Datas de Estreia: | Nota: | ||
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Brasil | Exterior | Crítico | Usuários |
03/08/2012 | 01/01/1970 | 5 / 5 | 5 / 5 |
Distribuidora | |||
Duração do filme | |||
78 minuto(s) |
Dirigido por Ana Rieper.
A grande virtude de Vou Rifar Meu Coração, documentário sobre a força da música brega especialmente no nordeste do país, reside na estupenda seleção dos personagens enfocados pela diretora Ana Rieper – e em vários momentos pude visualizar mentalmente a cineasta erguendo os punhos em sinal de vitória por trás da câmera ao ouvir declarações particularmente inspiradas e divertidas feitas por seus depoentes.
Intercalando depoimentos de fãs daquele gênero musical a outros feitos por alguns de seus principais expoentes (Wando, Odair José, Amado Batista, Agnaldo Timóteo, Nelson Ned e Lindomar Castilho – cujos nomes, talvez por identificação, acabam soando tão cafonas quanto suas músicas), o longa não busca identificar através de legendas a identidade dos entrevistados, o que, embora por vezes frustrante, é eficiente ao equiparar artistas e fãs, reduzindo todos ao mesmo patamar: o de defensores do brega. Neste aspecto, é curioso perceber como a paixão por aquelas músicas vem constantemente associada a lembranças afetivas – especialmente a casos de traição (um campo promissor que chega a inspirar o sucesso de um radialista que, criador de um programa chamado “A Hora e a Vez do Corno Apaixonado”, comemora: “Esse negócio de corno dá certo!”).
E é precisamente graças a estes relatos que Vou Rifar Meu Coração se torna tão memorável, já que não há como deixar de admirar (mesmo rindo) alguém capaz de dizer sem qualquer sombra de ironia algo como “Acredito que outra pessoa, além de mim e da esposa, ele não tem”. Da mesma maneira, a diretora Ana Rieper faz um verdadeiro achado ao incluir no filme o ex-prefeito Osmar e suas duas famílias – e é curioso perceber como mesmo se relacionando há 33 anos com a amante, com a qual tem filhos e netos, ele a trata como... amante, afirmando que a prioridade é a esposa (que, sim, sabe de tudo, já que o marido passa três noites por semana na casa da outra). E mesmo que seja comovente ver o sofrimento destas mulheres, é impossível não rir da habilidade de Osmar em convencê-las a batizar todos os filhos (e também os netos!) com variações de seu próprio nome, o que torna difícil até mesmo para a avó a tarefa de lembrar os nomes de todos os descendentes.
Por outro lado, é interessante observar como os cantores enfocados pelo documentário surgem pregando filosofias e soltando frases bregas como as músicas que os tornaram famosos, o que é, no mínimo, um sinal de coerência – e, neste aspecto, Wando merece destaque não só por sua estranha dicção e pelo visual, mas também por soltar pérolas como “Imagina uma pessoa que nunca deu flores para outra pessoa”. E o que dizer do sujeito que ganha a vida como cover de Amado Batista, naquela que, depois de limpador de jaulas, deve ser a profissão mais triste do mundo?
Ainda assim, Vou Rifar Meu Coração tem um imenso mérito que é o de jamais fazer o que fiz no parágrafo anterior: juízo de valor sobre as canções que enfoca. Para Rieper, aquelas músicas são tão válidas quanto os sentimentos que despertam – e, brincadeiras à parte, devo dizer que concordo com a cineasta. Pois as manifestações daquelas dores e lembranças podem vir até embaladas numa roupagem cafona, mas jamais deixam de refletir sentimentos profundamente reais e, por isso mesmo, tocantes.
Esta crítica foi originalmente publicada durante a coberta da Mostra de São Paulo de 2011.
04 de Novembro de 2011