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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
05/03/2021 05/03/2021 2 / 5 2 / 5
Distribuidora
Amazon
Duração do filme
110 minuto(s)

Um Príncipe em Nova York 2
Coming 2 America

Dirigido por Craig Brewster. Roteiro de Barry W. Blaustein, David Sheffield e Kenya Barris. Com: Eddie Murphy, Arsenio Hall, Wesley Snipes, Shari Headley, Leslie Jones, Tracy Morgan, Paul Bates, Jermaine Fowler, Teyana Taylor, Louie Anderson, Clint Smith, Vanessa Bell Calloway, KiKi Layne, Bella Murphy, Rotimi, Akiley Love, Nomzamo Mbatha, Trevor Noah, John Amos, Luenell, Morgan Freeman e James Earl Jones.

Quem estava vivo nos anos 80 certamente se lembra da força que Eddie Murphy representava: cada um de seus filmes era aguardado com imensa expectativa, sua risada característica se tornou quase icônica e sua química com praticamente qualquer parceiro de cena (Nick Nolte, Dan Aykroyd, Arsenio Hall ou… ele mesmo) garantia interações e dinâmicas novas a cada produção – e a cópia pirata em VHS de seu standup Sem Censura era um autêntico Santo Graal entre adolescentes. Aos poucos, porém, o Eddie Murphy cheio de energia e irreverência da década de 80 foi cedendo lugar a um comediante acomodado, preguiçoso, que preferia se tornar inofensivo para atrair públicos maiores (inclusive o infantil), escolhendo projetos que poderiam ser estrelados por qualquer ator medíocre e desperdiçando seu talento de modo imperdoável. De lá para cá, um ou outro filme parecia despertar o velho Eddie Murphy (Os Picaretas, Shrek, Meu Nome é Dolemite), mas nunca por muito tempo.


E as continuações de seus sucessos sempre foram – com exceção de Shrek 2 – pavorosas, de 48 Horas Parte 2 aos dois últimos Um Tira da Pesada, passando, claro, por O Professor Aloprado 2 e, lamento dizer, este Um Príncipe em Nova York 2.

Dirigido pelo mesmo Craig Brewster que comandou Dolemite e parece imediatamente ter se esquecido de como criar uma cena engraçada, esta sequência começa 30 anos depois do original e traz o príncipe Akeem (Murphy) feliz ao lado da nova-iorquina Lisa (Headley) e das três filhas, Meeka (Layne), Omma (Bella Murphy, filha de Eddie) e Tinashe (Love). Prestes a morrer e preocupado com a sucessão, o rei Jaffe Joffer (Earl Jones) revela a Akeem que este tem um filho em Nova York e que deve ir buscá-lo para que se prepare para um dia assumir o trono de Zamunda. Sempre acompanhado do braço-direito Semmi (Hall), Akeem sai em busca de seu “filho bastardo” (a repetição da expressão é uma “piada” que atravessa boa parte do filme), Lavelle (Fowler), fruto de uma noite de sexo sob o efeito de drogas com Mary Junson (Jones). Enquanto isso, o vilanesco general Izzi (Snipes), líder do país vizinho (apropriadamente chamado “Nextdoria”), representa uma ameaça constante à soberania de Zamunda – um perigo apresentado de modo tão preguiçoso pelo roteiro que a única coisa que justifica a presença do personagem é a performance divertida do ator.

Já de cara, temos um problema: das quase duas horas de projeção, provavelmente menos de meia hora se passa na cidade do título, já que o filme se concentra muito mais nos esforços de Lavelle para se adaptar ao reino africano e cumprir os testes necessários para que possa se tornar herdeiro do trono. Se o original extraía graça do contraste entre a boa vida de Akeem em seu continente e a realidade sem luxos de sua experiência em Nova York, aqui ficamos presos a um jovem habituado às dificuldades de seu cotidiano passando a conhecer uma existência de luxo – o que, convenhamos, apresenta bem menos potencial para o humor. Com isso, Um Príncipe em Nova York 2 conta uma história sem conflito, sem risco, sem nada que sustente os personagens e justifique nosso investimento naquele universo além, obviamente, do fator “nostalgia”, que a obra explora ao basicamente repetir muitas das piadas do primeiro longa.

