Datas de Estreia: | Nota: | ||
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Brasil | Exterior | Crítico | Usuários |
05/07/2013 | 01/01/1970 | 2 / 5 | / 5 |
Distribuidora | |||
California | |||
Duração do filme | |||
115 minuto(s) |
Dirigido por Marco Bellocchio. Com: Toni Servillo, Isabelle Huppert, Alba Rohrwacher, Michele Riondino, Maya Sansa, Pier Giorgio Bellocchio, Brenno Placido, Gianmarco Tognazzi, Carlotta Cimador.
Não sou um grande fã do cineasta italiano Marco Bellocchio e, assim, não me espanta que em seu novo filme ele tente abordar uma questão tão complexa quanto a eutanásia sem conseguir de fato dizer algo de relevante sobre o assunto, optando pelo melodrama, pela caricatura e pela pretensão em vez de explorar o tema que ele mesmo escolheu como pano de fundo para a narrativa.
Ambientado em fevereiro de 2009, quando a Itália parou para acompanhar o desfecho do caso de Eluana Englaro (uma mulher que, depois de permanecer 17 anos em coma, morreu quando seu pai solicitou autorização à justiça para desligar os aparelhos que a mantinham viva), A Bela que Dorme é, em sua superfície, uma discussão sobre a eutanásia – e, para isso, o roteiro escrito por Bellocchio, Veronica Raimo e Stefano Rulli conta três histórias paralelas relacionadas direta ou indiretamente à situação de Eluana. No primeiro, um senador que se encontra em seu primeiro mandato (Servillo, sempre excelente) se vê forçado por seu partido a votar pela manutenção da vida da paciente, o que vai de encontro às suas crenças particulares e algo que já o fez entrar em conflito com a filha Maria (Rohrwacher), católica devota e que, durante a vigília pela vida de Englaro, se envolve com um rapaz (Riondino) que defende a eutanásia. Já a segunda trama acompanha uma célebre atriz (Huppert) que abandonou a carreira para cuidar da filha em coma, negligenciando o marido e o filho no processo. Para encerrar, conhecemos o médico Pallido (Bellocchio, filho do diretor), que salva uma estranha (Sansa) do suicídio, decidindo manter-se ao pé de sua cama enquanto ela permanece sedada.
Inicialmente adotando uma estrutura entrecortada que alterna entre as várias histórias enquanto ainda mergulha em flashbacks ocasionais, a montagem de Francesca Calvelli é hábil ao costurar a narrativa gradualmente, eventualmente colocando sentido em todas as subtramas e saltando de forma fluida entre estas. Infelizmente, mesmo que compreendamos as motivações e os conflitos de todos os personagens, estes se revelam tolos ou artificiais em sua maioria – e as passagens envolvendo o médico são particularmente ineficazes pela falta de verossimilhança da situação e da motivação vazia do sujeito (e a natureza agressiva e fria da paciente não ajudam). Da mesma maneira, o fanatismo religioso da atriz encarnada por Huppert mantem-se em uma só nota, não indo a lugar algum, o que nos deixa apenas com as sequências que giram em torno do senador de Toni Servillo, que, angustiado em função da decisão que deverá tomar e também ansioso por não conseguir falar com a filha, experimenta horas de absoluta tensão e desconforto. Além disso, as passagens relacionadas ao político contam também com o melhor personagem do longa: um psiquiatra que, atendendo os senadores, tece comentários precisos sobre a natureza da política e do fascínio pela notoriedade.
Mas, afinal, o que Marco Bellocchio quer dizer através de seus personagens? Há, como não poderia deixar de ser, uma presença constante de símbolos e interesses religiosos em todas as narrativas – e a intensidade com que Huppert obriga suas enfermeiras/freiras a rezar indica uma tentativa desesperada de se fazer ouvir por Deus mesmo que através do grito -, mas nem mesmo a influência da Igreja sobre a política vai além de um ou outro comentário sobre o que o papa tem a dizer sobre o assunto. Neste aspecto, diga-se de passagem, o comentário mais interessante é feito (mais uma vez) por Servillo, que aponta como ele, um descrente, tentou de todas as formas manter viva a esposa doente, ao passo que esta, católica fervorosa, pedia para morrer, num paradoxo aparente que aponta para a complexidade moral da questão. E não é à toa que Maria, supostamente tão dedicada à sua causa e ao seu Deus, não hesita em abandonar a vigília para encontrar o homem pelo qual se apaixonou, indicando um impulso de dar prosseguimento à vida que, ela se recusa a perceber, é negado à moça em estado vegetativo que ela egoistamente tenta manter presa aos aparelhos.
Beirando o patético em algumas escolhas narrativas inexplicáveis (como a insistência em incluir uma trilha incômoda sempre que o dr. Pallido encontra-se mergulhado em reflexões e que é interrompida subitamente quando cortamos para outro personagem), A Bela que Dorme no máximo se diverte com a contradição entre pacientes comatosas que interrompem a existência dos vivos ao seu redor e a viciada cuja sedação é condição para mantê-la viva. Mas até isso é atirado no lixo eventualmente para que Bellocchio possa retornar aos diálogos vazios que, como seu próprio filme, não dizem absolutamente nada de relevante.
20 de Outubro de 2012