Datas de Estreia: | Nota: | ||
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Brasil | Exterior | Crítico | Usuários |
16/03/2012 | 01/01/1970 | 3 / 5 | / 5 |
Distribuidora | |||
Nossa | |||
Duração do filme | |||
102 minuto(s) |
Dirigido por Nanni Moretti. Com: Michel Piccoli, Nanni Moretti, Jerzy Stuhr, Renato Scarpa, Camillo Milli, Margherita Buy.
A ideia que move Habemus Papam é excepcional: depois de eleito pelo conclave de cardeais após a morte do antigo Papa, o novo sumo-pontífice apavora-se diante da possibilidade de assumir o comando da Igreja e se recusa a apresentar-se aos fiéis. Presos no Vaticano enquanto o novo Papa não for identificado ao público, os cardeais entregam-se a jogos infantis enquanto discutem vários assuntos com um psiquiatra ateu chamado de urgência para tentar curar a fobia de seu líder. Posso imaginar inúmeras situações potencialmente hilárias que esta premissa originaria – e, de fato, o diretor Nanni Moretti pensou na maioria delas, falhando apenas em desenvolvê-las com cuidado, mostrando-se mais interessado em atirar para todos os lados do que em se concentrar para garantir que as gags funcionariam bem.
Já humanizando os poderosos cardeais desde o princípio, quando ficam momentaneamente no escuro e isolados do mundo depois que uma falha de luz ocorre durante o conclave, Moretti é hábil ao estabelecer o tom levemente satírico de sua obra ao trazer um religioso tentando espiar o voto do colega, estabelecendo também a falta de vaidade daqueles homens e o peso representado pelo cargo ao mostrá-los orando secretamente para que não sejam os escolhidos. No entanto, o filme parece mesmo encontrar seu caminho quando o psiquiatra vivido pelo próprio diretor entra em cena e tenta, sem sucesso, manter uma sessão com o novo Papa enquanto é observado por todos os cardeais e recebe a orientação de não discutir nada relacionado a sonhos, desejos, sexo ou mesmo os sonhos do paciente.
Assim, se por alguns momentos sugere estar prestes a se tornar uma espécie de O Papa no Divã, o longa rapidamente toma outro caminho, abandonando aquela linha narrativa, mas mantendo o personagem – e, embora o médico jamais volte a se encontrar com o Papa (o que é uma pena), é mantido na trama ao ser impedido de deixar o Vaticano, passando a interagir com os cardeais e rendendo alguns bons momentos (mas não o suficiente para justificar sua inclusão no filme, o que é indicativo do descuido com que é explorado pelo roteiro, que parece inclinado a abandonar situações no meio exatamente como o campeonato de vôlei organizado pelo psiquiatra e abruptamente encerrado antes das semi-finais).
O mais frustrante é perceber como Habemus Papam parece reconhecer tudo o que poderia fazer com aquela premissa, já que, vez por outra, brinca em explorar ideias como retratar os cardeais enlouquecendo na companhia uns dos outros; ao trazê-los discutindo a Fé e a Bíblia com o psiquiatra ateu; ou ao iniciar uma discussão entre este e um dos principais cardeais sobre Darwinismo e Criacionismo – mas nenhuma destes esforços segue adiante. Por outro lado, Moretti é bem-sucedido em sua tentativa de retratar aqueles homens como indivíduos dignos da posição que ostentam, surgindo até mesmo infantilizados por sua fé incondicional e por sua ingenuidade.
Neste sentido, vale dizer, é que o veterano Michel Piccoli se apresenta como o destaque indiscutível do longa: encarnando o novo Papa com um equilíbrio perfeito de insegurança, pânico, mas profunda gentileza e doçura, o ator constrói um personagem vulnerável, fragilizado, mas cujas atitudes, que poderiam ser facilmente interpretadas como covardes, refletem apenas sua preocupação incondicional com seus fiéis e com a própria Igreja. Trata-se provavelmente de uma das melhores performances do ano e da própria carreira de Piccoli – e considerando a galeria de personagens memoráveis vividos pelo sujeito, isto não é pouca coisa.
Mas fazendo jus ao seu potencial cômico ou não, Habemus Papam é um filme honesto e corajoso ao seu próprio modo – algo que se comprova em seu desfecho forte, humano e que, mesmo talvez soando insatisfatório ao espectador, é perfeito do ponto de vista dramático. Com isso, mesmo lamentando o desperdício de uma boa ideia, torna-se impossível desgostar do resultado por ela originado.
Observação: esta crítica foi originalmente publicada como parte da cobertura da Mostra de São Paulo de 2011.
04 de Novembro de 2011