Datas de Estreia: | Nota: | ||
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Brasil | Exterior | Crítico | Usuários |
18/09/2014 | 01/01/1970 | 3 / 5 | / 5 |
Distribuidora | |||
Downtown/Paris |
Dirigido por Tomas Portella. Roteiro de Mariana Vielmond e Tomas Portella. Com: Bruno Gagliasso, Regiane Alves, Juliana Alves, Silvio Guindane.
Isolados é um filhote raro no Cinema brasileiro: um exercício de gênero que tenta construir sua narrativa através dos clichês do terror e do suspense sem se preocupar em temperá-la com alguma regionalidade que a torne mais nossa. Isto, porém, não é necessariamente ruim como talvez a descrição anterior tenha feito o esforço do diretor Tomas Portella soar: desde que funcionem, clichês não precisam ser defeitos, servindo como recurso para contar uma história de maneira econômica por permitir que percebamos para onde esta caminha sem que um longo tempo tenha que ser investido no processo. E, na maior parte da projeção, Isolados funciona bem.
Escrito por Portella ao lado de Mariana Vielmond (filha de José Wilker e Renée de Vielmond), o roteiro tem um início formulaico: depois de testemunharmos um ataque a uma garotinha no meio da mata, passamos a acompanhar o casal formado pelo médico Lauro (Gagliasso) e a desenhista Renata (Alves), que decidem passar alguns dias numa casa isolada, sendo prontamente alertados sobre a presença de um maníaco local por um habitante da região. A partir daí, não é difícil imaginar o que ocorre: Renata é atacada, o namorado descobre a garota desacordada no meio da floresta e, enquanto se esforça para tratar seus ferimentos, é também obrigado a protegê-la dos dois assassinos que os cercam.
Prejudicado pontualmente por um roteiro mais complicado do que o necessário e que compromete o ritmo da narrativa através de uma cronologia quebrada por motivos dispensáveis (praticamente todos os flashbacks poderiam ser descartados sem comprometer nossa compreensão acerca dos personagens e sua situação), o filme tem um primeiro ato trôpego: os letreiros que informam passagens de tempo soam amadores, os policiais que vemos em ação paralela são caricaturas grosseiras e os sustos ocasionais parecem depender pesadamente da trilha sonora para que funcionem. No entanto, a partir do instante em que a trama passa a se concentrar nos dois personagens centrais, o filme finalmente ganha intensidade e – o mais importante – estabelece uma atmosfera crescente de tensão e angústia.
Já do ponto de vista técnico, Isolados é eficiente desde o primeiro minuto: os figurinos de Ana Avelar, por exemplo, deixam clara a dinâmica do casal Lauro e Renata ao mesmo tempo em que sugerem quem são. Não é à toa, por exemplo, que o sujeito surge em roupas conservadoras e de tons sóbrios, projetando um ar inofensivo e mesmo anacrônico desde sua primeira cena, ao passo que Renata, envolvida em um triste cinza, um casaco que parece imenso sobre seu corpo e um cachecol que insiste em enforcá-la, é o retrato da depressão e da desistência. Soma-se a isto a fotografia dessaturada de Gustavo Hadba, que investe numa paleta sem vida e fria, mergulhando o público num universo habitado por pessoas infelizes e insatisfeitas.
Isto, claro, encontra eco nas boas performances de Gagliasso e Alves: é interessante, por exemplo, notar como ele exibe uma preocupação excessiva com a namorada, ultrapassando a fronteira entre o zelo e a possessividade absoluta ao praticamente anunciar que agora ela “tem vontade de viver e de permanecer ao (seu) lado” – uma declaração de amor que soa mais como uma sentença. Porém, o mais intrigante em Isolados é notar como, à medida que a situação se complica, a aparência de Renata caminha na direção oposta à do namorado, como se ela ganhasse a cor que vai desaparecendo do rosto deste (um trabalho de maquiagem e – novamente – de figurino excepcional). A razão por trás destas transições é algo que ajuda a manter o espectador tenso e envolvido com a trama mesmo quando esta parece ter pouco a oferecer.
Enquanto isso, o diretor Tomas Portella demonstra ter feito o dever de casa ao aplicar as convenções do gênero em suas câmeras subjetivas e cortes bruscos – mas seria injusto não reconhecer que o cineasta é competente também ao produzir uma desorientação cada vez mais sufocante através da utilização de planos inclinados, de posicionamentos atípicos de câmera (e de movimentos igualmente súbitos) e da utilização certeira de grandes angulares que ilustram a distorção da realidade que envolve os personagens. Por outro lado, é uma pena que inicialmente o filme introduza o conceito de uma casa sem privacidade, repleta de vitrais, janelas e portas transparentes, apenas para jamais utilizá-lo de fato. Ainda assim, em seus melhores momentos, Isolados remete diretamente ao Sob o Domínio do Medo de Peckinpah, o que não deixa de ser admirável.
Servindo como homenagem póstuma a José Wilker, que aqui surge em seu último papel no Cinema, o longa é, ainda assim, uma experiência agridoce neste aspecto, já que o talentoso ator pouco tem a fazer na trama, vivendo um personagem absolutamente descartável e que soa incompleto.
Isolados é, em suma, um filme pouco original, mas que se sustenta bem e cujo final funciona em sua lógica particular. E que – igualmente importante – leva o espectador a deixar a sala com uma sensação de angústia que reflete à de seus sofridos personagens.
09 de Agosto de 2014