Datas de Estreia: | Nota: | ||
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Brasil | Exterior | Crítico | Usuários |
21/01/2021 | 19/12/2019 | 4 / 5 | 3 / 5 |
Distribuidora | |||
Duração do filme | |||
125 minuto(s) |
Dirigido por Matteo Garrone. Roteiro de Matteo Garrone e Massimo Ceccherini. Com: Federico Ielapi, Roberto Benigni, Rocco Papaleo, Massimo Ceccherini, Marine Vacth, Gigi Proietti, Maria Pia Timo.
O Pinóquio do diretor italiano Mateo Garrone não é uma releitura, modernização ou subversão da fábula original de Carlo Collodi, mas uma adaptação fiel que reconhece a imensa imaginação da jornada do boneco de madeira e a conta com energia, humor (com toques de horror) e um senso estético memorável. E se ao final da projeção não vimos nenhum detalhe que já não conhecêssemos, a verdade é que há um motivo para que as crianças gostem tanto de ouvir as mesmas aventuras repetidas vezes, já que um bom contador de histórias sempre incute ar de novidade ao que já era clássico.
Sem perder tempo com prólogos desnecessários, posto que dificilmente haverá um espectador que não faça ideia do que irá ver na duas horas seguintes, o roteiro escrito por Garrone e Massimo Ceccherini rapidamente nos apresenta a Gepetto (Benigni), um carpinteiro pobre e faminto que, inspirado por um teatro de bonecos itinerantes, decide fabricar sua própria marionete, usando (sem saber) um tronco de madeira encantado que parece ter vida própria. O interessante é que ninguém na pequena vila manifesta grande espanto quando Gepetto apresenta Pinóquio ao mundo, o que, compreenderemos depois, se deve ao fato de que todo aquele universo é povoado por criaturas fantásticas, algo que o filme só revela aos poucos e sem alarde. Esta, aliás, é uma decisão inteligente de Garrone, que, com isso, facilita a entrada do espectador em seu mundo para só então escancarar sua proposta.
Este nosso mergulho na narrativa, claro, também é facilitado bastante pelo excepcional trabalho de maquiagem de Mark Coulier, que se equilibra bem entre toques sutis que apenas sugerem um elemento fantástico (como as orelhas pontudas e os bigodes do Gato e da Raposa) e próteses que modificam por completo os rostos e corpos dos atores (como os médicos-corujas e a... hum... mulher-lesma?) – além, é obvio, da concepção do protagonista, cujo físico de madeira não elimina a expressividade do jovem ator Federico Ielapi (e os efeitos sonoros, que adicionam um ranger a cada movimento, ajudam a vender a ideia). Enquanto isso, o design de produção se esmera na concepção de cada ambiente, imprimindo personalidade à casa da Fadinha, à vila de Gepetto e até ao interior da baleia que engole os personagens, atingindo seu auge na cidade que promete uma vida de diversões às crianças e traz um imenso parque de madeira em seu pátio central. Para completar, os figurinos de Massimo Cantini Parrini combinam bem os elementos que dão ao mesmo tempo a impressão de um passado distante, mas palpável, e uma realidade puramente fantasiosa.
Segunda visita de Garrone às fábulas (ele também dirigiu o bom O Conto dos Contos), Pinóquio reflete a sensibilidade de seu realizador, que evidentemente pinta a história com tons sombrios, incluindo a forte imagem do personagem-título pendurado pelo pescoço em uma árvore depois que dois vilões tentam matá-lo. De modo similar, a cena no semidestruído Palácio da Justiça, com seu juiz-macaco que insiste em prender inocentes, traz subtextos claros (cof-cof), enquanto a sequência que envolve a transformação do herói em um jumento é concebida para despertar terror e tristeza – além de resultar no plano mais bonito (e apavorante) do filme: aquele que traz um burro amarrado pelo pescoço (pois é, de novo) a um peso que o mantém submerso com o objetivo de afogá-lo.
Mas Pinóquio também oferece várias passagens de humor, leveza e redenção, permitindo a Roberto Benigni, por exemplo, explorar tanto a solidão e miséria de Gepetto quanto sua doçura e dedicação – e, se tratando de Benigni, não é surpresa que o personagem ganhe um toque de insanidade (aliás, é curioso lembrar que o ator viveu Pinóquio em sua própria adaptação da fábula). Acima de tudo, no entanto, o interesse da obra é manter um ritmo intenso de aventura, saltando de um episódio a outro a fim de incluir todos os acontecimentos clássicos da fábula sem cometer o erro de tornar a experiência desconjuntada, como se apenas riscasse itens de uma lista, sendo bem sucedida na maior parte do tempo.
Abraçando até as lições de moral básicas das histórias infantis (mentir é feio; é preciso respeitar os pais; estudar é importante), mas sem que estas soem condescendentes, esta nova versão de Pinóquio é tudo que as refilmagens live-action dos clássicos da Disney têm tentado fazer sem sucesso: um filme que respeita e segue os passos do original, mas oferecendo razões próprias para existir.
Texto originalmente publicado como parte da cobertura do Festival de Berlim 2020
24 de Fevereiro de 2020
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