Estas repetições envolvem não apenas cenas e gags específicas (o primeiro despertar de Akeem no original e aqui; o restaurante barato que copia outro famoso; a candidata a noiva que faz tudo que um príncipe ordena, eliminando seu interesse), mas também o retorno de quase todo o elenco, dos principais aos quase figurantes – incluindo uma referência aos irmãos Duke (Ralph Bellamy e Don Ameche, ambos falecidos há quase três décadas), vilões de Trocando as Bolas que fizeram uma ponta divertida em Um Príncipe em Nova York e que aqui são representados por um sobrinho interpretado por Colin Jost, o menos engraçado integrante do elenco atual de Saturday Night Live (que lançou Murphy, por sinal). Além disso, esta continuação abre oportunidades para vários comediantes negros brilhantes que se estabeleceram desde o lançamento do filme anterior, como Tracy Morgan, Leslie Jones e Trevor Noah – uma característica das produções de Murphy pela qual este merecia bem mais reconhecimento do que recebeu, já que, no auge de sua fama, insistiu (contrariando os estúdios) em investir em projetos com elencos compostos essencialmente por negros (como O Príncipe das Mulheres e Os Donos da Noite, seu único trabalho na direção).

Infelizmente, o elemento mais importante encontra-se ausente: a dinâmica entre Akeem e Semmi, que permitia que a química excepcional entre Murphy e Arsenio Hall se manifestasse, mas que aqui é substituída por interações desinteressantes e burocráticas. Em vez disso, o que temos é uma recriação da estratégia Xuxa Requebra, que envolve enfiar desajeitadamente vários números musicais no meio da narrativa apenas para incluir pontas de figuras como Gladys Knight, Salt-N-Pepa e, já nos créditos finais e claramente gravado já na quarentena, John Legend. E prefiro nem discutir o merchandising pavoroso presente em várias cenas.

Aliás, a direção de Craig Brewster é tão desastrosa que em vários momentos vemos personagens surgindo aparentemente do nada (como Idi, filho do general Izzi) e closes de reações de atores que parecem ter sido rodados não apenas em momentos, mas em ambientes diferentes do restante da cena – e há passagens nas quais tive a distinta sensação de que certos intérpretes (como o veterano James Earl Jones) estavam contracenando com o vazio. Além disso, o cineasta parece achar que a África fica a dez minutos de metrô de Nova York, criando problemas amadores na cronologia do filme. E se os figurinos de Ruth E. Carter são notáveis como de hábito, os efeitos visuais usados para criar os animais digitais parecem ter sido criados em um PC velho, o que é no mínimo embaraçoso. Já as próteses usadas para transformar Murphy e Hall em vários personagens seguem brilhantes – e o ponto alto, claro, reside nos velhos barbeiros (que de alguma forma continuaram vivos depois de todo esse tempo).

Falho em seus esforços para introduzir elementos dramáticos relacionados à filha mais velha de Akeem e ao seu “filho bastardo”, Um Príncipe em Nova York 2 procura se manter atento às discussões atuais ao incluir o tema do empoderamento feminino em sua trama – mas isto é feito de modo tão óbvio e artificial que corre o risco de soar mais como uma abordagem cínica para justificar as piadas mais rasteiras do que como uma preocupação real dos realizadores.

Empregando ainda o velho recurso de encerrar a narrativa com um número musical grandioso para que os espectadores deixem o filme com a sensação de terem visto algo repleto de graça e energia, Um Príncipe em Nova York 2 oferece no restante do tempo o oposto disso – e até mesmo as “falhas de filmagem” presentes durante os créditos conseguem trazer apenas atores rindo de si mesmos e fazendo caretas para a câmera, demonstrando que se divertiram bem mais do que o público obrigado a assisti-los por 110 minutos de mediocridade.

E Um Tira da Pesada 4 vem aí.

Observação: há, claro, uma breve e tola cena após os créditos finais.

06 de Março de 2021

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Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

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