Seja bem-vindx!
Acessar - Registrar

Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
10/10/2013 07/09/2011 4 / 5 / 5
Distribuidora
Duração do filme
88 minuto(s)

Terraferma
Terraferma

Dirigido por Emanuele Crialese. Com: Filippo Pucillo, Donatella Finocchiaro, Beppe Fiorello, Mimmo Cuticchio, Martina Codecasa, Timnit T.

Depois de contar em Respiro, de 2002, a história de uma mulher impulsiva (Valeria Golino) sufocada pelas tradições da pequena comunidade paradisíaca na qual residia, o cineasta italiano Emanuele Crialese retorna a uma locação bastante similar neste seu novo Terraferma ao enfocar vários personagens de uma mesma família que, residindo numa pequena ilha, enfrentam seus próprios dilemas. A diferença é que, aqui, todos são prisioneiros de uma maneira ou de outra – algo que o diretor já deixa claro em seu plano inicial, quando a própria câmera se vê envolvida em uma rede de pesca.

Escrito pelo próprio Crialese ao lado de Vittorio Moroni, o longa (escolhido para representar a Itália no Oscar 2012) desenvolve sua narrativa ao opor o modo de pensar tradicional, histórico, dos velhos pescadores locais à inquietação da geração seguinte que, frustrada com as limitações da economia local, decide substituir a pesca pelo turismo como forma principal de sustento. Desta forma, acaba caindo nos ombros do jovem Filippo, neto de um pescador e sobrinho de um guia turístico, a responsabilidade de definir seu próprio caminho – o que, de certa forma, definirá o rumo da família.

Vivido por Pucillo como um rapaz de bom coração que se vê dividido entre o avô Ernesto (Cuticchio), com quem aprendeu a pescar, e a mãe Giulietta (Finocchiaro), que quer levá-lo para uma cidade grande, Filippo surge como um jovem confuso e imaturo que, constantemente com um sorriso bobo estampado no rosto, acostumou-se a fazer apenas aquilo que os mais velhos determinavam. É então que, ao resgatar um grupo de imigrantes africanos no meio do mar, o rapaz é obrigado a avaliar questões bem mais amplas do que as de seu mundinho restrito – uma tarefa que se torna ainda mais complicada em função da chegada de uma bela turista que logo o encanta.

Desta forma, Terraferma acaba dividindo sua trama em duas linhas que não apenas se conectam de maneira inteligente como ainda projetam, no título, interpretações diferentes de suas próprias resoluções: de um lado, temos a “terra firme” como objetivo de imigrantes famintos e doentes que, depois de uma jornada sofrida que provavelmente resultará em prisão e mais dores, enxergam na Itália uma promessa de futuro melhor; de outro, esta promessa surge, para Filippo, como sua chegada à idade adulta, sendo definida pelas decisões que deverá tomar diante dos conflitos que se apresentam à sua frente.

Explorando com sucesso as paisagens magníficas que servem de palco ao filme, Crialese contrapõe de forma eficiente o ritmo pausado, tranquilo, do cotidiano dos pescadores aos esforços quase desesperados daqueles que dependem dos turistas para sobreviver – e mesmo que compreendamos o pragmatismo de Nino, tio do protagonista, não deixamos de enxergar como seu modo de vida representa uma certa traição aos princípios de seu velho pai, que jamais deixaria imigrantes abandonados no mar, por exemplo, apenas para evitar a interferência da polícia nos negócios locais (e quando o cineasta enfoca Ernesto em sua oficina, aparentemente construída no interior de uma imensa gruta, temos uma forte representação visual da fortaleza simbolizada pelo homem e por seus princípios).

Com uma fotografia maravilhosa de Fabio Cianchetti, Terraferma traz, ainda, dois planos memoráveis: aquele que, surgindo quase como um pesadelo, traz diversos imigrantes nadando desesperadamente no mar, à noite, em direção a um pequeno barco e aquele que, remetendo de certa maneira a O Mensageiro do Diabo, passeia pelo fundo do oceano até revelar um cadáver em decomposição e já coberto por vegetação submarina – momentos que, além de impactantes, contribuem de forma inequívoca para a narrativa.

Mesmo sem se tornar um grande filme, Terraferma é um esforço que oscila com talento entre a doçura e a amargura ao lado de seu personagem principal, demonstrando que Crialese, mesmo não sendo (ainda) um cineasta de voz particularmente forte, vem navegando com segurança em direção a isto.

Observação: esta crítica foi originalmente publicada como parte da cobertura do Festival do Rio de 2011.

10 de Outubro de 2011

Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

Você também pode gostar de...

 

Para dar uma nota para este filme, você precisa estar logado!