas, já que a relevância destas é clara apenas para a diretora. Ainda assim, nada é mais embaraçoso do que o chroma key utilizado na maior parte da projeção para exibir imagens atrás da diretora/entrevistada, já que o resultado poderia ter saído da ilha de um videomaker amador da década de 80.
Pecando também por incluir apenas duas ou três entrevistas com refugiados (ou seja: com as pessoas em torno das quais o filme gira), Sea Sorrow pode até ter o coração no lugar certo, mas o resto, infelizmente, está todo errado.
Texto originalmente publicado como parte da cobertura do Festival de Cannes 2017.
18 de Maio de 2017