Seja bem-vindx!
Acessar - Registrar

Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
22/05/2025 23/05/2025 4 / 5 4 / 5
Distribuidora
Paramount Pictures
Duração do filme
169 minuto(s)

Missão: Impossível - O Acerto Final
Mission: Impossible - The Final Reckoning

Dirigido por Christopher McQuarrie. Roteiro de Erik Jendresen e Christopher McQuarrie. Com: Tom Cruise, Hayley Atwell, Ving Rhames, Simon Pegg, Greg Tarzan Davis, Esai Morales, Pom Klementieff, Henry Czerny, Holt McCallany, Janet McTeer, Nick Offerman, Hannah Waddingham, Tramell Tillman, Shea Whigham, Katy O´Brian, Rolf Saxon, Lucy Tulugarjuk e Angela Bassett.

Em certo momento de Missão: Impossível – O Acerto Final, um personagem menciona a data 22 de maio de 1996 como tendo sido palco de um evento marcante que deve ser levado em consideração antes que determinada decisão seja tomada - uma referência autorreferencial nada sutil ao dia em que o primeiro filme da franquia estreou nos Estados Unidos. Este detalhe, associado a diversos outros elementos narrativos e visuais, reforça uma ideia que se torna central ao longo da narrativa: a de que aqui um ciclo se encerra, como se os sete capítulos anteriores tivessem conduzido seu herói e, por extensão, o próprio espectador até este momento específico – um conceito que o filme praticamente enuncia de forma literal em certo ponto.


Este tom de desfecho, que pode conter prenúncios fatalísticos ou não, se torna ainda mais acentuado durante o primeiro ato, quando flashbacks nos transportam rapidamente para todos os longas anteriores da série, revisitando as sequências de ação mais marcantes, os parceiros que acompanharam Ethan Hunt ao longo dos anos e os vilões que este enfrentou. E esta não é, por sinal, a única passagem em que O Acerto Final investe neste recurso sublinhando insistentemente a ideia de finalidade – ainda que esta insistência carregue certa dose de hipocrisia.

Ignorando como tramas complexas jamais foram o ponto forte da franquia, que desde o original dirigido por Brian De Palma compreendeu que o prazer destes filmes reside na busca e não no objetivo desta, o roteiro escrito pelo diretor Christopher McQuarrie ao lado de Erik Jendresen insiste no principal equívoco de Acerto de Contas Parte 1 ao tratar a “Entidade” como algo mais do que um mero MacGuffin (termo cunhado por Hitchcock para designar um elemento que move a história, que os personagens perseguem, mas cuja natureza específica pouco importa). Aliás, os roteiristas vão além e buscam inclusive trazer significado a MacGuffins de episódios anteriores, como o Pé de Coelho que mobilizou os agentes da IMF (Impossible Mission Force) no terceiro filme – aquele que, embora não seja o melhor da franquia (título que pertence a Efeito Fallout), traz seu melhor vilão graças à performance do brilhante Philip Seymour Hoffman.

Continuamente prejudicado pela necessidade de explicar a trama para o espectador - principalmente considerando que Acerto de Contas Parte 1 desapontou nas bilheterias e portanto é provável que boa parte do público desconheça os eventos daquele filme (não é à toa que o subtítulo agora foi alterado para evitar a ideia de que ter assistido ao anterior é necessário) -, este Acerto Final comete um dos pecados mais graves do cinema de ação: o excesso de exposição. Interrompendo a fluidez da narrativa para investir em momentos de exposição em ao menos quatro momentos distintos durante a projeção, o filme pausa tudo para que os personagens recapitulem o que aconteceu (não apenas na série, mas no próprio filme), expliquem uns para os outros o que está acontecendo e resumam os riscos e problemas que enfrentarão – algo que, nem preciso dizer, soa invariavelmente artificial.

Aliás, para tentar disfarçar esta artificialidade – paradoxalmente tornando-a ainda mais evidente –, McQuarrie emprega o terrível método de fazer os personagens conversarem sobre seus planos enquanto um completa a frase do outro, criando a impressão absurda de que todos estão discutindo algo que já conhecem em detalhes enquanto a montagem corta rapidamente de uma figura para outra, cada uma contribuindo com um fragmento do plano, numa tentativa desesperada de trazer alguma fluidez a cenas que essencialmente paralisam o filme. Neste sentido, a personagem interpretada por Pom Klementieff logo se estabelece como a mais irritante, frequentemente intervindo após longas explicações para adicionar frases redundantes e desnecessariamente dramáticas como "isso decidirá quem vai viver e quem vai morrer".

