Datas de Estreia: | Nota: | ||
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Brasil | Exterior | Crítico | Usuários |
14/05/2010 | 01/01/1970 | 1 / 5 | / 5 |
Distribuidora | |||
Dirigido por Ridley Scott. Com: Russell Crowe, Cate Blanchett, Mark Strong, Kevin Durand, Mark Addy, Danny Huston, William Hurt, Oscar Isaac, Matthew Macfadyen, Scott Grimes, Douglas Hodge, Léa Seydoux, Alan Doyle, Robert Pugh, Simon McBurney, Eileen Atkins e Max von Sydow.
Estou cansando de Ridley Scott. Depois de dirigir algumas obras magníficas no início de sua carreira (seus três primeiros filmes foram os inesquecíveis Os Duelistas, Alien, o Oitavo Passageiro e Blade Runner), o cineasta passou a acreditar na própria infalibilidade e, aos poucos, desenvolveu um estilo marcante – o que não significa eficiente ou elegante – de comandar seqüências de ação. Curiosamente, desde então seus trabalhos mais eficazes têm sido justamente aqueles nos quais ele se mostrou mais contido, concentrando-se nos personagens em vez de nas batalhas, como podemos facilmente constatar em Thelma & Louise, Hannibal, Os Vigaristas e O Gângster – este último, o único fruto da parceria com o ator Russell Crowe que realmente funciona, já que Gladiador, Um Bom Ano e este Robin Hood infelizmente beiram o insuportável.
Escrita pelo normalmente confiável Brian Helgeland, esta nova versão da lenda do arqueiro que roubava dos ricos para dar aos pobres se trata, na realidade, de uma prequel – uma “história de origem” (pense em X-Men Origens: Wolverine, mas ainda pior). Integrante do exército do Rei Ricardo Coração de Leão, Robin Longstride (Crowe) se encontra farto de ser usado pelo monarca para saquear castelos e dizimar muçulmanos e, ao perceber uma brecha fornecida pela morte do líder, abandona a tropa ao lado dos companheiros João Pequeno (Durand), Will Scarlet (Grimes) e Allan A’Dayle (Doyle). No entanto, acaba testemunhando o massacre de um batalhão real que conduzia a coroa de volta a Londres e assume a identidade do portador desta, o que o leva a conhecer Lady Marion (Blanchett) e a assumir um papel importante no conflito que eventualmente se estabelece entre ingleses e franceses.
Acertando pontualmente, o roteiro de Helgeland merece créditos, por exemplo, por seu esforço em retratar o Rei Ricardo como uma figura diferente do nobre idolatrado nas dezenas de versões anteriores da história, já que aqui Danny Huston vive o monarca quase como um viking bêbado, amoral e bruto que, em sua ganância e violência, pouco se diferencia dos vilões que posteriormente assumirão seu lugar. Da mesma maneira, há instantes em que o filme parece tentar criar um Rei João (Isaac) mais dimensional, explorando sua fraqueza e seu desejo de ter seu valor reconhecido – mas eventualmente a narrativa e o intérprete do personagem desistem da idéia, contentando-se em apresentá-lo como mais uma caricatura aborrecida. Esta, aliás, parece ser a lógica que rege o longa, já que, acreditem ou não, Ridley Scott e sua trupe chegam a apresentar o rei francês numa cena inacreditável na qual este surge comendo ostras à beira do canal da Mancha. (Agora imaginem se o vilão fosse brasileiro: eu não me espantaria caso surgisse em cena sambando abraçado a uma índia enquanto tomava caipirinha e equilibrava uma bola de futebol na cabeça.)
Surgindo em cena com o cenho sempre fechado e com a seriedade habitual que caracteriza seus papéis dramáticos, Russell Crowe parece nem sequer tentar compor um personagem novo, limitando-se a viver Robin como uma espécie de Maximus Hood – e as poucas cenas em que o protagonista deveria surgir relaxado e alegre acabam soando tão artificiais quanto o relacionamento que ele logo vem a estabelecer com a Marion encarnada por Cate Blanchett de maneira burocrática e sem energia (aliás, o clichê do “casal que briga mas se ama” é empregado por Helgeland de forma tão automática que ele logo altera a dinâmica do relacionamento sem qualquer explicação mais convincente). Em contrapartida, Max von Sydow explora ao máximo sua pequena participação, protagonizando o único momento emocionalmente ressonante da narrativa quando seu velho Lorde recebe a notícia da morte do filho e reage de uma forma contida, mas que denuncia o impacto recebido. De maneira similar, William Hurt traz imensa dignidade ao seu William Marshal, fazendo jus à fama de honrado do personagem verídico.
Infelizmente, porém, Sydow e Hurt representam raríssimos pontos positivos em uma produção na qual um personagem relembra a infância há muito esquecida através de flashbacks entrecortados apenas porque alguém ordena que ele feche os olhos e se lembre (aliás, toda a subtrama envolvendo o pai de Robin poderia ser perfeitamente descartada, já que não exerce função alguma na narrativa). E o que dizer da falta de confiança de Scott na inteligência do espectador, já que, em certo momento, inclui um letreiro informando que estamos em Nottingham embora estejamos mais do que cientes disso e, não satisfeito, ainda leva um personagem a dizer: “Chegamos a Nottingham!”?
Mas os problemas de Scott não se limitam à sua falta de confiança no público: retornando à ofensiva imoralidade de seu reprovável e jingoísta Falcão Negro em Perigo, o diretor não hesita em transformar uma cena desta sua produção em uma referência gratuita ao Holocausto ao enfocar o ataque dos vilões a uma pequena vila de maneira a remeter às câmaras de gás que mataram centenas de milhares de inocentes nos campos de concentração nazistas – algo que o diretor usa sem pudor ao trazer mulheres e crianças sendo aprisionadas em uma casa que é incendiada e tomada pela fumaça. Da mesma maneira, o desembarque dos franceses na Inglaterra é rodado de forma a remeter à chegada dos Aliados à Normandia no Dia-D (pense em O Resgate do Soldado Hood), mas aqui a citação histórica soa mais ridícula do que ofensiva, já que inclui momentos risíveis como aquele em que a personagem de Blanchett surge pronta para o combate ao lado de um grupo de moleques – algo que poderia render uma comédia intitulada Marion e os Garotos Perdidos.
Não se envergonhando nem mesmo diante da inclusão de clichês como o da mocinha que precisa ser resgatada pelo herói no meio da batalha e por diálogos como “Isto é por você!”, Robin Hood ainda é um filme entediante e sem vida, já que a habitual paleta mergulhada em cinza de Scott drena qualquer energia da narrativa sem, em contrapartida, conseguir criar uma atmosfera minimamente evocativa. Aliás, não deixa de ser sintomático que o longa só se torne visualmente interessante já em seus créditos finais que combinam animação e live action através da rotoscopia – mas aí já é tarde demais, posto que, para chegarmos ali, fomos obrigados a enfrentar 148 minutos de projeção.
Que parecem durar semanas.
14 de Maio de 2010