Decidi fazer Medicina por causa deste filme – decisão errada, motivo certo: a humanidade do médico retratado por Robin Williams aqui é algo que deveria ser comum a todos os membros desta profissão em vez de ser um atributo cada vez mais raro. Aliás, é incrível como Williams captura todos os trejeitos do fabuloso Oliver Sacks com perfeição: a timidez, a maneira de colocar os braços em frente ao corpo como se se defendesse do mundo, a dificuldade em olhar as pessoas nos olhos. Já a performance de De Niro impressiona pela composição física: a maneira como ele retrata os tiques, as contrações involuntárias, as quebras de padrão na fala. Trata-se de um filme tão delicado e ao mesmo tempo tão demolidor. Admiro imensamente, por exemplo, como a diretora Penny Marshall confere importância aos personagens secundários, criando pequenos momentos de humanidade - como a enfermeira que acha que vai ser xingada quando é chamada abruptamente ou a reação de Lucy ao vento. Que filme. 5/5
Por um lado, o documentário se esforça para retratar todos os lados envolvidos na complexa questão do tráfico de mulheres e da prostituição, entrevistando clientes, cafetões, prostitutas, policiais e promotores (e algumas das entrevistas são tão reveladoras que chega a ser inacreditável que os envolvidos tenham aceitado concedê-las). Por outro, a estrutura do longa é burocrática a ponto de soar como algo produzido para a televisão, tornando-se eventualmente enfadonha e repetitiva. 3/5
Elenco perfeito, uso impecável de locações e um roteiro excepcional. Como se não bastasse, o estreante Martin McDonagh surge como um diretor já maduro e seguro, construindo uma narrativa que comove num instante, provoca risos no seguinte e gera tensão durante ambos. Enquanto isso, Brendan Gleeson subverte sua imagem de durão em uma performance perfeitamente modulada para mostrar que é perigoso, mas sensível, ao passo que Ralph Fiennes cria uma caricatura que, de algum modo, consegue ser humana, realista e hilária. Quanto a Colin Farrell, E Colin Farrell, um ator que raramente recebe o crédito que merece, é preciso observar que encarna seu personagem como um garotão irresponsável, cheio de maneirismos e caretas apenas para, de repente, exibir uma vulnerabilidade de partir o coração. Coisa de gênio. Como o próprio filme. 5/5
Embora seja quase inevitável comparar este filme a pelo menos dois outros filmes que serviriam de spoiler apenas ao serem mencionados (digo apenas que foram dirigidos por Polanski e Robin Hardy), falta ao terceiro ato deste longa a mesma coesão de suas influências. Ainda assim, a atmosfera inquietante construída pelo diretor é eficaz e o trio central é vivido com química excepcional pelos atores. 4/5
É curioso notar como Takeshi Kitano subverte o gênero e a própria expectativa do público ao iniciar o filme seguindo as convenções esperadas e subitamente revelando que seu propósito é analisar como aqueles personagens se comportam em uma situação atípica de “férias” quase forçadas. No processo, ele extrai humor e humaniza indivíduos frios e implacáveis cujas explosões inesperadas de violências são retratadas com um distanciamento que oscila entre o divertido e o macabro. 4/5
Equilibrando-se com formidável segurança entre tons que ora remetem a Jarmusch ora a Woody Allen, o filme é um estudo de personagem que, curiosamente, desenvolve seu protagonista mais através de suas reações ao que o cerca do que propriamente através de suas ações, o que é um feito memorável. 5/5
Claramente inspirado por Memórias de um Assassino, uma das maiores obras-primas do cinema sul-coreano, o longa desenvolve uma narrativa complexa que acompanha o impacto da tragédia central nas vidas de vários personagens, funcionando como um thriller, mas também como um drama tocante e sensível. E, com isso, impressiona por fazer jus ao trabalho que o motivou. 5/5
Ainda mais relevante agora que Jarecki acabou fazendo uma espécie de continuação com a série documental The Jinx, esta ficcionalização da vida de Robert Durst é forte principalmente ao retratar a leveza e o carisma da primeira esposa do sujeito, vivida aqui de forma belíssima por Kirsten Dunst. Já Ryan Gosling, embora um bom ator, se prejudica relativamente ao tentar criar um personagem novo ao mesmo tempo em que busca recriar a voz e os maneirismos de Durst. De modo geral, porém, o filme merece aplausos por evitar transformar Durst em um vilão unidimensional, intrigando justamente em função do comportamento bizarro deste. 4/5
É preciso reconhecer a sorte que os diretores tiveram ao passarem a companhar Bob Liebling justamente no início de um período de imensas mudanças – ou talvez tenham sido eles os responsáveis por ela. Seja como for, o documentário acaba apresentando um arco dramático surpreendentemente bem estruturado para um filme que se limita a acompanhar um ex-músico quase à beira da morte em função de décadas de consumo de drogas, tornando a experiência bem mais interessante do que poderíamos julgar a princípio. 4/5
Um clássico cult do cinema de Hong Kong da década de 70, é beneficiado por valores de produção incrivelmente altos para um título do gênero, revelando uma ambição que se reflete não só no bom roteiro, mas na maneira calculada com que a narrativa é desenvolvida. Pecando apenas por um clímax que soa abrupto demais em um filme que até então não demonstrara qualquer pressa em construir a história, o projeto acaba por conceber um herói ao mesmo tempo humano e de dimensões mitológicas. 4/5