Datas de Estreia: | Nota: | ||
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Brasil | Exterior | Crítico | Usuários |
01/01/1970 | 01/01/1970 | 5 / 5 | / 5 |
Distribuidora | |||
Duração do filme | |||
82 minuto(s) |
Dirigido por Gabriela Cowperthwaite.
Assim como seu primo de alma The Cove, este Blackfish é um documentário que envia o espectador para fora do cinema com uma sensação de intensa revolta ao retratar de maneira implacável a pavorosa realidade por trás de empresas que vendem espetáculos aquáticos protagonizados por golfinhos, orcas e outros animais que, mantidos em condições de extrema crueldade, se transformam em verdadeiras bombas-relógio em função do imenso estresse sob o qual passam suas tristes existências.
Partindo de um trágico incidente recente que resultou na morte de uma treinadora do SeaWorld, a experiente Dawn Brancheau, o longa de Gabriela Cowperthwaite busca demonstrar como o desastre foi um resultado lógico e quase inevitável não só da negligência dos diretores do evento, mas também da própria cultura por trás deste tipo de espetáculo. Para isso, a cineasta traz entrevistas incriminadoras com diversos ex-treinadores de baleias orca e pesquisadores especializados neste tipo de animal, empregando uma irretocável pesquisa para comprovar suas declarações através de imagens e dados chocantes.
É terrível, por exemplo, descobrir como os caçadores de orca buscam os filhotes mais jovens para diminuir os custos de transporte – uma prática descrita por um deles como “a pior coisa que já fiz na vida” – e constatar, também, como isto se torna ainda mais grave em função da natureza dos animais, acostumados a viver em grupos fixos e a manter os filhotes ao seu lado por bastante tempo. (E quando o SeaWorld separa outra baleia de sua cria por julgar que esta “atrapalha o espetáculo”, vários ex-treinadores relatam os prolongados gritos de tristeza e desespero da mãe, o que ganha contornos de pesadelo quando uma neurocientista revela que análises com aparelho de tomografia indicam um desenvolvimento acentuado das regiões do cérebro das orcas relacionados a sentimentos e percepções.)
A partir daí, o filme não precisa se esforçar muito para defender sua tese principal, bastando relatar a história da baleia Tilikum, responsável pela morte de Brancheau, para que percebamos como a atitude do animal foi uma resposta até demorada às décadas de maus-tratos pelas quais passou. Capturado em 1981 e mantido num cativeiro minúsculo que mal lhe permitia movimentar-se durante a noite, Tilikum provocaria, uma década depois, a morte de uma treinadora no SeaLand – e se isto já seria um indício do descaso desta indústria, o caso se torna verdadeiramente criminoso quando descobrimos que o SeaWorld, ao comprar a orca do antigo concorrente, ocultou de seus funcionários o histórico do espécime.
O que se segue é uma apresentação organizada e revoltante das estratégias da corporação para minimizar quaisquer incidentes (e são muitos), quando a culpa por qualquer imprevisto passa a ser depositada nas costas dos treinadores ao mesmo tempo em que as práticas desumanas da empresa são minimizadas através da desinformação sistemática do público. Em certo momento da projeção, por exemplo, Cowperthwaite usa câmeras ocultas para mostrar funcionários do SeaWorld dizendo para seus visitantes que a vida média de uma orça é de 35 anos e que estas vivem mais tempo em cativeiro do que no mar – quando, na realidade, elas vivem basicamente o mesmo que um ser humano, morrendo muito mais cedo quando presas (além de nunca atacarem quando em seu ambiente natural).
Com isso, torna-se impossível assistir a Blackfish sem que experimentemos um tremendo embaraço por termos, em algum momento, visitado algum show como o SeaWorld ou admirado o balé aquático protagonizado por orcas em cativeiro, já que o filme expõe nossa cegueira para o fato de que o que julgávamos um show era basicamente uma cruel, imperdoável e longa tortura.
Texto originalmente publicado como parte da cobertura do Festival do Rio 2013.
30 de Setembro de 2013