Como se não bastasse, a situação piora consideravelmente quando o filme tenta incorporar discussões contemporâneas, forçando referências a fake news e à polarização política que tomou conta de tantos países – temas que funcionariam melhor como subtexto, mas que o roteiro insiste em explicitar aos gritos, incluindo um momento em que o personagem de Tom Cruise literalmente grita para um oponente que este está "passando tempo demais na internet".

Dito isso, se a franquia Missão: Impossível sempre teve como foco principal suas sequências de ação, é neste elemento que o filme encontra sua redenção, já que sua energia frenética se anuncia desde os primeiros segundos, quando as estrelas da vinheta da Paramount voam em velocidade acelerada para cercar a icônica montanha como se estivessem em modo turbo. Encadeando perseguições, lutas, tiroteios, explosões e uma infinidade de variações de todos estes elementos, O Acerto Final chega ao ponto de situar alguns de seus confrontos fora de campo – como no instante em que uma briga intensa envolvendo Hunt e um forte adversário é retratada apenas através de seus ruídos enquanto testemunhamos a reação de uma personagem (o que resulta em um belo efeito cômico quando finalmente vemos o resultado da luta).

Tom Cruise, por sinal, mais uma vez comprova como possui um timing cômico frequentemente subestimado, conseguindo evocar reações de seu personagem que sugerem como o próprio Ethan Hunt fica surpreso diante das situações extremas em que se encontra – e, aliás, é impossível não reconhecer com a dedicação física de um ator que, aos 62 anos, não apenas realiza suas próprias cenas de ação como exibe uma forma que desafiaria indivíduos com um terço de sua idade. Sim, provavelmente há um componente de vaidade nessas escolhas (como surgir em uma luta durante a qual veste apenas um short), mas é curioso como Cruise consegue projetar simultaneamente desprendimento e bom humor em relação a essa mesma vaidade – uma contradição que, de certa forma, espelha a própria natureza da franquia.

Concebidas com inventividade e intensidade, as sequências de ação não apenas são bem coreografadas, mas também montadas com notável precisão: em determinado momento, por exemplo, duas lutas acontecem paralelamente em locais diferentes, envolvendo personagens distintos, e o filme salta de uma para outra utilizando movimentos específicos como pontos de transição – solução não apenas eficaz, mas elegante em sua execução. E se a sequência mais divulgada durante a campanha de lançamento do longa é aquela em que Cruise mais uma vez arrisca sua vida para nosso entretenimento ao se pendurar em um biplano que realiza manobras perigosas, a passagem que considero mais inventiva ocorre dentro de um submarino: carregada de efeitos visuais e claramente filmada em estúdio, esta sequência impressiona não apenas pela concepção das várias câmaras do submarino – que vão se tornando progressivamente mais claustrofóbicas e ameaçadoras à medida que o protagonista avança –, mas principalmente pelos obstáculos que vão surgindo em torno do herói e que envolvem mísseis que se deslocam perigosamente em função da rotação da embarcação.

Inteligente também ao promover o retorno de determinado personagem do primeiro filme da série – amarrando uma ponta divertida da trama quase 30 anos depois de sua origem, O Acerto Final reforça assim a impressão de um ciclo que se completa de maneira orgânica e satisfatória. Assim, apesar dos problemas apontados anteriormente, este oitavo longa da franquia assegura a posição de seu astro como representante máximo do tipo de espetáculo no qual Hollywood sempre se especializou. Jamais operando no piloto automático (nem os maiores detratores do ator podem acusá-lo disso) e demonstrando um amor indiscutível pelo cinema e pela experiência de assistir a filmes na tela grande, Cruise se tornou um símbolo tão importante para a indústria que, ao surgir na tela pela primeira vez durante a sessão para a imprensa em Cannes, o público – tradicionalmente cínico nestes eventos – aplaudiu espontaneamente sua aparição.

Um momento que resume perfeitamente o que Tom Cruise e a franquia Missão: Impossível representam para o cinema contemporâneo: um compromisso eficiente com o espetáculo visual que, mesmo com suas falhas narrativas, consegue resgatar a empolgação que lá atrás despertou nosso amor pela Sétima Arte.

Texto originalmente publicado como parte da cobertura do Festival de Cannes 2025

15 de Maio de 2025

(O Cinema em Cena é um site totalmente independente cuja produção de conteúdo depende do seu apoio para continuar. Para saber como apoiar, conhecer as recompensas - além do acesso gratuito a todo nosso conteúdo -, basta clicar aqui. Precisamos apenas de alguns minutinhos para explicar. E obrigado desde já pelo clique!)

Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

Você também pode gostar de...

 

Para dar uma nota para este filme, você precisa estar logado!