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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
27/12/2013 01/01/1970 3 / 5 3 / 5
Distribuidora
Fox Film

Direção

Ben Stiller

Elenco

Ben Stiller , Kristen Wiig , Adam Scott , Kathryn Hahn , Adrian Martinez , Patton Oswalt , Shirley MacLaine , Sean Penn

Roteiro

Steve Conrad

Produção

Ben Stiller , John Goldwyn

Fotografia

Stuart Dryburgh

Música

Theodore Shapiro

Montagem

Greg Hayden

Design de Produção

Jeff Mann

Figurino

Sarah Edwards

Direção de Arte

Tom Reta

A Vida Secreta de Walter Mitty
The Secret Life of Walter Mitty

Dirigido por Ben Stiller. Com: Ben Stiller, Kristen Wiig, Adam Scott, Kathryn Hahn, Adrian Martinez, Patton Oswalt, Shirley MacLaine e Sean Penn.

Inspirado num conto escrito em 1939 por James Thurber e que já dera origem a um longa (medíocre) estrelado por Danny Kaye em 1947, A Vida Secreta de Walter Mitty é, em sua superfície, uma obra sobre um homem frustrado que usa a imaginação como maneira de escapar de seu cotidiano entediante e vazio – e se digo “em sua superfície” é porque, na realidade, este trabalho dirigido e protagonizado por Ben Stiller acaba soando mais como um filme de autoajuda, apelando para frases feitas e imagens que não ficariam deslocadas em uma apresentação em PowerPoint sobre as virtudes de “Acreditar Em Si Mesmo”.

Adaptado por Steve Conrad (O Sol de Cada Manhã, À Procura da Felicidade), o roteiro acompanha o personagem-título (Stiller), que, responsável pela seção de negativos (atenção: METÁFORA!) da revista Life (atenção: outra METÁFORA!), é covarde a ponto de hesitar em enviar uma simples piscadinha para uma colega de trabalho através de uma rede social. Surpreendido pela notícia de que a publicação foi vendida para uma corporação que pretende extinguir a edição impressa e transformá-la apenas em uma revista digital (o que realmente ocorreu em 2000), Walter se vê numa situação complicada ao receber os mais recentes negativos do famoso fotógrafo Sean O’Connell (Penn) e perceber que um deles está faltando – justamente o escolhido para ilustrar a última capa da revista. Determinado a corrigir o erro, o sujeito parte numa jornada em busca de O’Connell que o leva à Islândia, à Groenlândia, ao Himalaia (METÁFORA, METÁFORA, METÁFORA) até descobrir que a resposta, ao melhor estilo O Alquimista, encontrava-se nele mesmo (METÁFORA LITERAL).

Enquanto na ainda mais machista década de 40 a opressão vivida por Walter surgia representada, no filme original, por sua mãe e pela noiva, desta vez as ansiedades do herói são provocadas pela impessoalidade e pela brutalidade das grandes corporações – uma tendência que o Cinema norte-americano vem explorando de forma cada vez menos sutil há cerca de uma década. O curioso, porém, é notar como Ben Stiller parece não compreender exatamente o que o roteiro está buscando fazer, já que, enquanto Conrad desenvolve uma história disparada pela frieza do capitalismo, o filme em si investe pesadamente no merchandising, trazendo inserções grosseiras de bancos, pizzarias e sites de relacionamentos, entre outros.

Além disso, se no conto e no primeiro filme as viagens imaginárias de Walter Mitty eram disparadas por um cotidiano opressivo, aqui o sujeito surge mais como um sonhador naturalmente incorrigível, o que elimina parte de seu arco dramático – algo que é parcialmente corrigido pelo interesse amoroso representado por Kristen Wiig, que, sem oportunidade de exercer seu talento cômico, cria uma personagem gentil que, mesmo sem possuir uma beleza convencional, se estabelece como um objetivo romântico adorável. E se as transições entre realidade e fantasia eram óbvias nas versões anteriores, Stiller também acerta ao investir numa abordagem sutil, o que eventualmente leva o próprio espectador a se questionar, em certos momentos, se o que está vendo é apenas a imaginação do personagem em ação.

Mergulhado numa paleta fria que aposta no cinza como forma de representar a tristeza da vida de Walter, o filme rapidamente ilustra a personalidade reprimida do protagonista ao trazê-lo na metade inferior do quadro e diminuído em um mundo sem cores – e, neste sentido, o design de produção é inteligentíssimo ao representar a redação da Life como um ambiente no qual as reproduções gigantescas das capas servem como contraponto à pequenez de seu funcionário ao trazerem os rostos colossais de personalidades que representam tudo que ele jamais conseguiu ser. Assim, quando gradualmente Walter vai substituindo suas roupas em tons pasteis e cortes conservadores por outras em tom vermelho e estilos mais casuais, percebemos como sua viagem já está exercendo efeitos sobre sua personalidade sem que isto precise ser exposto através de diálogos.

E que mesmo assim estas mudanças sejam mastigadas para o espectador e expressadas verbalmente é um grande desapontamento. Aliás, é justamente a insistência do roteiro de Conrad de tratar o público como um coletivo de idiotas incapaz de compreender suas “grandes mensagens” que acaba prejudicando o projeto – o que inclui até mesmo a necessidade de revelar o conteúdo do negativo 25 quando já estávamos perfeitamente satisfeitos com a ideia de enxergá-lo como um símbolo autoexplicativo que se tornaria muito mais eficaz quando deixado se desenvolver na imaginação de cada um. O mesmo, aliás, vale para o belíssimo instante no qual o fotógrafo vivido brilhantemente por Sean Penn decide apreciar uma visão rara sem tentar registrá-la com sua câmera – e que, mais uma vez, acaba sendo parcialmente arruinado pela insistência do filme em explicar exatamente a mensagem ali contida.

No entanto, o maior pecado de A Vida Secreta de Walter Mitty é mesmo sua confusão diante das próprias mensagens – e se sua postura diante das corporações já soava contraditória, a coisa se torna pior quando percebemos que, depois de tentar estabelecer que o protagonista poderia encontrar mágica e aventura em sua própria vida, estas surgem não como belezas cotidianas, mas como eventos fantásticos como encontros com tubarões famintos, vulcões em erupção e assim por diante.

Em outras palavras: de acordo com o filme, podemos ser felizes, sim, em nossas próprias realidades. Desde que estas envolvam gastos pesados no cartão de crédito enquanto viajamos para locações magníficas e mergulhamos numa lógica fantasiosa, tornando-nos a representação do homem comum – mas um que seja, claro, digno de figurar numa capa de revista.

21 de Dezembro de 2013

Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

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