Datas de Estreia: | Nota: | ||
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Brasil | Exterior | Crítico | Usuários |
02/12/2011 | 01/01/1970 | 5 / 5 | 5 / 5 |
Distribuidora | |||
VideoFilmes | |||
Duração do filme | |||
90 minuto(s) |
Dirigido por Eduardo Coutinho.
Já escrevi isso diversas vezes, mas o fato é que Eduardo Coutinho não só é o maior de nossos cineastas, como também é um dos mais humanistas. Sempre demonstrando um carinho comovente para com seus entrevistados, o veterano documentarista invariavelmente consegue, através de sua doçura, levar-nos a também amar um pouco aquelas pessoas e suas histórias comuns, mas não menos admiráveis.
Com uma estrutura similar ao de seu ótimo Jogo de Cena, Coutinho basicamente constrói seu filme usando uma cadeira preta sobre um palco que, trazendo cortinas escuras ao fundo que revelarão os entrevistados, essencialmente leva-os a se assumirem como personagens de uma narrativa particular. Entrevistando de uma bela imigrante a um velho camponês, o longa pede algo simples a todos: que cantem a música mais marcante de suas vidas – sem instrumentos, sem acompanhamentos e apenas com suas vozes destreinadas e a emoção que os versos provocarem.
Normalmente trazendo melodias e letras melancólicas e remetendo invariavelmente a relacionamentos afetivos, as canções são usadas pelo cineasta como ponto de partida para dissecar, essencialmente, a alma humana – e se qualquer outro documentarista imediatamente perguntaria aos entrevistados por que estes escolheram determinada composição ou como a conheceram, Coutinho exibe sua sensibilidade ao questionar se estes “gostaram de cantar” ou o que sentiram ao recitar os versos. Sim, ele também se interessa pelo contexto que levou a música a ser escolhida, mas parece sempre mais fascinado pelos sentimentos de seus personagens, não em explicações que, ele sabe, nada explicariam de fato – e um bom exemplo disso reside no homem que, depois de se lembrar de uma melodia cantada pela mãe enquanto costurava, décadas antes, começa a chorar sem saber o motivo, já que a mãe ainda é viva e aquela é basicamente uma memória agradável (e talvez ele esteja chorando justamente por isso; pela nostalgia da lembrança infantil).
Mas esta é a magia dos filmes de Eduardo Coutinho: estabelecendo uma atmosfera de intimidade e confiança com seus entrevistados, ele é sempre hábil ao levá-los a se esquecer da câmera, permitindo que se inclinem, se movam livremente na cadeira e até mesmo atendam o celular – e, com isso, não é surpresa perceber como estes acabam se abrindo talvez mais do que desejariam (“Já cantei muito em puteiro!”). O resultado é que As Canções, como todos os trabalhos do cineasta, se apresenta não só emocionante, mas também constantemente engraçado em função da naturalidade dos depoentes – algo que Coutinho, experiente, já sabe antecipar, chegando a servir de escada por saber que uma tirada divertida virá a seguir (como no momento em que uma entrevistada diz “Fizemos e parimos um filho” e o diretor, inteligente, pergunta “fizeram e...?”, preparando o terreno para uma das melhores piadas do filme).
No entanto, para cada momento divertido há também um mais confessional e, por isso mesmo, comovente – como no instante em que uma bela mulher de meia-idade fala do ex-marido e conclui: “Eu não fui o grande amor da vida dele, mas ele foi o da minha”.
A verdade é que é impossível assistir a um filme de Eduardo Coutinho e não se apaixonar um pouco mais pela Humanidade ou constatar como as pessoas são, em sua essência, lindas à sua própria maneira.
Observação: esta crítica foi originalmente publicada como parte da cobertura da Mostra de São Paulo de 2011.
28 de Outubro de 2011